Quem circula pelo Eixo Monumental, em Brasília, vislumbra um homem acenando, que parece cumprimentar quem por ali passa. Compondo o Memorial JK, a escultura em bronze criada por Honório Peçanha é o retrato fiel da figura carismática que foi Juscelino Kubitschek. É ali que a história do fundador da capital federal é guardada.
A biografia emblemática do ex-presidente ainda desperta muita curiosidade e “vira e mexe” é alvo de reconstituições televisivas e cinematográficas. Em 2006, a Rede Globo produziu a minissérie JK. No YouTube, há obras como os documentários JK – O menino que sonhou um País, (2002) e Os Anos JK – Uma Trajetória Política (1980). Recentemente, a TV Cultura estreou a série documental inédita JK, O Reinventor do Brasil. O diferencial da produção se concentra basicamente em sua montagem dinâmica, que mais se assemelha a um podcast rico em imagens inéditas e linguagem contemporânea e busca chamar a atenção dos telespectadores mais jovens.
Dividida em quatro capítulos, a série é dirigida por Jarbas Agnelli e tem roteiro assinado por Fernando Rodrigues. Os dois publicitários exploraram elementos que prometem fascinar a geração Z. Além de mostrar toda a trajetória daquele que se tornaria o 21º Presidente do Brasil, o produto final apresenta imagens inéditas.
“Foi um processo complexo porque fizemos o maior levantamento iconográfico, com mais de cinquenta mil fotografias pesquisadas, além de documentos em texto, jornais, especialmente de Minas Gerais. Fizemos um trabalho minucioso de verificação em cada foto para que todas estivessem datadas de forma correta”, explica o diretor executivo Fábio Chateaubriand, que inicialmente tinha como intenção apenas publicar um livro ilustrado com o material pesquisado, que será lançado em 2024.
A narrativa
Os episódios trazem desde como a população se rendeu ao charme de JK – que lembrava os grandes astros da época de ouro de Hollywood – até como ele contornava a oposição com maestria para colocar em prática sua política desenvolvimentista.
Como toda história de vida, a evolução do prefeito de Belo Horizonte, que se tornou governador de Minas Gerais e posteriormente presidente do Brasil, também foi agridoce e cheia de altos e baixos. A construção de Brasília e o período de otimismo econômico e social para o País costuram-se com partes delicadas, como a cassação, o exílio e, consequentemente, sua morte controversa.
Tudo isso é contado por pessoas que permearam a vida do então presidente. Além da filha, Maria Estela Kubitschek, há o amigo e diretor-presidente do museu e memorial Casa de Juscelino, em Diamantina, Serafim Jardim, de 87 anos, que trabalhou com Juscelino após o período de exílio em 1967 e tem boas memórias sobre o líder político. “Juscelino era um homem sentimental e emotivo, portanto, sofreu muito. No entanto, durante os anos que vivi ao lado dele, só o vi chorar duas vezes: na morte de sua irmã e de sua mãe. Era um homem alegre e seu sorriso era constante e sempre costumava falar uma frase de William Shakespeare que dizia ´A alegria evita mil males e prolonga a vida’”. Serafim entende que o documentário da TV Cultura é importante para apresentar para quem ainda não conhece a história e o legado do ex-presidente.
A preocupação em propagar, especialmente para a nova geração, a história de vida de JK tem um motivo: uma recente pesquisa do Datafolha aponta que apenas 1% da população se lembra de JK. Segundo o diretor do documentário, apenas o Memorial de JK e poucos órgãos públicos exercem esse papel de resgate à memória do presidente com excelência. Para ele, o descuido com documentos e acervo de figuras públicas é algo cultural que reflete, infelizmente, o desapego de uma sociedade que desvaloriza os fundamentos da identidade nacional.
“Mesmo que tenhamos ótimas iniciativas, precisamos ainda mais de políticas públicas de conservação de materiais raros. Acessamos arquivos que estavam se deteriorando e muitos foram difíceis de ser localizados. Muito além de mostrar a vida de JK, esse trabalho ressalta a necessidade que precisamos ter como sociedade de incentivar a preservação da memória do nosso país”, conclui Chateaubriand. Para quem perdeu a exibição dos episódios, o documentário estará disponível no app Cultura Play no primeiro semestre de 2024.
*Matéria escrita por Edson Caldeira para a Revista GPS 38