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Compra da sede da Apex pode parar na Justiça

Comissão que regula seleção do imóvel escolhe proposta mais cara
A ApexBrasil procura uma sede que permita a instalação de espaço para exposições permanentes
A ApexBrasil procura uma sede que permita a instalação de espaço para exposições permanentes. Foto: Divulgação

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Em 2023, as exportações brasileiras alcançaram US$ 339,67 bilhões, gerando saldo comercial próximo dos US$ 100 bilhões e aumento no número de empresas exportadoras. Parte deste resultado inédito para o País veio por meio do trabalho da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), cujo objetivo é promover produtos e serviços brasileiros no exterior e atrair investimentos estrangeiros para setores estratégicos da economia, como define a própria página do organismo, que é vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviço.

Mesmo com papel de grande relevo para o País, a ApexBrasil não tem sede própria. Hoje, aluga seis andares do Centro Empresarial CNC, prédio moderno e confortável, mas carente de um espaço que permita, por exemplo, a instalação de feiras e a realização de grandes eventos para atrair empresários importadores de outros países para negociar com exportadores locais e conhecer produtos e serviços. Sem esta área de exposição permanente, fica difícil fechar alguns negócios. Além disso, um prédio próprio proporcionaria mais conforto aos empregados da ApexBrasil, com a ampliação de vagas e instalação de refeitórios, o que permitiria mais foco no trabalho.

Pensando nisso, ainda no governo de Jair Bolsonaro, a agência decidiu instalar-se em uma sede própria. Poderia optar por compra direta, mas preferiu abrir um processo que, aparentemente, seria mais transparente. Optou por uma requisição de proposta comercial, que levou o número 1.794/2022. O texto dizia claramente que o objeto seria a “contratação de serviços de consultoria em avaliação imobiliária para emissão de relatório técnico de avaliação de oportunidades de mercado para locação e aquisição de terreno e de imóvel corporativo e de eventuais projetos de design-build conforme condições, quantidades e exigências estabelecidas no projeto básico.”

Isso significa que haveria a possibilidade de comprar a área e atrelar ao preço a construção do imóvel. Como se trata de agência autônoma, a ApexBrasil ainda teria uma vantagem: poderia, após ver as propostas, iniciar um processo que barateasse ainda mais a aquisição e a construção do edifício e de um espaço para exposições. O que, obviamente, traria mais vantagem para a ApexBrasil e, consequentemente, para a estrutura governamental a que pertence.

Não foi o que aconteceu, como revelou a Coluna do Mazzini, da revista IstoÉ, neste domingo (21). A comissão que gerenciava a escolha, mesmo diante de uma proposta R$ 6,7 milhões mais baixa, resolveu ignorá-la e escolheu outra proposta, em local pior.

O histórico da atuação da comissão responsável pelo processo é de arrepiar. Por isso, é suspeita de agir sem transparência e publicidade na tramitação e na escolha a jato de um dos projetos de edifício, passando por cima da proposta de menor preço e das especificações contidas no edital que deveria defender.

O processo teve 12 propostas iniciais e sete selecionadas. Destas, só duas foram para a escolha final: a da PaulOOctavio Empreendimentos Imobiliários e a da Lotus Cidade. O projeto da primeira fica próximo do Congresso Nacional e das sedes da ANTT e do Conselho da Justiça Federal, com amplo espaço de estacionamento e para a construção de um pavilhão de exposições permanente, que poderia permitir, inclusive, a criação de incubadoras de startups e outras iniciativas que visem a promoção e a ampliação dos exportadores brasileiros. A área da Lotus é na 903 Sul e colocou à disposição como estacionamento áreas públicas do Parque da Cidade.

A área oferecida pela Lotus Cidade fica perto de escolas, com problemas no trânsito durante o dia
A área oferecida pela Lotus Cidade fica perto de escolas, com problemas no trânsito durante vários períodos do dia

Além da visível desvantagem de localização e áreas, a proposta final da PaulOOctavio era mais barata. As duas finalistas, então, foram chamadas para renegociar, em um preceito que se encaixava no que dizia o edital“O critério de julgamento a ser aplicado deverá ser o MENOR PREÇO TOTAL, condicionado ao atendimento às habilitações e exigências contidas no instrumento convocatório e neste Projeto Básico”. Como ambas já eram finalistas, o preço seria a decisão.

As empreiteiras chegaram a empatar na oferta, oferecendo o pacote de terreno mais construção por R$ 190 milhões. Isso motivou uma nova rodada de ofertas. E aí começa o problema final: a falta de transparência. Ao ser informada da nova negociação, em 11 de abril deste ano, a PaulOOctavio enviou correspondência à ApexBrasil comunicando a proposta de R$ 179,8 milhões. Surpreendente, em 24 horas, recebeu a resposta: “o momento de apresentação de propostas pelas Empresas já foi superado no processo desta ApexBrasil”. Com isso, acabou vencedora a proposta da Lotus, em localização pior e que custará R$ 186,3 milhões.

A PaulOOctavio reclama que nunca foi informada da conclusão da fase de análise das propostas. Além disso, aponta na carta enviada à ApexBrasil que “o atendimento ao interesse público e a regularidade no processamento de feitos administrativos reclama as necessárias e irrenunciáveis publicidade e transparência, o que, de fato, não se verificou ao menos nesta etapa”. E reforça que o Regulamento de Licitações e de Contratos da ApexBrasil é por claro ao estabelecer, em seu art. 3º, que a “licitação não será sigilosa, sendo acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo o conteúdo das propostas até a respectiva abertura”.

Por conta disso, a empresa pede a análise da sua proposta, acesso aos documentos de instrução do processo licitatório e, ao final, a comunicação formal do resultado da concorrência, com a abertura de prazo para eventuais recursos administrativos cabíveis.

Em nota, a ApexBrasil disse que “constituiu, em junho de 2023, um Grupo de Trabalho (Resolução Diretiva RD 06-03/202) com o propósito de avaliar a aquisição de uma sede própria, seguindo rigorosos critérios de transparência e eficiência econômica”. O grupo era “composto por servidores experientes da Agência” e pautou-se por “clareza do processo, redução de despesas operacionais, localização estratégica, prazos adequados, sustentabilidade construtiva e representatividade da sede enquanto vitrine da imagem nacional e da capacidade exportadora brasileira”.

Informa ainda que “uma consultoria independente especializada em avaliação imobiliária foi contratada e, após sua recomendação, iniciou-se a análise detalhada das duas propostas finalistas, levando em consideração o custo, a localização e os prazos de entrega” e que a Diretoria Executiva da Apex “decidiu, por cautela, abrir negociação com as proponentes para melhorar suas condições de preço e prazo”.

A nota admite que “as novas propostas foram pedidas no dia 9 de fevereiro, com a solicitação de que fossem apresentadas em até dez dias úteis, e ambas as empresas o fizeram em 19 de fevereiro”. As novas ofertas foram reavaliadas também pela consultoria independente, segundo o documento. “Encerrada essa etapa, o resultado apontou que o empreendimento 1 era a opção mais econômica, com melhores condições de prazo de entrega e de localização”.

Consultores imobiliários ouvidos pela reportagem do GPS|Brasília, no entanto, contestaram as avaliações feitas pela autoria independente e pela comissão responsável pela escolha. Segundo eles, o imóvel da PaulOOctavio permite a construção de equipamentos voltados ao atendimento pleno do edital. “Além disso, a região do imóvel da Lotus Cidade tem trânsito confuso, por conta dos inúmeros colégios, e o estacionamento indicado no Parque da Cidade é usado também por frequentadores de uma academia na região. Isso não ocorreria no outro imóvel”, afirma um deles.

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