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Volta do trabalho presencial vira queda-de-braço no Judiciário

Quase três anos após o início da pandemia da covid-19, magistrados e servidores do Poder Judiciário resistem à volta das atividades presenciais, enquanto há varas e tribunais esvaziados pelo País. Advogados não encontram juízes e denunciam processos paralisados, além de longa espera por uma audiência.

Associações e sindicatos se insurgiram contra uma ordem de retorno aos postos de trabalho imposta pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Servidores reclamam de prejuízos à “_rotina_” e ao “_ambiente familiar_” daqueles que moram fora das comarcas e usam como argumento, inclusive, a “_vida organizada no exterior_”.

A decisão contestada é do CNJ, de 17 de novembro de 2022. Sob o comando da ministra Rosa Weber, os conselheiros derrubaram resoluções de 2020, do ex-presidente Dias Toffoli, que permitiram o adiamento de atos processuais e o teletrabalho. A nova resolução determina o prazo de 60 dias para o estabelecimento da rotina pré-pandemia, que se esgota na quinta-feira.

O colegiado também mudou uma resolução de 2016 sobre o teletrabalho de servidores e impôs que a modalidade seja limitada a 30% dos quadros das varas e Cortes. Ficou decidido ainda que seria criado um grupo de trabalho, com quadros do CNJ e juízes, para implementar a volta ao presencial e monitorar o avanço das atividades presenciais.

Relator dos casos que levaram à edição da resolução, o conselheiro Luiz Philippe de Melo Filho, que é ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), afirmou que “_o retorno da magistratura aos seus respectivos locais de trabalho é imperativo inegociável neste momento em que toda a sociedade brasileira já voltou à situação de normalidade_”. Segundo ele, as antigas resoluções dão ensejo a “_inúmeras interpretações díspares que prejudicam severamente a vida do jurisdicionado brasileiro_” – que, no caso, é o cidadão.

A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), que reúne as principais entidades das categorias, acionou o CNJ, no entanto, com pedido para a prorrogação do prazo. A Frentas alega que a adaptação ao presencial “_demandará tempo_” e ainda afirma que “_exigirá a nomeação de novos magistrados, promotores de Justiça e defensores públicos_”.

Entidades ligadas aos servidores também se rebelaram. A Federação Nacional dos Servidores do Judiciário (Fenajud) diz que “_será afetada toda a vida de servidores e magistrados de todo o Poder Judiciário que eventualmente estejam em teletrabalho_”. Para a Fenajud, haverá “_prejuízos irreparáveis na alteração de sua rotina, seu ambiente familiar, já que alguns residem em localidade distante da comarca de lotação_”.

Já o Sindicato dos Servidores da 7.ª Região da Justiça do Trabalho (Sindissétima) argumenta que a resolução inspira “_sensação de injustiça e inconformismo_”: “_E a vida organizada dos servidores que estão em outros Estados ou no exterior? Como alguém poderia adivinhar que o CNJ iria impor, sem que exista nenhum problema real de atendimento ao público, funcionamento das unidades ou produtividade, uma restrição dessa natureza?_”

**Abandono**

Apesar das queixas, **a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pressiona pelo trabalho presencial**. A entidade foi aos autos para endossar a decisão do CNJ. Melo Filho negou todos os pleitos das associações e dos sindicatos.

“_A OAB entende que a adoção de novas tecnologias para agilizar os atos processuais é benéfica desde que amplie o acesso da população à Justiça, não seja um impeditivo. Por isso, a escolha sobre o modelo das audiências, se presencial ou virtual, deve ser feita pelo jurisdicionado de forma a atender a realidade e a possibilidade de cada um_”, afirmou o presidente nacional da entidade, Beto Simonetti.

No acompanhamento do retorno aos tribunais, o CNJ tem recebido denúncias ou mesmo constatado em correições a **ausência de juízes em fóruns**, o que prejudica a população. Durante inspeção no Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA), na última semana, o corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, que é ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), invocou o “_senso de responsabilidade da magistratura_”.

“_Temos notícia de que, em muitos Estados, o que estava acontecendo era uma situação de quase abandono, principalmente no interior_”, disse o corregedor. Salomão pediu ainda a atenção das corregedorias ao retorno presencial.

**Inspeções**

No fim de outubro de 2022, oito juízes e 34 servidores ligados à Corregedora Nacional de Justiça fizeram uma inspeção nos edifícios do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que fica a apenas nove minutos da sede do CNJ, em Brasília, e encontram os **prédios esvaziados de servidores e magistrados**. De outros Estados, denúncias de advogados também chegaram ao órgão.

Até o momento, foram sete procedimentos para apuração, mas nem todos vão virar processos, porque a averiguação é preliminar e parte deles tinha aval de regras específicas de cada tribunal para ficarem fora do local de trabalho. No entanto, **a situação evidencia a redução da estrutura judicial, sobretudo em cidades pequenas e pobres**.

No caso do DF, a Corregedoria recomendou à Corte, por exemplo, a abertura de uma sindicância para investigar a conduta de uma juíza que também se utilizava do **teletrabalho**. Segundo a corregedoria, ela estava adiando por meses a realização de audiências com réus presos – que têm prioridade. O restante do TJDFT também vem sendo acompanhado de perto.

Em Igarapava (SP), os juízes Joaquim Augusto Simões Freitas e Pedro Henrique Bicalho Carvalho, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), foram denunciados à Corregedoria pela OAB local. A presidente da entidade na região, Nilva Maria Pimentel, relatou ao CNJ que os magistrados não moram lá e nem “_sequer comparecem ao fórum para solucionar os casos urgentes_”. Segundo ela, há processos parados há cinco meses. Salomão mandou a Corte apurar a conduta dos magistrados.

**Casos como esses serão averiguados nos próximos meses pelo CNJ, que abriu um canal de denúncias e vem recebendo queixas**. O TJ-SP informou que a Corregedoria acompanhou o trabalho dos magistrados de Igarapava e “_detectou que, apesar do elevado número de feitos distribuídos, há produtividade elevada, o que tem permitido a redução do acervo da comarca_”. O tribunal disse também que os magistrados têm autorização para residirem fora da comarca. Procurado para responder em nome de seus magistrados, o TJDFT não havia se manifestado até a publicação desta reportagem

**Diálogo**

As associações de representação de magistrados e os sindicatos de servidores afirmam que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não promoveu o debate necessário ao determinar o retorno das atividades presenciais. **As entidades alegam, ainda, que o teletrabalho propiciou aumento do número de decisões, ao dispensar reunir todas as partes em um mesmo fórum e na mesma data**.

O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Frederico Mendes Júnior, afirmou ser favorável à manutenção do trabalho a distância e disse que ele proporcionou “_ganhos de produtividade e economia aos cofres públicos, além da ampliação do acesso à Justiça_”.

“_Para se ter uma ideia, o total de decisões proferidas pelo Judiciário cresceu 16% em 2021 e cerca de 9% em 2022, durante o período de isolamento social, quando o teletrabalho foi a regra_”, afirmou.

No processo que levou à resolução do CNJ, de 17 de novembro de 2022, a Frentas afirma que “_cumpre ressaltar, também, que, ante o início do período de recesso e férias forenses, não se teve tempo hábil para oitiva dos representantes da sociedade civil, especialmente daqueles ligados ao sistema de justiça_”. “_Tampouco houve tempo para a realização dos estudos e análises pertinentes_”, argumenta.

**Unilateral**

Já a Fenajud alega que a medida foi tomada de “_forma unilateral_”. O Sindicato dos Servidores da 7.ª Região da Justiça do Trabalho (Sindissétima), por sua vez, afirma que, “_apesar de demonstrar uma preocupação legítima com o bom funcionamento da atividade jurisdicional_”, a decisão, “_pelo fato de não ter debatido adequadamente a questão com os servidores e suas entidades representativas, acabou adotando um caminho equivocado_”. Segundo a entidade, a medida “_trará, na verdade, prejuízos severos ao bom funcionamento da Justiça e à vida dos servidores_”.

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