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Viva a brava gente brasileira no Bicentenário da Independência!

Eis que neste 7 de Setembro chegamos aos **200 anos da nação Brasil**. O que exatamente isso **significa** para o País é impossível responder de um só fôlego; que dirá num texto. É um **debate interminável** para historiadores, sociólogos, professores, acadêmicos e jornalistas. E, do jeito que as coisas andam, pode acabar até em **desafio** de dança no _TikTok_ ou batalha de _gamers_. Aliás, seria muito bom que a data merecesse tal **engajamento**. Afinal, foi essa nossa **História** que gerou o **tempo presente** e, não se engane, poderá nos assombrar até um **futuro distante**.

Mas suspeito que nos **festejos da pátria livre** os brasileiros, como de costume, vão se dividir em **dois** grandes **grupos**. **De um lado, quem aproveita** praias, cachoeiras ou churrasqueiras, convencido de que se trata apenas de mais um feriadão no meio de semana. **Na outra ponta, aqueles que talvez nem da festa saberão** e sequer uma única refeição terão neste dia. **Comemorar** é sempre uma **maravilha**; contudo, convenhamos, mesmo uma tão importante **efeméride** (palavra empolada que vem do grego para nominar o aniversário de um acontecimento) não seria capaz dar a **resposta à questão-chave: há independência com fome?** Essa é a realidade do Brasil há 200 anos. Hoje temos **mais de 125 milhões de brasileiros em insegurança alimentar**, quase 60% da população. O povo heroico. Não dá pra continuar brincando de gigante adormecido.

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A quem prefere se ocupar só da caipirinha, sugiro que pule este artigo. A diretora do site me pediu uma breve **abordagem sócio-política-cultural** da data. E como sou **descendente** direto da **bactéria imperial** que causou o **piriri** em **Dom Pedro** justo naquele 7 de Setembro de 1822 – sim, **o “grito” do Ipiranga foi de cólica**, sinto informar -, optei por trazer algumas notas polêmicas para você. **Aceite**, por favor. Porque eu simplesmente não sou capaz de responder.

A **primeira** delas é justamente sobre essa **versão** totalmente **fajuta do fato em si**. A verdade, já amplamente divulgada por historiadores de respeito, é que o **príncipe** (com severos problemas intestinais durante a viagem a São Paulo) estava montado numa besta (não em um cavalo garboso), quando chegou nas proximidades do riacho. Entre pausas para “aliviadas”, **recebeu mensagens** do Rio de Janeiro informando que **Lisboa exigia sua volta**. Foi então que **empunhou a espada** e exclamou algo que, por motivos de marketing, foi resumido e eternizado como o famoso **”Independência ou Morte”**. Ou seja, **não houve qualquer glamour na cena**. Mesmo nesta era atual, em que a imagem bem cuidada para fotos e vídeos de influencers vale mais que tudo, **continuamos reproduzindo aquela cena romântica** e reconhecidamente inspirada na arte francesa que está na bela pintura do Pedro Américo, exposta no Museu Paulista. Por que raios, então, ainda admitimos essa _fake news_ centenária nos livros de História que lemos e damos a nossos filhos e netos? Ela só não é mais antiga do que a do desembarque do Pedro Álvares Cabral, que nem foi descobrimento muito menos deve-se atribuir unicamente ao navegador português. Resumindo, **a nação Brasil é mesmo este poço de contradições** – e desinformação – desde sempre.

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Próxima. Um **pomposo e festivo** “Bicentenário”, ainda mais de Independência, é algo tão **grandioso** que, bem ao nosso estilo **despojado** tropical, corre o risco de **passar quase em branco**. Viver num **tempo acelerado**, que centrifuga acontecimentos sem piedade, **só deixa tudo mais instável**. Exagero? Pois além de falsear uma imagem, distorceram o próprio espírito da coisa. Ao contrário do que queriam que pensássemos, Dom Pedro simplesmente **não proclamou a Independência cercado pelo povo**. Ali, às margens do **Ipiranga** não havia negros, indígenas e mulheres. E o Brasil, diferentemente das colônias espanholas vizinhas e dos Estados Unidos, não se tornou uma **república**, governada por representantes escolhidos por esse povo. Naquele momento histórico estava o **herdeiro de uma coroa europeia** fundando uma **monarquia tupiniquim**, que **não aboliu a escravidão**, e ainda manteve o poder de uma corte formada exclusivamente por **homens brancos, aristocratas** principalmente da região Sudeste (Rio, SP e Minas). Eis aí uma das principais **razões** de ainda hoje, **dois séculos depois**, o país continuar exibindo uma das mais altas **desigualdades sociais e econômicas** do mundo, com **machismo patriarcal, violência contra a mulher, racismo**, e **tantos preconceitos e discriminações invencíveis**. Talvez, como no caso da escravidão, cuja abolição foi incompleta, **precisamos** também de uma **nova e profunda discussão sobre a Independência**. Mas eis outro ponto auspicioso: **você já viu a programação de debates e eventos culturais sobre o Bicentenário da Independência?** Não, nem eu. Até existe, mas não chegou ao conhecimento do distinto e interessado público. E isso diz tudo.

Parêntesis. Já é bem robusta a literatura histórica nacional sobre todos esses fatos. Mas quem quiser **entender melhor** a alma deste Bicentenário, **compre – e leia!** – esta preciosidade que acaba de chegar às livrarias: **_O Sequestro da Independência: Uma História da Construção do Mito do Sete de Setembro_** (Editora Companhia das Letras), dos historiadores **Lilia Schwarcz, Lúcia Stumpf e Carlos Lima Júnior**. Eles ainda nos revelam a **importância** fundamental das **mulheres** em todo o processo da **Independência**. A começar pela princesa **Dona Maria Leopoldina**, primeira esposa de Dom Pedro, que era Regente durante a ausência do marido, mas foi totalmente descaracterizada pela visão machista, especialista em **apagar as mulheres** do poder e da História do Brasil.

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Há também um registro muito interessante, que dá justamente o título à obra: as **artimanhas** de políticos, militares e das elites econômicas para **sequestrar a autoria** não apenas da própria **Independência**, como também das comemorações ao longo desses duzentos anos. Por exemplo, se você for da geração de 50 anos, que também é a minha, terá conhecido, desde 1972 (quando foram comemorados os 150 anos da Independência), apenas um feriado marcado oficialmente pelo **desfile das forças armadas** e de segurança pública na rua principal de sua cidade. Esse foi o projeto máximo da malfadada ditadura, à época capitaneada pelo general presidente Emílio Garrastazu Médici. O aniversário da Independência do Brasil, que **deveria ser uma retumbante festa cívica**, virou apenas uma parada militar. E não espere que num passe de mágica a data se transforme no 4 de Julho (Independence Day) norte-americano, num 14 Juillet (Queda da Bastilha) francês, ou mesmo numa daquelas competições de brindes em pubs que os britânicos fazem no aniversário da Rainha. Pois então, **brava gente brasileira, contente-se com as marchas verde-oliva.**

Há uma **infinidade** de **outros aspectos** a serem debatidos nesta onda do **Bicentenário**. O 7 de Setembro não se encerra na data propriamente dita, justamente porque foi mais um dos muitos acontecimentos de relevância em meio ao **longo processo histórico** que culminou na **emancipação de Portugal**. A Independência do Brasil iniciou anos antes com as **revoltas**, essas sim **populares**, em Minas, Bahia, Pernambuco, e culminou com a **abdicação** do **primeiro imperador** em benefício do filho Pedro II, quase uma década depois.

A única coisa que acaba aqui são estas **provocações**, porque espaço do site é igual **bandeira verde-amarela:** a **gente balança, se enrola nela e ostenta com orgulho**, mas **a vida** mesmo **acontece lá fora**, nas ruas. Vamos a elas celebrar nossa Independência?

Ou você é daqueles que acham que **Brasília** está mais para Lisboa, a distante sede da coroa, do que para a **capital de todos os brasileiros?** Uhm…

_*Artigo publicado na Edição 34 da Revista GPS, com autoria de Ricardo Medina

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