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Uma conversa com Nonô, considerado por JK como “o amigo de todas as horas”

Escrita por Larissa Duarte

Entre as ladeiras e casarios coloniais de Diamantina, no interior de Minas Gerais, uma casa simples e discreta na Rua São Francisco abriga uma memória difícil de mensurar. Os anos 1906 a 1919 foram cenário das primeiras travessuras e aprendizados de Nonô, um garoto que, décadas depois, ficaria mundialmente conhecido por um outro apelido: JK. A casa de número 241, no coração da cidade mineira, não só foi lar da infância e adolescência de Juscelino Kubitschek, como também berço de sonhos que transformaram uma nação. 

Atendendo ao pedido feito pessoalmente pelo próprio ex-presidente semanas antes do seu falecimento, o endereço está hoje sob os cuidados de um amigo de confiança. “No dia 9 de agosto de 1976, JK me pediu para comprar a casinha onde viveu na infância, para que fosse restaurada e servisse de moradia quando viesse a Diamantina”, compartilha Serafim Melo Jardim, colega conterrâneo e apelidado “secretário particular” de Juscelino. “Recebi essa missão com muito orgulho. Por essa razão, depois da sua morte, resolvi transformá-la na Casa de Juscelino, um espaço onde tentamos preservar sua história e seu legado”, explica.

Nonô viveu ali dos três aos dezenove anos. Morava com sua mãe, Dona Júlia, e a irmã, Maria da Conceição, a Naná. “JK me dizia que foi nesta casa onde moldou seu caráter”, conta Serafim. Entre momentos de altos e baixos, o ex-presidente dizia que tudo lhe agradava na “humilde casa da Rua São Francisco” e que o carinho da mãe e da irmã recompunha o seu equilíbrio interior.

“Nesta casa, como uma criança normal, JK se deleitava com um pé de jabuticaba, sua fruta preferida. Na hora das refeições, sua mãe deixava de comer sob alegação de que estava fazendo dieta para alimentar os dois filhos. Dona Júlia era professora e dava aula em uma escola que ficava a quase três quilômetros. Ele me dizia que a leitura foi uma das coisas mais importante da sua vida”, divide o amigo.

À frente da Casa de Juscelino há quatro décadas, Seu Serafim, aos quase noventa anos, diz que seu principal objetivo em defender e cuidar do imóvel é mostrar para as novas gerações, e também aos atuais políticos, o grande homem que foi JK. Além de objetos, fotos, instrumentos e documentos que fazem parte da trajetória do filho e irmão Nonô, do rapaz apaixonado por música, do médico doutor Juscelino, do ex-presidente do Brasil, do ex-governador de Minas Gerais e do ex-prefeito de Belo Horizonte, a casa testemunha, em sua simplicidade, que a grandeza não depende de onde se começa, mas da coragem de sonhar e realizar.

 

Amigo de todas as horas

Bastam poucas aulas de história brasileira para compreender os feitos e características marcantes do líder comumente chamado de ousado e visionário. Contudo, poucos tiveram o privilégio de conhecer o JK sentimental e emotivo, o indivíduo que “valorizava a amizade como ninguém”. Serafim teve essa sorte. “Ele costumava dizer que a nossa amizade era uma velha tradição de família”, lembra. Antes de se tornar braço fiel de Juscelino, o tio e pai de Serafim já haviam vivido uma infância e adolescência íntimas com o político.

“Aos sete anos de idade, em Diamantina, já abria a porta da minha casa todas as vezes em que o prefeito Juscelino Kubitschek ia visitar meus pais”, recorda. Longos anos depois, após retornar do exílio, em 1967, JK escolheu esse mesmo menino, agora em seus trinta e poucos anos, para acompanhá-lo. De tanto vê-los lado a lado, o colunista social Wilson Frade passou a chamar Serafim de “secretário particular de JK”. No entanto, o verdadeiro cargo era de “amigo de todas as horas, boas ou difíceis”, como descreveu o ex-presidente em uma dedicatória do livro Por que Construí Brasília ao colega.

Além de ajudar na tomada de decisões, fossem elas políticas ou não, Serafim desfrutou de momentos com Juscelino que ficaram eternizados em sua memória. Entre eles, vale destacar o encontro que aconteceu por coincidência, em 1971, com Fernando Brant, Lô Borges, Márcio Borges e Milton Nascimento, integrantes do icônico Clube da Esquina, quando improvisaram uma roda de violão nas ruas de Diamantina. Ou da inauguração da Toca da Raposa, em 3 de fevereiro de 1973, o primeiro centro de treinamento do Cruzeiro, de onde JK, cruzeirense fanático, saiu todo sorridente. 

Um memorial que resiste

Apesar de ter acatado o pedido do amigo como um propósito de vida, Serafim reparte que cuidar deste imenso legado não é uma responsabilidade fácil. Por falta de apoio, a Casa de Juscelino chegou a fechar as portas por mais de um ano, reabrindo em setembro de 2019. “Foram tempos difíceis”, desabafa. Ele conta que o local recebia do governo estadual um pequeno repasse financeiro anual para a sua manutenção, mas que essa ajuda deixou de existir há anos. 

Hoje, a Casa permanece aberta graças aos turistas, à ajuda de poucos com quem pode contar e, principalmente, à amizade e lealdade entre dois grandes amigos. “Só por isso ainda tenho forças para cumprir a minha difícil, mas valorosa missão”, confessa Serafim. “JK. Procura-se outro!”

Redação GPS

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