A chegada de Bento, que hoje tem 1 ano e meio, transformou profundamente a vida — e a identidade — de Luísa Neves, 30. A brasiliense conta que os primeiros meses da maternidade, sendo mãe de primeira viagem, foram marcados por desafios intensos, mudanças radicais na rotina e uma reconexão gradual consigo mesma.
“Foi uma mudança de rotina muito engraçada, porque enquanto a gente está grávida, nada prepara a gente para, de fato, a nova rotina que a gente vai ter, a nova vida que a gente vai ter“, diz Luísa. Esse relato ilustra uma realidade emocional enfrentada por muitas mulheres no puerpério.
Segundo a psicóloga Leninha Wagner, nesse momento, tudo é novidade, e tudo muito intenso. “O puerpério é uma fase marcada por exaustão física, privação de sono, medo constante de errar, além de alterações hormonais e neuroquímicas intensas“. Para ela, o cérebro materno passa por uma verdadeira reconfiguração, o que torna a mulher mais vulnerável emocionalmente. “A solidão e o sentimento de invisibilidade também são muito comuns, mesmo que a mulher esteja cercada de pessoas“, completa.
Luísa experimentou essa sobrecarga desde os primeiros dias. “Tudo era tão novo e é uma vontade tão grande de fato priorizar sempre o filho, que a gente acaba se esquecendo“, conta. A consequência foi o afastamento das atividades que costumava fazer por si mesma, como os treinos na academia: “Eu me escondia também um pouco atrás da maternidade, para não fazer muitas coisas para mim”.

Luísa e Bento | Foto: Arquivo pessoal
A negação das próprias necessidades é mais comum do que se pensa. A psicóloga explica que a mulher pode vivenciar tristeza profunda, sensação de incapacidade, desesperança ou uma desconexão afetiva com o bebê, em muitos casos.
“Precisamos construir uma cultura que acolha a ambivalência, a falha e a vulnerabilidade da experiência materna. A mãe não é uma entidade mágica — é uma mulher real que precisa ser cuidada para que possa cuidar”, analisa Leninha.
A importância do autocuidado na maternidade
De acordo com a psicóloga, o autocuidado deve ser entendido como parte da saúde mental e da qualidade da maternagem. No caso de Luísa, o ponto de virada veio de forma repentina: “Foi do dia pra noite. Eu falei: a partir de amanhã eu começo, eu volto a me exercitar da forma como eu preciso.”
Após tentativas em casa, ela se matriculou em uma academia e percebeu que precisava de um momento só dela, longe dos cuidados com os outros que precisa desempenhar quase 24 horas por dia.
A psicóloga ressalta que muitas mulheres passam por um período de luto com a sua versão antiga, mas os papéis mudam, e é preciso entender isso. “O luto pela ‘antiga eu’ é legítimo. Para lidar com isso, é necessário tempo, acolhimento emocional e resgate gradual de atividades que a conectem com quem ela é fora do papel materno.“
Felizmente, não foi o caso de Luísa, já que a mudança no estilo de vida também afetou a sua vida social, mas ela se diz satisfeita com o momento. “Deixei de fazer muitas coisas que eu gostava, mas estou fazendo muitas coisas diferentes também, que antes eu não fazia muito… para mim tá muito mais gostoso.“
Ela diz que a chegada de Bento transformou sua visão sobre trabalho e prioridades: “Antes eu era super workaholic… hoje em dia não.” Agora, sua principal preocupação é o bem-estar do filho. “Se acontece alguma coisa com ele, para mim, o trabalho vira completamente secundário.”
No entanto, a especialista ainda alerta para a pressão de se manter perfeita em todas as frentes. “A expectativa irreal, alimentada por redes sociais, gera culpa crônica, sensação de fracasso e desconexão com o amor próprio. Olhar para a culpa com curiosidade, e não com julgamento. Entender de onde ela vem já é um ato de libertação“, ressalta.

Luísa e Bento | Foto: Arquivo pessoal
Entre fraldas, noites mal dormidas, mudanças e redescobertas, Luísa diz com serenidade: “Sou completamente feliz e realizada e apaixonada por ser mãe.”