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Sucesso na França, peça ‘Tom na Fazenda’ volta mais arrojada

Quando iniciar uma nova temporada em São Paulo, a partir da sexta, 5, no Teatro Vivo, a peça Tom na Fazenda estará em outro patamar em relação às apresentações que fez aqui em 2019. Afinal, se naquela época a produção ainda era desconhecida e contou com o providencial apoio do Sesc, agora volta à cena paulistana com reconhecimento na França e Canadá, além de uma agenda para 2024 com mais de 45 apresentações programadas para 27 cidades da França, Bélgica, Suíça, Marrocos e Portugal, durante quatro meses ininterruptos.

 

“Nem no momento de mais alto otimismo eu esperava por isso”, confessa Armando Babaioff, ator, tradutor e produtor de Tom na Fazenda. Afinal, em 2022, quando a epidemia da covid começava a ser controlada e as fronteiras reabriam, ele planejava a volta da peça, que havia estreado cinco anos antes. Com vários prêmios no currículo (APCA, Shell, Cesgranrio, APTR), o espetáculo, acreditava ele, ainda tinha fôlego para mais temporadas. “Havia a possibilidade de voltar a São Paulo, mas o (diretor de produção) Sérgio Saboya me provocou: por que não tentar festivais no exterior?”, conta Babaioff.

 

O conselho teve o efeito semelhante a um toque de Midas, rei da mitologia grega que transformava em ouro tudo o que tocava. Mas se lá era uma maldição, aqui foi como uma bênção: mesmo com recursos escassos, provenientes de uma telenovela recém-terminada, Babaioff tomou coragem e inscreveu a montagem no Festival de Avignon, na França. Chegou lá como mais uma das 1 570 peças que disputavam avidamente a atenção dos programadores. E saiu consagrada como destaque do evento, com longo e emocionado aplauso do público.

 

Paris

 

“Meu plano era ter dois ou três contratos com produtores internacionais para cobrir os gastos da viagem, mas foram 46 interessados.” Um deles, a prefeitura de Paris, bancou a viagem até a capital francesa, onde fizeram 24 apresentações com ingressos esgotados no Théâtre Paris-Villette. Novamente, uma comoção: “É raro ver uma encenação ser ovacionada de pé todas as noites e uma atuação alucinante de seus atores que fazem um trabalho incrível de interpretação”, observou Laurent Goumarre, no jornal Libération. “Em Tom à la Ferme, a tessitura das palavras é feita sob medida para a encarnação dos atores”, completou Joelle Gayott, no Le Monde.

 

“Os franceses estão habituados a um teatro mais declamativo, que aposta no valor da palavra, e se surpreenderam com um grupo de brasileiros carregados de afeto, que passam a emoção pelo gestual do corpo e não apenas pela voz”, acredita Babaiaoff. “Em poucos minutos, o público se descobria seduzido pela experiência e o final era uma verdadeira catarse, com aplausos demorados.”

 

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Foto: Cortesia

 

De fato, a montagem dirigida com precisão por Rodrigo Portella é uma experiência sensorial, marcada por explosões de violência que se alternam com manifestações de ternura. Escrita pelo canadense Michel Marc Bouchard, a peça acompanha a ida do publicitário Tom (Babaioff) para a fazenda da família do namorado, morto precoce e repentinamente, onde ocorrerá o funeral. Lá, descobre que Agatha, a sogra (Soraya Ravenle), nunca tinha ouvido falar dele e tampouco sabia que o filho era gay.

 

Farsa

 

Nesse ambiente rural e austero, Tom é envolvido em uma trama de mentiras criada por Francis (Gustavo Rodrigues), o truculento irmão do falecido, que o obriga a compactuar com uma farsa a fim de ocultar de Agatha a sexualidade do filho morto. “Tom deseja estabelecer contato com o irmão de seu namorado. Mas, de início, Francis recusa qualquer cumplicidade. Quando surge uma conexão entre ele e Tom, tudo fica perigoso. Cada um, à sua maneira, expressa essa intimidade”, comentou Bouchard ao Estadão em 2017, quando da estreia carioca da peça.

 

O autor canadense acompanhou pessoalmente a montagem no Rio e ficou tão impressionado que a recomendou para o Festival TransAmériques (FTA), de Montreal, um dos festivais de teatro contemporâneo mais importantes da América do Norte. Foram três apresentações, com casa lotada e uma apaixonada reação de público que se repetiria na França.

 

Foi lá que Babaioff e os outros atores (Camila Nhary completa o elenco) perceberam uma reação dos espectadores estrangeiros que não acontecia nas sessões no Brasil. “Eles viam algumas cenas como muito violentas, especialmente no momento em que meu personagem fica pendurado de cabeça para baixo. De fato, é muito forte e isso não acontece em nenhuma outra versão do mundo”, diz Babaioff.

 

Aqui, o frisson é provocado por um detalhe que os estrangeiros já abordam com mais civilidade: a inabilidade no trato com uma relação homoafetiva. O envolvimento cada vez mais epitelial entre Tom e Francis, que alternam repulsa e interesse, é uma forma inteligente com que o texto aborda a inabilidade do indivíduo para lidar com o preconceito, a impotência, a violência e o fracasso. “Sentimentos fortes com que conseguimos lidar no grupo graças ao afeto que nos une”, diz Babaioff.

 

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

 

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