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Seletividade alimentar não é frescura e deve ser tratada; saiba como lidar

Condição pode comprometer diretamente o crescimento e o desenvolvimento saudável da criança, e perdurar até a idade adulta

A Sociedade Brasileira de Pediatria caracteriza a seletividade alimentar como um comportamento em que a criança recusa determinados alimentos, apresenta pouco apetite ou demonstra desinteresse pela comida. “Trata-se da recusa persistente tanto de alimentos novos quanto familiares, de forma suficientemente intensa a ponto de impactar a rotina diária e os relacionamentos familiares”, explica a nutricionista brasiliense Milena de Paula.

Ela conta que os hábitos alimentares e a percepção de sabores começam a ser formados ainda no útero materno, a partir do terceiro trimestre da gestação. Nessa fase, os sabores dos alimentos consumidos pela gestante chegam ao feto, o que contribui para o início da memória gustativa. 

Após o nascimento, os bebês que recebem leite materno também continuam a experimentar diferentes sabores, uma vez que o leite pode sofrer variações conforme a alimentação da lactante, ao contrário da fórmula, que possui sabor padronizado. “Até os 12 meses de idade, os bebês apresentam maior facilidade na aceitação de novos sabores, mas, após esse período, essa receptividade tende a diminuir”, destaca a nutricionista.

Segundo ela, a seletividade alimentar costuma se manifestar em crianças com mais frequência na fase pré-escolar, entre os dois e seis anos de idade. “Nesse período, é comum a criança demonstrar menor interesse por alimentos e desenvolver certa inapetência”, adverte.

Entre as principais características da seletividade alimentar estão: 

  • aceitação restrita a poucos alimentos;
  • monotonia alimentar;
  • recusa em sentar-se à mesa com a família;
  • lentidão ao comer;
  • resistência em experimentar novos alimentos;
  • comportamentos rígidos em relação à aparência e textura da comida, como inspecionar visualmente o prato e recusar qualquer item fora do padrão esperado.
Seletividade alimentar não é frescura e deve ser tratada; saiba como lidar

Foto: Freepik

Quando não tratada adequadamente, a seletividade pode persistir até a vida adulta e levar a deficiências nutricionais importantes, comprometendo diretamente o crescimento e o desenvolvimento saudável da criança.

Para o diagnóstico, do ponto de vista nutricional, é utilizado o questionário Children’s Eating Behavior Questionnaire (CEBQ), que permite identificar padrões de desinteresse alimentar e direcionar o tratamento. Além disso, o Transtorno Alimentar Restritivo Evitativo (TARE) pode estar presente como uma condição associada à seletividade. 

O TARE se caracteriza pela ingestão alimentar insuficiente para suprir as necessidades nutricionais e/ou energéticas, podendo provocar perda de peso significativa, deficiências nutricionais, prejuízos psicossociais, falta de apetite, rejeição por determinadas cores ou texturas, traumas alimentares e consumo apenas de pequenas porções. “Vale destacar que até mesmo indivíduos com obesidade podem apresentar TARE, desde que haja comprometimento nutricional”, esclarece.

As causas da seletividade alimentar são multifatoriais e podem envolver tanto aspectos intrínsecos quanto extrínsecos. Entre os fatores intrínsecos estão: 

  • traços comportamentais da criança, como sensibilidade exacerbada a texturas, cheiros e sabores;
  • frustração durante as refeições;
  • condições como Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

Já os fatores extrínsecos envolvem o ambiente familiar e social, incluindo ansiedade ou depressão materna, pais seletivos ou com hábitos alimentares rígidos. “Alguns comportamentos parentais também podem contribuir para o agravamento da seletividade, como o uso de recompensas, imposição ou pressão para que a criança experimente determinado alimento, uso de telas durante as refeições (TV, celular ou tablet), introdução alimentar precoce ou tardia, além de alergias e intolerâncias alimentares mal manejadas”, destaca Milena.

De acordo com a nutricionista, todas essas questões, se não forem tratadas com atenção, podem trazer consequências ao longo de toda a vida. “Adultos seletivos, na maioria das vezes, já apresentavam esse comportamento na infância, evidenciando que a seletividade alimentar não se restringe apenas ao público infantil, mas também pode atingir adolescentes e adultos”, observa.

Para tratar a seletividade alimentar, o processo deve ser conduzido por uma equipe multidisciplinar, composta geralmente por terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, psicólogo e nutricionista. “No âmbito nutricional, aplica-se a terapia alimentar nutricional, que envolve a apresentação gradual de alimentos novos e familiares em cada sessão, respeitando as etapas do comer: tolerar, interagir, cheirar, tocar, provar e, por fim, comer”, detalha.

Durante a terapia, a criança é incentivada a participar ativamente das etapas de preparo dos alimentos, o que desperta a curiosidade e interesse por eles. “Essa abordagem lúdica permite que o alimento deixe de ser um objeto de rejeição para se tornar uma experiência sensorial positiva”, afirma. 

Além do trabalho direto com a criança, também é fundamental o envolvimento dos pais no processo, que devem ajudar a conduzir a alimentação dentro de casa de maneira mais leve e respeitosa. Isso envolve, por exemplo, evitar o uso do alimento como chantagem ou forma de punição, melhorar o ambiente das refeições e incluir a criança na rotina alimentar da família, seja durante as compras, no preparo dos pratos ou até mesmo no momento de se servir. 

“É importante que a criança desenvolva autonomia para reconhecer sua fome e escolher a quantidade de alimento que deseja consumir, promovendo uma relação mais saudável com a comida”, destaca.

Seletividade alimentar não é frescura e deve ser tratada; saiba como lidar

Foto: Freepik

Ainda, a organização de uma rotina alimentar bem estruturada, com horários definidos para as refeições e intervalos adequados entre elas também favorece o surgimento da fome fisiológica, melhorando, assim, a aceitação alimentar. 

Além desses, outros fatores que contribuem para o tratamento da seletividade incluem:

  • oferecer novos alimentos junto com os que já são aceitos;
  • manter um ambiente calmo e acolhedor durante as refeições;
  • permitir que a criança participe da preparação dos alimentos. 

É importante destacar, ainda, que o estresse interfere diretamente na alimentação. “O aumento da adrenalina em situações estressantes coloca o corpo em estado de alerta, luta, fuga ou defesa, o que reduz o interesse pelo alimento. Além disso, situações de estresse diminuem a liberação de dopamina, neurotransmissor associado ao prazer e à saciedade, o que compromete a experiência alimentar da criança”, alerta

Já no caso de adultos seletivos, o tratamento é diferente. Durante a infância, quando a memória alimentar está sendo formada, é possível trabalhar a seletividade de forma mais leve, lúdica e eficaz. “Já na vida adulta, o processo exige mais tempo e paciência, sendo feito por meio da reeducação alimentar”, afirma. 

Milena explica que o foco não é necessariamente introduzir alimentos novos de forma direta, mas sim incorporá-los gradualmente em preparações do dia a dia, com o objetivo de alcançar um aporte nutricional adequado. “Por isso, é fundamental tratar a seletividade alimentar ainda na infância, prevenindo impactos futuros e evitando que esse comportamento seja perpetuado na vida adulta ou transmitido para as próximas gerações”, completa.

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