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Saúde e nutrição com Clayton Camargos: “Hara Hachi Bu!”

O nutricionista fala mais sobre a alimentação das 'Blue Zones'
Foto: Unsplash

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Na coluna passada escrevi sobre as Blue Zones, as “Zonas Azuis”, que são regiões do mundo onde as pessoas tendem a viver vidas mais longas, muitas vezes chegando aos 90 e até aos 100 anos ou mais. Clique aqui para acessar o estudo.

Lembrando, existem cinco Zonas Azuis conhecidas. Quais sejam:

  • Okinawa, Japão;
  • Icária, Grécia;
  • Ogliastra na Sardenha, Itália;
  • Nicoya, Costa Rica;
  • Loma Linda na Califórnia, Estados Unidos;

As pesquisas nos mostram que, embora o envelhecimento seja influenciado pelos genes e possa variar de pessoa para pessoa, fatores externos podem afetar muito o tempo de passagem pelo planeta. Estes podem incluir dieta, estilo de vida, estresse e ambiente social. Clique para acessar o estudo.

Posto que as Zonas Azuis estejam espalhadas por todo o mundo, as suas dietas e estilos de vida partilham algumas semelhanças. Por exemplo, as pessoas nessas áreas tendem a fazer mais exercícios e a comer muitos vegetais, oleaginosas, grãos integrais e legumes. Aqui analiso as dietas de cada uma dessas localidades.

Dieta de Okinawa

Okinawa é uma região de um grupo de ilhas chamadas Ryukyu, no sul do Japão. Sua dieta refere-se ao padrão alimentar tradicionalmente seguido por seus residentes. Os okinawanos estão entre as pessoas que vivem mais tempo no mundo. A dieta é baixa em calorias, mas densa em nutrientes. Clique aqui para acessar o estudo.

Seus residentes compartilham uma filosofia de encerrarem as refeições quando se sentem 80% satisfeitos, jamais 100%. O que é chamado “Hara Hachi Bu”, isto é, a saciedade não está na plenitude prandial. Comer o necessário, nem mais e nem menos, para viver mais anos de vida com qualidade.

É principalmente uma dieta baseada em vegetais que se concentra na batata-doce, folhas verdes, raízes amarelas, soja e grãos de baixo índice glicêmico – aqueles que não aumentam os níveis de açúcar no sangue. Ao priorizar esses alimentos, o plano alimentar dos okinawanos se torna rico em vitaminas e minerais. Também contém antioxidantes, que ajudam a combater os radicais livres e a reduzir o risco de doenças crônicas relacionadas à idade.

Embora a dieta de Okinawa não seja estritamente vegetariana, as pessoas consomem alimentos de origem animal com moderação. O mesmo se aplica aos itens processados e doces. Aqui está uma lista de alimentos básicos para comer e evitar ao seguir o padrão tradicional okinawano:

Alimentos para comer frequentemente

  • Legumes: batata doce, melão, broto de bambu, repolho, rabanete, quiabo, abóbora, cenoura e bardana;
  • Leguminosas: principalmente soja e seus derivados, como tofu, missô e natto;
  • Grãos: milho e arroz.
  • Carnes e aves: cortes magros de porco, frango e, ocasionalmente, cabra;
  • Peixes e vegetais marinhos: merluza, linguado, enguia e algas;
  • Condimentos: açafrão e diversas ervas e especiarias em vez de sal.

Alimentos para evitar

  • Laticínios: leite, iogurte, queijo e manteiga;
  • Carnes e aves: carne bovina, carnes processadas ou curadas e ovos;
  • Outros: óleos de cozinha, frutas, doces, oleaginosas e sementes.
Foto: Unsplash

Dieta da Sardenha

A ilha da Sardenha está localizada a oeste da Península Italiana, no Mar Mediterrâneo. Diz-se que é o lar dos homens que viveram mais tempo na terra. A dieta da Sardenha é uma variação da dieta mediterrânea – também chamada Sardo-Mediterrânea, que está associada à prevenção de doenças crônicas relacionadas à idade.

A dieta mediterrânea é caracterizada por uma grande variedade de frutas e vegetais, grãos integrais e legumes minimamente processados, oleaginosas e azeite como principais fontes de gordura, consumo moderado de peixe e baixa ingestão de laticínios, álcool e carne vermelha.

Em contraste, a variação da Sardenha inclui maior consumo de azeite, peixe, leite, produtos lácteos e bebidas alcoólicas. Alguns dos alimentos que as pessoas consomem e evitam na dieta da Sardenha, incluem:

Alimentos para comer frequentemente

  • Legumes: tomate, batatas, cebola, repolho, abobrinha e cenoura;
  • Frutas: laranja, maçã, banana, tâmara, figo e pêssego;
  • Leguminosas: favas, lentilha e grão de bico;
  • Grãos: cevada e trigo para seus tradicionais pães achatados e massas;
  • Laticínios: leite de cabra e ovelha, iogurte e queijo;
  • Peixes e frutos do mar: robalo, anchova, polvo, mexilhões, amêijoas e lagosta;
  • Gorduras: azeite e oleaginosas, como amêndoas e avelãs;
  • Ervas e especiarias: salsa, erva-doce, hortelã, louro, aipo e alho;
  • Álcool: vinho tinto de uvas Cannonau e licor de murta.

Alimentos para comer ocasionalmente

  • Certas carnes: boi, cordeiro e porco;
  • Doces: mel, massa folhada e cascas de laranja cristalizadas.

Alimentos para evitar

  • Algumas carnes e aves: incluindo itens processados ou curados;
  • Alimentos processados: bebidas adoçadas com açúcar, grãos, óleos refinados, alimentos e lanches prontos para consumo.

Dieta Icária

Icária é uma pequena ilha grega localizada no Mar Egeu. A sua dieta também é uma variação da abordagem mediterrânea, com maior ingestão de café, batatas e laticínios integrais.

No entanto, ainda dá ênfase às frutas, vegetais, azeite, cereais e leguminosas, mantendo um baixo consumo de produtos cárneos e uma ingestão moderada de vinho. Os alimentos para comer e evitar na dieta icariana, incluem:

Alimentos para comer frequentemente

  • Legumes: tomate, cenoura, batata, brócolis, espinafre, couve e verduras silvestres;
  • Frutas: damasco, figo, ameixa, romã, frutas vermelhas, kiwi, laranja, limão e melancia;
  • Leguminosas: feijão, grão de bico e lentilha;
  • Grãos: cereais integrais e pão;
  • Laticínios: leite de cabra, iogurte e queijo;
  • Peixes e frutos do mar: sardinha, salmão, truta e arenque;
  • Gorduras: azeite e oleaginosas, incluindo amêndoas e nozes;
  • Ervas e especiarias: hortelã, alecrim, sálvia, artemísia, alho, tomilho, manjericão e orégano;
  • Bebidas: café grego fervido e vinho tinto;
  • Doces: mel.

Alimentos para comer ocasionalmente

  • Alguns tipos de carne: bovina, frango, cabra e porco.
  • Alimentos para evitar:
  • Carne processada ou curada: como presunto ou salsicha;
  • Alimentos processados: refrigerantes, doces, alimentos instantâneos e fast food.

Dieta Nicoya

Nicoya está localizada na província de Guanacaste, na Costa Rica. Esta região específica tem uma taxa de mortalidade 20% menor que o resto do país.

Em comparação com as dietas retro mencionadas, a de Nicoya apresenta maior teor de proteínas de origem animal e menor ingestão de gorduras saudáveis. No entanto, também é caracterizada por uma elevada ingestão de fibras e alimentos com baixo índice glicêmico – o que também significa uma menor ingestão de itens processados e refinados.

A dieta nicoyana é abundante em alimentos simples e tradicionais, como arroz, feijão, milho, frango e ovos. As pessoas também consomem itens mais caros, como queijo envelhecido e azeite de oliva extra virgem, no entanto, mais raramente. A dieta dos nicoyanos inclui:

Alimentos para comer frequentemente

  • Legumes: mandioca, abóbora, pimentão, cebola, repolho, tomate e pepino;
  • Frutas: mamão, banana, manga e abacaxi;
  • Leguminosas: feijão preto e lentilha;
  • Grãos: arroz, milho e pão integral;
  • Laticínios: queijos moles;
  • Aves: frango e ovos;
  • Gorduras: manteiga, abacate, canola e óleo de girassol;
  • Bebidas: suco de frutas frescas, café e guaro – uma bebida alcoólica tradicional.

Alimentos para comer ocasionalmente

  • Algumas carnes frescas: bovina e suína;
  • Doces: bolos, açúcar de mesa, biscoitos e compotas.
  • Alimentos para evitar:
  • Carnes processadas e curadas;
  • Laticínios: leite de vaca;
  • Alimentos ultraprocessados: grãos refinados, refrigerantes e alimentos congelados.

Dieta Adventista do Sétimo Dia

A Dieta Adventista do Sétimo Dia refere-se ao padrão alimentar da comunidade religiosa localizada em Loma Linda, Califórnia, nos Estados Unidos. Seus residentes seguem uma rotina alimentar predominantemente vegana. É baseada em oleaginosas, legumes e folhas verdes. É a única da Zona Azul que é majoritariamente baseada em vegetais.

Os estudos sugerem que as dietas veganas podem reduzir o risco de doenças crônicas, como diabetes tipo 2 e cardíacas. Esta pode ser uma chave para o aumento da longevidade dessa comunidade. Clique aqui para acessar o estudo.

Apesar de ser sobretudo vegana, esta dieta divide as carnes em categorias “limpas” e “impuras”, de acordo com a Bíblia. Os adventistas podem optar por comer algumas das opções “limpas”. Aqui está uma lista de alimentos para comer e evitar de acordo com os habitantes de Loma Linda:

Alimentos para comer frequentemente

  • Legumes: tomate, folhas verdes, brócolis, nabo, cenoura e cebola;
  • Frutas: maçã, pêra, banana, pêssego, laranja e manga;
  • Legumes: feijão e lentilha;
  • Grãos: aveia, pão integral, quinoa, milho, arroz e amaranto;
  • Proteína vegetal: soja e seus derivados, como tofu, tempeh e edamame;
  • Gorduras: azeite e oleaginosas, como castanha de caju e amêndoas.

Alimentos para comer ocasionalmente

  • Algumas carnes: salmão, frango, ovos e carne de vaca;
  • Laticínios: leite desnatado e seus derivados.

Alimentos para evitar

  • Certas carnes: incluindo carne de porco e marisco;
  • Laticínios: produtos lácteos integrais;
  • Bebidas: bebidas alcoólicas e com cafeína;
  • Certos aromas: condimentos quentes e especiarias;
  • Alimentos ultraprocessados: doces e outros alimentos altamente refinados, como congelados, embalados e fast food.

O resultado final

A despeito de a maioria das dietas das Zonas Azuis serem principalmente baseadas em vegetais, uma delas, a de Nicoya, depende de alimentos de origem animal como principal fonte de proteína. Ainda assim, todas partilham outras características, como o elevado consumo de frutas, vegetais e alimentos com baixo índice glicêmico. E o mais importante: comem em quantidades parcimoniosas, sem abundância, mas com fartura de qualidade. Hara Hachi Bu!

Você tem alguma dúvida sobre saúde, alimentação e nutrição? Envie um e-mail para dr.clayton@metafisicos.com.br e poderei responder sua pergunta em uma coluna futura.

Foto: Arquivo pessoal

*Clayton Camargos é sanitarista pós graduado pela Escola Nacional de Saúde Pública – ENSP/Fiocruz. Desde 2002, ex gerente da Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC) do Ministério da Saúde. Subsecretário de Planejamento em Saúde (SUPLAN) da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES-DF). Consultor técnico para Coordenação-Geral de Fomento à Pesquisa Em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde. Coordenador Nacional de Promoção da Saúde (COPROM) da Diretoria de Serviços (DISER) da Fundação de Seguridade Social. Docente das graduações de Medicina, Nutrição e Educação Física, e coordenador dos estágios supervisionados em nutrição clínica e em nutrição esportiva do Departamento de Nutrição, e diretor do curso sequencial de Vigilância Sanitária da Universidade Católica de Brasília (UCB). Atualmente é proprietário da clínica Metafísicos.