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Saúde e nutrição com Clayton Camargos: “barriga de cerveja”?

Não importa o formato do corpo, a regionalização da gordura merece ser considerada, e cada vez mais temos evidências de que o depósito que fica no fundo do abdômen é mais perigoso do que aquele que podemos pinçar com os dedos.

Na maioria das pessoas, cerca de 90% da gordura corporal é subcutânea, o tipo que fica numa camada logo abaixo da pele. Se palparmos a barriga, o tecido macio é a gordura subcutânea. Os 10% restantes – chamados visceral ou intra-abdominal – ficam fora de alcance.

Esse depósito é encontrado nos espaços ao redor do fígado, intestinos e outros órgãos. Também é armazenado no omento, uma aba de tecido semelhante a um avental que fica sob os músculos da barriga e cobre os intestinos. O omento fica mais duro e espesso à medida que se enche de gordura. Mesmo que não aumentemos o peso, a cintura pode crescer centímetros à medida que a gordura visceral empurra a parede abdominal.

Em suma, a gordura acumulada abaixo do abdômen (formato de “pêra”) é subcutânea, enquanto a depositada do abdômen para cima (formato de “maçã”) é predominantemente visceral. Clique aqui para acessar o estudo

Embora a gordura visceral represente apenas uma pequena proporção da composição corporal, ela é um fator-chave para uma variedade de problemas de saúde. Onde você tende a acumular gordura depende de seus genes, sexo, seus hormônios, sua idade e seu peso ao nascer (bebês menores aumentam mais facilmente a gordura abdominal quando adultos).

Foto: Freepik

Os homens têm menos gordura subcutânea, portanto, tendem a armazenar mais na região abdominal. Quando jovens adultas, as mulheres têm, em média, menos gordura visceral do que os homens, mas isso muda com a menopausa. A redução da secreção do hormônio estradiol transforma a relação cintura-quadril, favorecendo a concentração de gordura abdominal e diminui os estoques localizados nos quadris e glúteos. Mulheres menopausadas que não fazem terapia de reposição hormonal apresentam maior exposição à deposição visceral. Você não pode mudar seu peso ao nascer ou os seus genes, e não pode cancelar a menopausa.

A gordura corporal, ou tecido adiposo, já foi considerada pouco mais do que um depósito que aguardava passivamente para ser usada como energia. Mas a ciência mostrou que as células de gordura – especialmente as do tipo visceral – são biologicamente ativas. Uma constatação importante é que o adipócito é um órgão endócrino, que secreta hormônios e outras moléculas que têm efeitos de longo alcance em diversos tecidos.

Antes de os investigadores reconhecerem que a gordura atua como uma glândula endócrina, pensavam que o principal risco do depósito visceral era influenciar a produção de colesterol por meio da liberação de ácidos graxos livres na corrente sanguínea e no fígado. No entanto, sabemos que há muito mais nessa história. As pesquisas identificam uma série de produtos bioquímicos que associam a adiposidade intra-abdominal a uma variedade surpreendentemente ampla de doenças.

Essa gordura produz mais citocinas, por exemplo, fator de necrose tumoral e interleucina-6, substâncias que podem desencadear processos inflamatórios. Também gera um precursor da angiotensina, uma proteína que causa a contração dos vasos sanguíneos e o aumento da pressão arterial. E ainda pode elevar os níveis de açúcar no sangue com efeitos deletérios na sensibilidade das células ao hormônio insulina, aumento dos triglicerídeos e redução do colesterol HDL (também conhecido como “bom” colesterol). Em conjunto, estas alterações, identificadas como síndrome metabólica, progridem as chances de diabetes tipo 2, doenças cardíacas, acidentes cerebrovasculares, câncer colorretal e uma variedade de condições crônicas não transmissíveis. Clique aqui para acessar o estudo.

Em tempos de painéis virais ampliados com Covid-19, Dengue, Chicungunya e Zica, os portadores de obesidade acompanhada de gordura visceral, em razão da liberação crônica de citocinas, e, portanto, sistemicamente inflamados; apresentam mais chances de complicações, rebaixamentos e desfechos fatais frente aos infectados que estão normopesados e sem depósitos excessivos de concentração de tecido adiposo intra-abdominal. Clique aqui para acessar o estudo.

Foto: Unsplash

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a circunferência abdominal deve ser medida na região mais estreita do abdômen ou no ponto médio entre o rebordo intercostal inferior e a crista ilíaca. A aferição deve ser realizada com uma fita métrica flexível posicionada em plano horizontal.

É importante destacar que não há um consenso global sobre os valores de perímetros de cintura e abdômen conectados ao aumento de mortalidade por todas as causas. De outra parte, para associação de elevação do risco de doenças cardiovasculares, o National Cholesterol Education Program (NCEP)/Adult Treatment Panel III (ATP-III) utiliza o perímetro abdominal entre 102 cm para os homens e 88 cm para as mulheres. Clique aqui para acessar o estudo.

Dito isso, existem inúmeras abordagens para minimizar o acúmulo da gordura visceral. O exercício físico pode ajudar a reduzir a circunferência do abdômen. Mesmo que você não emagreça, poderá diminuir a concentração intra-abdominal e aumentar a massa muscular. Pratique pelo menos 30 minutos de atividades de intensidade moderada na maioria dos dias. Crie também oportunidades para adicionar movimento às tarefas rotineiras. Por exemplo, estacione o automóvel mais longe do seu destino e caminhe o resto do trajeto, use as escadas em vez do elevador e fique em pé enquanto fala ao telefone.

Estudos demonstraram que você pode ajudar a reduzir a gordura visceral ou prevenir sua evolução tanto com atividades aeróbicas (como caminhada rápida) como com treinamento de força (exercícios com pesos). Exercícios pontuais, como abdominais, podem contrair os músculos abdominais, mas não alcançam a gordura visceral. A hipertrofia muscular também pode evitar sua reinstalação. Clique aqui para acessar o estudo.

Eleja uma alimentação equilibrada que potencialize a manutenção de um peso saudável. Evite produtos que estimulem a deposição de gordura abdominal, especialmente açúcares simples, como alimentos e bebidas adoçadas com frutose. Reduza ao máximo o consumo de itens ultraprocessados.

E a “barriga de cerveja”? As pesquisas nos mostram que NÃO existe uma relação causa-efeito a partir do consumo de cerveja ou outras bebidas alcoólicas com o aumento da circunferência abdominal. O culpado são as calorias; se você ingere mais energia por meio de alimentos e bebidas alcoólicas do que gasta com exercícios físicos, armazenará o excesso nas células de gordura. O álcool, por sua vez, pode aumentar seu apetite. E não se esqueça das calorias dos alimentos que acompanham os drinques. Além disso, quando você está bebendo em um bar ou festa, a comida disponível costuma ter uma alta densidade energética, como pizza, salgadinhos e muitos alimentos gordurosos e de alto índice glicêmico. Clique aqui para acessar o estudo.

Não fume: quanto mais você fuma, maior a probabilidade de armazenar gordura no abdômen, e não nos quadris e coxas.

Sono: dormir muito pouco é ruim. A ciência nos mostra que adultos com menos de 40 anos de idade que dormiam cinco horas ou menos por noite acumulavam significativamente mais gordura visceral. Mas o contrário também não é bom, os jovens adultos que dormem mais de oito horas também aumentaram mais tecido adiposo nessa região. Essa relação não foi encontrada em indivíduos com 40 anos ou mais. Clique aqui para acessar o estudo.

Esqueça soluções rápidas! A lipoaspiração para remoção cosmética de gordura não alcança o depósito visceral.

A boa notícia: a gordura intra-abdominal é metabolicamente mais ativa, e pode ser degradada em maior velocidade, respondendo com mais eficiência à dieta e aos exercícios físicos do que os depósitos regionalizados nos quadris e coxas. Por isso, geralmente é a primeira a diminuir, sobretudo, quando você tem muito a emagrecer.

Você tem alguma dúvida sobre saúde, alimentação e nutrição? Envie um e-mail para dr.clayton@metafisicos.com.br e poderei responder sua pergunta futuramente.

*Nenhum conteúdo desta coluna, independentemente da data, deve ser usado como substituto de uma consulta com um profissional de saúde qualificado e devidamente registrado como especialista no seu Conselho de Categoria correspondente.

**Clayton Camargos (CRN-1 2970) é sanitarista pós graduado pela Escola Nacional de Saúde Pública – ENSP/Fiocruz. Desde 2002, ex gerente da Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC) do Ministério da Saúde. Subsecretário de Planejamento em Saúde (SUPLAN) da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES-DF). Consultor técnico para Coordenação-Geral de Fomento à Pesquisa Em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde. Coordenador Nacional de Promoção da Saúde (COPROM) da Diretoria de Serviços (DISER) da Fundação de Seguridade Social. Docente das graduações de Medicina, Nutrição e Educação Física, e coordenador dos estágios supervisionados em nutrição clínica e em nutrição esportiva do Departamento de Nutrição, e diretor do curso sequencial de Vigilância Sanitária da Universidade Católica de Brasília (UCB). Atualmente é proprietário da clínica Metafísicos.

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