Uma interessante citação sem autoria encontrada na internet diz que se Albert Einstein nunca tivesse nascido, eventualmente outra mente teria desvendado a teoria da relatividade geral. Contudo, se Pablo Picasso nunca tivesse nascido, seu estilo de arte nunca teria sido criado. Dessa reflexão, emerge a ideia de que, embora o conceito de arte seja amplo, a criação de um estilo específico revela-se desafiadora devido à sua identidade, precisão e autenticidade.
Nesse contexto de busca pela singularidade, o artista brasiliense Raylton Parga molda suas obras de maneira radicalmente similar ao renomado artista espanhol. Inspirado por movimentos artísticos como impressionismo, fauvismo e cubismo, o artista visual nutre uma paixão pela história da arte. Sua fala refinada e seu temperamento sereno e reservado contrastam com a expressividade artística que ele promove, transcendendo, por vezes, os limites da ordem convencional.
Desde a infância, Raylton dedicava-se ao estudo das esculturas de Picasso, desenvolvendo gradualmente suas próprias criações com materiais coletados nas ruas, como madeira, isopor e papelão, na tentativa de reproduzir as obras que o fascinavam nos livros escolares. “Meus primeiros trabalhos consistiam em reproduções do que encontrava nos livros de arte, passando de desenhos com lápis de cor e giz de cera para esculturas elaboradas com materiais recicláveis. Ao tentar reproduzir algumas telas, eu desenhava sobre o papel antes de moldá-lo ao papelão para dar estrutura. As esculturas eram confeccionadas com madeira coletada dos descartes de uma marcenaria próxima à minha casa”, relata o artista.
Com o tempo, o artista nascido em Taguatinga viu o apoio da família tornar-se um impulso essencial para investir na carreira que começou de forma despretensiosa, frequentando cursos dedicados às artes e concluindo sua graduação em Artes Visuais pela Universidade de Brasília. Hoje, aos 28 anos, todo o processo criativo é desenvolvido de um modesto cômodo de 15m², um espaço que Parga brinca ao dizer que deveria ser sua sala de estar. Mas é ali, entre um sofá, uma mesa e uma caixa de papelão repleta de recortes, que as ideias ganham vida. O processo tem a geometria como protagonista. Para ele, formas geométricas estão sempre próximas e sua tarefa é apenas imaginar as possibilidades criativas escondidas ali com a matéria-prima que tiver em mãos.
“Eu gosto do papelão por ser um material maleável, possibilitando vários meios de criação. É um material que utilizo desde a infância. Além de ser um suporte reciclável que, de certa forma, ganha um ressignificado artístico”, explica o artista que, na maioria das vezes, após um trabalho concluído, utiliza-se do material remanescente que se transforma em um novo trabalho. “Então posso dizer que o papelão não é apenas um suporte para minhas criações; ele se torna um parceiro de diálogo. Não alimenta apenas minha expressão artística, como é meu principal recurso”.
O talento do trabalho aos poucos foi recompensado. Parcerias com a Galeria Dalmar Trigueiro, em João Pessoa (PB), uma participação na SP-Arte em conjunto com a galerista Gisella Gueiros (do Gisella Projects) e a mais recente representação com a Galeria Casa Albuquerque, de Brasília, já aparecem no currículo de Parga – esta última, onde nos encontramos com ele para produzir esta reportagem.
Parga celebra estes grandes feitos deste ano. O artista ainda foi contemplado com o Prêmio de Incentivo Artístico Pedro Ivo Verçosa – uma bolsa de estímulo financeiro que busca auxiliar artistas a continuarem suas pesquisas e criações. “Tive grandes oportunidades em 2023. Apesar de estar há alguns anos na área, ainda sou um jovem artista explorando as possibilidades que meu trabalho pode alcançar”, acredita.
Dentro dos seus vários grupos de trabalho, o favorito de Parga é a série FORMS, que ele desenvolve desde 2017 e consiste basicamente em tirar formas do tridimensional e trazer para o bidimensional, criando uma estrutura com objetos do cotidiano e formas como quadrados, retângulo, círculos, linha e pontos para criação de novas formas a partir de objetos já existentes. Essa criação se baseia muito mais nos formatos do que na cor em si. Aqui o que é válido é o monocromático.
Com os olhos voltados para o futuro, Parga demonstra o otimismo e a determinação de expandir ainda mais o alcance de seu trabalho. “Minha ambição é viabilizar projetos em grande escala. Isso não é apenas uma aspiração pessoal, mas também representa um passo ousado em direção a desafios mais impactantes”, conclui o artista.
*Matéria escrita por Edson Caldeira para a Revista GPS 38