Lançado na sexta-feira 3, ‘Coringa, Delírio a Dois’ já é considerado pela crítica especializada e pelo público o pior filme com personagens da DC já lançado. “Ele fracassa como musical, como drama de tribunal, como romance e como desenvolvimento de personagem”, diz o Observer. “Um produto de ambição tosca e sem objetivo.” A verdadeira antítese do premiadíssimo Joker de 2019, do mesmo Todd Phillips, com o mesmo Joaquin Phoenix.
Naquela versão, o diretor foi bem sucedido ao dar significado à rebeldia sem causa do Coringa, personificando-o como um revolucionário social, alguém que resolveu externalizar sua agressividade após passar a vida sendo desprezado, ignorado e tratado de forma degradante. É uma narrativa batida, mas que gera empatia imediata, agrega moralidade à perversidade e justifica, por assim dizer, os crimes do personagem como alguém que merece crédito apenas por desafiar o poder.
Se o Coringa disputasse eleições, seria o candidato anti-sistema. Se a eleição fosse em São Paulo, ele seria Pablo Marçal, cuja postura disruptiva tem seduzido milhares de eleitores, especialmente os mais jovens. O sorriso quase permanente no rosto de Marçal apenas reforça o estereótipo de alguém que debocha das regras, truca seus rivais e segue em busca de um propósito.
Talvez Todd Phillips tivesse mais sucesso se trouxesse neste segundo filme um Coringa candidato a prefeito de Gottan City, considerando que Thomas Wayne, pai de Bruce, disputava o cargo quando foi morto ao lado da mulher, num beco da cidade, por bandidos comuns que queriam as joias de Martha. No primeiro Coringa, o diretor deixou no ar um possível relacionamento extraconjugal de Thomas com Penny Fleck, mãe do jovem Arthur.
Uma ótima trama envolvendo política, romance e questões sociais e até filosóficas. Agora imagine o Coringa prefeito. Como seria a gestão de quem prega o tumulto? Como ele lidaria com pilhas de papéis, planilhas orçamentárias, processos licitatórios, estudos técnicos e intermináveis reuniões para tomada de decisões? Como enfrentaria as máfias, os cartéis, o crime organizado? Como traria ordem ao caos, sendo ele próprio um agente do caos?
No final do filme de Phillips, o protagonista Arthur Fleck rejeita o Coringa e se revela apenas um sujeito fraco, sem qualquer propósito que não fosse o de chamar atenção, decepcionando seus seguidores e sua parceira Lee Quinzel, obcecada pela aura do personagem e sua atitude de “não me importo com nada”. São eles que plantam uma bomba no tribunal e explodem com tudo. É um detendo, outro fã, que mata Arthur e assume sua ideologia, gerando a expectativa por uma trilogia.
Será que nosso Coringa paulistano, acusado por seus ex-advogados de violar deliberadamente a lei eleitoral, quer mesmo ser prefeito? Com laudos médicos forjados, acusações sem prova e provocações pessoais, será o candidato do PRTB usado pela atual Juristocracia para justificar o injustificável e apenas ampliar o arbítrio que assola a direita? Por fim, como na ficção do cinema, o glamour anti-sistema vai se desfazendo como uma maquiagem de palhaço ou de um bobo da Corte.