A moda brasileira é plural, diversa e reflete a riqueza cultural de suas diferentes regiões. Foi com essa visão que Caio Braz, jornalista e apresentador pernambucano, subiu ao palco do evento Estilo Brasília, onde compartilhou sua experiência e reflexões sobre os caminhos da moda no Brasil. Conhecido por seu carisma e irreverência, Caio trouxe à tona questões essenciais para o entendimento de como a moda, mais do que uma expressão estética, é um espelho da identidade nacional.
Caio, que começou sua carreira no início da revolução digital, explicou que sua trajetória foi marcada pelo dinamismo da comunicação. “Eu sou uma cria do conteúdo. Para quem não me conhece, estou criando conteúdo há 16 anos. Sou da primeira geração, quando ainda éramos blogueiros — uma palavra quase extinta hoje”, relembrou durante sua participação no painel A Moda Hoje e Amanhã. O jornalista destacou que acompanhar as transformações no campo da comunicação o preparou para lidar com os desafios atuais da moda, que exige mais do que estilo: pede autenticidade.
A palestra, que teve também a participação de Augusto Mariotti, editor do Portal FFW, trouxe à tona temas como a curadoria de moda e a importância da comunicação acessível e inclusiva. “A comunicação se transformou numa ferramenta extremamente importante e horizontal”, refletiu Caio. Para ele, as novas vozes que emergem do ambiente digital têm o poder de transformar o setor, desde que genuínas em suas mensagens. “Hoje, qualquer pessoa pode criar sua narrativa e contar sua história”, afirmou.
Ao falar sobre sua experiência como jornalista de moda, Caio foi categórico ao afirmar que a moda vai além das roupas: “É falar de cultura, das pessoas, do país, da nossa identidade.” Ele enfatizou o papel de cidades fora do eixo Rio-São Paulo, como Brasília, na construção de um cenário nacional mais equilibrado. Para ele, a capital do país é um ponto de convergência de culturas, o que a torna um lugar potente para a criação de tendências. “Estamos em Brasília, uma cidade potente, por onde passam discussões importantes no país.”
Outro ponto de destaque na fala de Caio foi a importância de resgatar e valorizar as culturas locais, algo que se intensificou durante a pandemia. Ele contou como seu retorno ao Nordeste foi essencial para se reconectar com suas raízes e repensar sua trajetória profissional. “Cuidar do mundo começa com cuidar da nossa aldeia, como Ailton Krenak diz”, comentou. Para ele, a moda e o digital têm a função de amplificar narrativas que, muitas vezes, ficam esquecidas nas grandes metrópoles.
A pluralidade cultural brasileira foi outro tema abordado pelo jornalista. Ao falar sobre as diversas expressões de moda no país, Caio pontuou que definir uma moda brasileira única é quase impossível. “Temos pessoas que trabalham no setor público com formalidade, enquanto em Salvador temos movimentos de resgate da cultura afro-brasileira”, exemplificou, reforçando que o Brasil é feito de contrastes e que isso se reflete na moda.
Em sua palestra, Caio também chamou a atenção para as mudanças climáticas e a necessidade de repensar o consumo de moda. “O calor está absurdo. Já estamos vendo os impactos disso”, alertou. Ele explicou que a indústria precisa se adaptar à nova realidade, em que o bem-estar e a sustentabilidade são valores fundamentais.
No encerramento de sua fala, Caio comentou sobre a liberdade proporcionada pela internet e o futuro da moda. “A internet é um lugar de liberdade”, afirmou, indicando que a digitalização do setor é irreversível. Ele também destacou o crescimento do “active wear”, moda esportiva que conquistou o dia a dia das pessoas.
Após sua palestra, Caio concedeu uma entrevista exclusiva ao GPS|Brasília, na qual abordou temas como diversidade, sustentabilidade e a relação entre moda e esporte. Confira a seguir:
GPS|Brasília: Qual é a importância de você, como um homem nordestino e LGBT, estar ocupando espaços na moda e na sociedade, enfrentando preconceitos e mostrando que somos todos humanos?
Caio Braz: Tenho muito orgulho de ser recifense, essa identidade molda minha visão de mundo. Ao migrar para o sudeste, me deparei com preconceitos antiquados, frutos de estereótipos midiáticos caricatos. Luto para criar novos imaginários sobre o Nordeste, ligados à nossa rica cultura. Em relação à questão LGBT, vejo que houve avanços significativos desde que comecei nas mídias. Hoje, ser LGBT nesse espaço é mais tolerado e diverso, embora ainda haja muito a ser feito, especialmente no apoio a pessoas trans e travestis, que têm menos oportunidades.
Como você vê a influência das mídias digitais, que agora permitem que pessoas de diversas regiões, como o Nordeste, alcancem visibilidade sem precisar migrar para os grandes centros?
A democratização do espaço digital permitiu que muitas vozes pudessem se conectar e se comunicar. Hoje, qualquer pessoa pode criar um público e representar outras. Acho que é um ganho para o Brasil conseguir empoderar pessoas em seus territórios, mostrando que a potência delas vem, em parte, do lugar de onde pertencem. No meu caso, por exemplo, estudo e analiso Recife constantemente, o que contribui para a minha própria verdade e autenticidade ao me comunicar.
Qual o papel da moda na redução dos impactos climáticos e como essa indústria pode contribuir mais para a sustentabilidade?
A moda é, sim, uma grande poluente, mas a questão do clima envolve outras indústrias igualmente impactantes, como a agropecuária e a indústria de óleo. A solução não é simples e passa por questões como consumo, capitalismo e globalização. Acho importante não responsabilizar apenas o consumidor final. Os grandes industriais precisam ser regulamentados, e isso requer ação do poder público e pressão popular. Apesar de nossas ações individuais importarem, o problema é muito mais profundo e sistêmico.
O que você acha da relação entre moda e esporte, especialmente com os times de futebol criando peças além dos uniformes de jogo, e o uso dessas roupas como moda casual?
Vejo que o esporte tem ganhado muita importância, tanto pela necessidade de cuidar da saúde mental e física quanto pelo que os atletas representam hoje. Eles se tornaram ícones de admiração, pois fazem coisas extraordinárias que muitas pessoas não conseguem. O futebol, em particular, desperta uma nostalgia afetiva. Buscar camisas antigas, como a do Romário em 94, por exemplo, conecta as pessoas a um passado em que o futuro parecia mais promissor. Essa memória afetiva, junto com o poder de ídolos do esporte, está moldando essa tendência na moda.
Ver essa foto no Instagram