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Nos EUA, Barroso defende que o STF volte a ser uma corte “menos proeminente”

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, disse que é preciso voltar a uma corte suprema “menos proeminente” o mais rápido possível, embora seja necessário prosseguir com os processos contra a tentativa de golpe e invasores da Praça dos Três Poderes “por um pouco mais de tempo”. Ele fez as afirmações neste sábado (6), em mesa de perguntas e respostas ao lado do cientista político norte-americano Steven Levitsky. Os dois participam do “Brazil Conference at Harvard & MIT“, evento organizado por pesquisadores brasileiros em Boston (EUA).

“Precisamos voltar a um STF que seja menos proeminente o mais rápido possível. Mas não podemos fingir que essas coisas (tentativa de golpe e invasão dos três poderes) não aconteceram”, disse. O presidente do STF avaliou o processo como recado para que outras pessoas não acreditem que podem repetir os ataques. “Infelizmente ainda precisamos seguir nesses processos por um pouco mais de tempo”, completou.

Em seguida, Barroso disse que, em uma sociedade que precisa de pacificação, os processos geram tensão e que seria desejável veredictos mais rápidos, que respeitassem o Estado de Direito. “Mas aí surgiram investigações mostrando que estávamos mais perto de um golpe de Estado do que imaginávamos”, continuou.

Nas palavras de Barroso, entre o fim de 2022 e o dia 8 de janeiro de 2023, o País e as instituições democráticas ficaram “por um triz”. “Chegamos muito perto do impensável no Brasil. Estávamos mais próximos ao colapso do que achávamos, constatamos agora”, disse o presidente do STF.

Promessas não cumpridas
Antes, em longo discurso sobre os riscos impostos ao Estado brasileiro sob o governo Jair Bolsonaro, Barroso fez uma espécie de mea-culpa da democracia. “O populismo autoritário avançou também devido ao fracasso da democracia, de promessas de igualdade e prosperidade não cumpridas. A democracia tem de estar consciente que ainda não chegou ao ponto de cumprir suas promessas para muitas pessoas. Se não houver democracia real esses populistas vão voltar”, disse.

Barroso fez uma longa lista de ataques às instituições brasileiras protagonizadas pelos apoiadores de Bolsonaro e seu grupo político enquanto o ex-presidente ocupou a presidência. As propostas de voto impresso e os questionamentos à urna eletrônica, que envolveu setores das forças armadas, eram o “germe” do movimento golpista

“Sempre tive o pressentimento que ali estava o germe do golpe. Imaginem o que essas pessoas, que tiveram a capacidade de invadir o Supremo, o Planalto e o Congresso, fariam nas seções eleitorais se tivessem contagem pública manual e imaginassem que perderiam”, disse.

Em citação ao comportamento das Forças Armadas nos últimos quatro anos, Barroso afirmou que “o Brasil é um país que as pessoas se ofendem com o que fazem”, o que seria traço psicanalítico da sociedade brasileira.

“Hoje em dia no Brasil as pessoas têm vergonha do que são. Fazem as coisas e depois dizem que não fizeram. Isso aconteceu no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), quando eu disse que, infelizmente, as Forças Armadas usariam a representação com suspeitas à urna eletrônica para tentar desacreditar o sistema. Então veio nota das Forças Armadas dizendo que nunca haviam sido tão ofendidas. Quarenta e oito horas depois, fizeram isso levantar suspeitas”, disse.

O ministro também sugeriu que o processo de esvaziamento democrático teve início nos primeiros dias de governo. “Isso começou com o esvaziamento da participação da sociedade civil em órgãos de formulação de políticas públicas, ligadas ao meio ambiente e crianças. Houve desmonte dos órgãos de proteção ambiental e de proteção de comunidades indígenas. Não houve demarcação de um milímetro sequer de terras indígenas como determina a Constituição”, disse Barroso no discurso que durou cerca de 40 minutos.

O ministro fazia referência à extinção de conselhos com assentos para representantes da sociedade civil e à designação de negacionistas para a direção ou cúpula de autarquias federais.  Em seguida, ele descreveu o que definiu como “negacionismo pleno à ciência” durante a pandemia de Covid-19 e chamou atenção para o fato de que o Brasil possui apenas 2,7% da população mundial, mas registrou 10,2% das mortes causadas pelos vírus.

“Esse foi o tamanho da má gestão da pandemia no Brasil”, disse, antes de seguir nas críticas ao governo Bolsonaro, que culminam na preparação de um golpe de Estado.

Processo social
Nas palavras do ministro, o Brasil assistiu a uma captura do pensamento conservador pela extrema-direita, processo comum a vários países do mundo, entre os quais citou os Estados Unidos, Rússia, Hungria e Turquia. “O populismo autoritário pode ser de direita ou de esquerda, temos experiência nos dois sentidos, embora nos últimos tempos o de direita tenha se revelado mais perigoso, racista, xenofóbico, misantrópico e antiambientalista”, afirmou.

Por fim, segundo o magistrado, o que mais o preocupa é a escalada de índices de violência no País. “Um problema na América Latina e no Brasil são as altas taxas de violência. A extrema-direita explora medo das pessoas e por isso vencem (eleições). Essa é a minha maior preocupação no Brasil”, disse.

Desinformação
O presidente do STF afirmou que as ameaças de desinformação e discurso de ódio vão se repetir esse ano nas eleições brasileiras e de todo o mundo. Barroso citou como perigo adicional o uso de tecnologias de “deepfake”, que conseguem falsificar voz e imagem para fabricar peças artificiais e espalhar conteúdos sem a autorização da pessoa envolvida.

“Um grande problema que o mundo enfrenta e vai enfrentar de novo onde houver eleições esse ano é o uso das plataformas digitais para desinformação, discurso de ódio e teorias conspiratórias. Isso agora vai acontecer sob o espectro do deepfake, que é capaz de colocar a mim ou outros dizendo coisas que nunca dissemos sem que seja possível identificar que aquilo é uma fraude”, dise. “A humanidade corre risco de perda da liberdade de expressão, porque somos ensinados a acreditar no que vemos e ouvimos. O dia em que não pudermos acreditar no que vemos e ouvimos, a liberdade de expressão será perdida”, continuou Luís Roberto Barroso.

 

Estadão Conteúdo

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