Por Rubens Anater
O ministro das Comunicação do governo Lula, Juscelino Filho (União Brasil-MA), indicou emendas para pagar obras feitas por uma empresa da qual a Polícia Federal diz que ele é o verdadeiro dono. As verbas foram indicadas quando ele era deputado federal e foram para o seu reduto eleitoral, no Maranhão.
O caso foi revelado pelo Estadão, que mostrou que ao menos 4 empresas comandadas por pessoas próximas do ministro ganharam R$ 36 milhões em contratos com a prefeitura de Vitorino Freire (MA), governada pela irmã de Juscelino, Luanna Rezende (União Brasil). Entre elas está a Arco Construções e Incorporações, que fez R$ 16 milhões em contratos com a prefeitura entre 2017 e 2022. Segundo a Polícia Federal, a empresa pertence “faticamente” a Juscelino, ainda que, no papel, seja de Antonio Tito Salem Soares, apontado pela organização como “testa de ferro” do ministro.
Ao Estadão, a assessoria de Juscelino negou que ele tenha qualquer relação com a empresa. Tito afirmou conhecer o ministro, mas negou ser “laranja” dele na companhia.
A assinatura de Juscelino aparece em um dos contratos firmados com a empresa da qual, segundo a PF, o ministro seria sócio oculto e verdadeiro dono. A emenda no valor de R$ 2,56 milhões foi indicada pelo então deputado em 2017, para reparos em estradas de terra na cidade governada pela irmã, como mostrou o jornal Folha de São Paulo. Ao jornal, a defesa do ministro disse que a ilação é absurda e negou que ele tenha obtido proveito pessoal com verba pública.
Ao Estadão, Antonio Tito admitiu ter certa intimidade com Juscelino Filho e afirmou que já frequentou a casa do ministro. Seus irmãos chegaram a fazer campanha por ele e estiveram entre os primeiros a serem recebidos no seu gabinete, depois de assumir o ministério das Comunicações, ainda em janeiro. Já Candida Santana, esposa de Tito e uma das fundadoras da companhia, foi assessora de Juscelino enquanto ele era deputado
Tito, no entanto, nega ser laranja de Juscelino. “As alegações que fazem é de que sou um laranja de uma pessoa que só conheço socialmente, mas nunca tive nenhum acordo, nenhuma negociata. Sou dono da minha própria empresa, que foi aberta desde antes de conhecê-lo, inclusive”, afirmou. A Arco Construções foi aberta em setembro de 2015, assim que Juscelino assumiu seu primeiro mandato como deputado federal do Maranhão.
Outra ligação de Juscelino com a empresa está em Anne Jakelyne Silva Magalhães. Ela foi sua assessora durante seu tempo como deputado, mas deixou o cargo comissionado na Câmara para ser uma das sócias da Arco Construções.
Ainda na ocasião da revelação do Estadão, a assessoria do ministro afirmou que “não teve e não tem qualquer relação societária, direta ou indireta, com essa empresa”. Segundo nota, por não ter vinculação com a firma investigada, Juscelino “não pode ser responsável pelos seus contratos.”
No dia 1º de setembro, Tito e a irmã de Juscelino, Luanna Rezende, foram alvos no âmbito da terceira fase da Operação Benesse. A apuração da PF foi baseada em uma série de reportagens do Estadão, que revelou o mau uso de dinheiro público por Juscelino.
Empresas de pessoas próximas de Juscelino Filho ganharam mais de R$ 36 milhões
Ao menos quatro empresas de amigos, ex-assessoras e uma cunhada do ministro Juscelino Filho ganharam mais de R$ 36 milhões apenas em contratos com a prefeitura de Vitorino Freire. O Estadão apurou que o município governado pela irmã de Juscelino contratou as firmas com verbas do orçamento secreto e de emendas parlamentares destinadas pelo próprio ministro.
Todas essas empresas intensificaram seus negócios a partir de 2015, quando Juscelino assumiu pela primeira vez uma cadeira de deputado – três foram abertas no início do mandato.
Além da Arco Construções, há a Mubarak, que acumulou R$ 4,8 milhões em contratos. Diogo Tito, irmão de Antonio Tito, é sócio oculto da empresa. Na segunda semana como ministro, Juscelino recebeu o empresário no gabinete sem registrar na agenda oficial
A Maranhão Asfaltos, que tem como sócia-administradora Aline Cavalcanti Fialho Vale, irmã da mulher de Juscelino, Lia Cavalcanti, ganhou três contratos de R$ 1,3 milhão, entre 2017 e 2018, para o fornecimento de concreto para estradas.
Outra obra executada por empresário ligado ao ministro é o asfaltamento de uma estrada de 19 quilômetros que beneficia oito fazendas da família de Juscelino em Vitorino Freire, como revelou o Estadão. O contrato de R$ 5 milhões foi firmado com a Construservice, de Eduardo José Barros Costa, conhecido como Eduardo Imperador, “conhecido” do ministro há 20 anos. No total, a firma ganhou R$ 14,1 milhões.
Benefícios do Orçamento Secreto à própria fazenda
O contrato fechado com a Construservice também foi revelado pelo Estadão. Juscelino Filho destinou R$ 50 milhões em emendas sigilosas do Orçamento Secreto enquanto era deputado. Desse valor, R$ 5 milhões foram usados para asfaltar uma estrada de terra que passa em frente à sua fazenda em Vitorino Freire, cidade governada pela irmã. O valor foi para a Construservice.
Cinco meses após a assinatura do contrato, em julho de 2022, o empresário Eduardo Imperador foi preso pela Polícia Federal, acusado de pagar propina a servidores federais para obter obras na cidade e de ser sócio oculto da Construservice. O engenheiro da Codevasf, estatal controlada pelo União Brasil, partido do ministro, foi afastado sob suspeita de receber R$ 250 mil em propina de Imperador. Juscelino admite que ele e o empresário beneficiado com recursos de sua emenda secreta são “conhecidos há mais de 20 anos”.
A emenda que beneficiou a estrada de acesso à fazenda de Juscelino também bancou outras obras no município. No entanto, auditoria da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) realizada em março, ao qual o Estadão teve acesso, constatou asfalto mal feito, ruas esburacadas, rachaduras e falta de sinalização nas ruas que deveriam ser pavimentadas.
A mesma auditoria que encontrou obras mal feitas nas ruas da cidade não identificou problemas na construção da estrada que leva até as fazendas da família do ministro.
Juscelino Filho era deputado federal e aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro quando indicou a emenda secreta para Vitorino Freire, em 2020. Três anos depois, ele virou ministro das Comunicações do governo Lula e comanda uma pasta com orçamento de R$ 2 bilhões.
O presidente Lula decidiu manter Juscelino no cargo por conta de pressão do Centrão contra a demissão do ministro, apesar das revelações feitas pelo Estadão sobre a emenda para a estrada e o uso de avião da Força Área Brasileira (FAB) para assistir a um leilão de cavalos, entre outras.