Pouco conhecido pelo grande público, o lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune crônica, inflamatória e multissistêmica, que afeta principalmente mulheres em idade produtiva. Estima-se que entre 150 mil e 300 mil brasileiros convivam com a enfermidade, segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia, mas a falta de um mapeamento nacional dificulta uma compreensão mais precisa da sua incidência.
O impacto vai muito além do físico, afetando o emocional, o social e a vida profissional de quem vive com o diagnóstico. No LES, o sistema imunológico ataca tecidos saudáveis do próprio corpo, provocando inflamações que podem comprometer articulações, rins, pele, pulmões, coração e cérebro. Os sintomas variam de pessoa para pessoa e incluem fadiga extrema, febre, queda de cabelo, dores articulares, lesões na pele e até comprometimentos renais e neurológicos.
A diversidade de sintomas, somada à ausência de um exame específico, torna o diagnóstico complexo e, muitas vezes, tardio. “Muitos pacientes levam anos até obter um diagnóstico correto, o que pode levar a complicações graves. O acesso à informação e a profissionais especializados é essencial para um tratamento adequado”, alerta Carla Simas, advogada especialista em direito da saúde e portadora da doença.
A maior incidência entre mulheres jovens é atribuída, em parte, a fatores hormonais, especialmente ao estrogênio, que pode influenciar a resposta imunológica. “Os sintomas do lúpus variam muito de pessoa para pessoa, mas costumam impactar profundamente o cotidiano dos pacientes, principalmente nos períodos em que a doença está mais ativa”, explica o Dr. Odirlei André Monticielo, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e coordenador da Comissão de Lúpus da Sociedade Brasileira de Reumatologia.
O tratamento do lúpus inclui antimaláricos, corticoides e imunossupressores, mas parte dos pacientes permanece com sintomas persistentes. Com isso, cresce o debate sobre o acesso a medicamentos mais modernos. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) abriu a Consulta Pública nº 158 para avaliar a inclusão de novas terapias no rol de coberturas obrigatórias dos planos de saúde. “A Consulta Pública é uma rara oportunidade para que todos possam contribuir com o processo de decisão. Relatar as dificuldades vividas, as limitações dos tratamentos atuais e a relevância de novas alternativas pode fazer a diferença”, revela Monticielo.
Além do tratamento farmacológico, especialistas recomendam uma abordagem integrativa. Alimentação anti-inflamatória, prática de atividades físicas leves e técnicas de redução do estresse, como yoga e meditação, são aliados importantes no controle da doença. A proteção solar é indispensável, já que a exposição aos raios UV pode agravar os sintomas. O sono reparador também é essencial para evitar inflamações sistêmicas e piora no quadro clínico.
As limitações impostas pelo lúpus também têm impacto na vida profissional. Um estudo nacional revelou que 33,3% das pessoas com a doença precisaram se aposentar precocemente. Para responder a essas demandas, legislações têm avançado: o Projeto de Lei 1456/23, aprovado pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, equipara pacientes com lúpus a pessoas com deficiência (PcD), garantindo acesso a benefícios sociais e concursos públicos. No entanto, Carla Simas adverte que “o lúpus continua sendo uma doença invisível para muitos, o que dificulta a obtenção de direitos e agrava a exclusão social dos pacientes”.
Entre os direitos já previstos estão o Benefício de Prestação Continuada (BPC), acesso garantido a atendimento pelo SUS, suporte psicológico e a emissão de cartão para uso de vagas especiais. Mesmo com tantos desafios, os avanços no tratamento e nas políticas públicas trazem novas esperanças para quem convive com a doença e chamam atenção para a urgência de tornar o lúpus visível na agenda da saúde pública brasileira.