Em Pecadores, o diretor e roteirista Ryan Coogler (Creed e Pantera Negra) faz uma viagem pelos estilos de terror, vampiros, ação, drama e musical com exuberância e tensão, numa narrativa que valoriza a ancestralidade do povo africano, sua história e suas crenças, mostrando como elas resistem através do tempo.
Logo que abandonam a profissão de capangas de Al Capone, em Chicago, os gêmeos Elias e Elijah Smoke (numa atuação visceral de Michael B. Jordan, que interpreta os dois irmãos) retornam à sua terra natal, no Delta do Mississipi, berço do blues. Eles compram e transformam um velho armazém – antigo lugar de linchamentos e comércio de escravos – em um “Juke”, como eram chamados os locais de periferias de cidades, onde a comunidade negra se reunia para beber, dançar e se divertir.
Na noite de estreia desse “Juke”, num plano sequência eletrizante, o blues tocado no palco aos poucos vai contagiando a comunidade negra que lota o lugar, até o momento em que todos embarcam num intenso frenesi, numa viagem psicodélica que atravessa os séculos. As pessoas perdem o controle, e o transe coletivo acaba por invocar as divindades.
Desfilam, repentinamente, pelo ambiente enfumaçado do Juke, vultos de espíritos imaginárias, tótens de seitas africanas, figuras de religiões orientais, ídolos negros do pop, e antigos bluesmen, numa cena exuberante do filme. O blues, tocado em alto decibéis no Juke, chega até os ouvidos de uma comunidade de vampiros irlandeses, que rondam a vizinhança da casa noturna.
A partir daí, Pecadores passa a trabalhar o terror como metáfora. O diretor utiliza-se de simbologia contundente para denunciar o comportamento maligno do homem branco, que suga e aproveita-se da força física e do universo cultural do negro.
A denúncia é impactante, e chega inclusive a acusar a própria comunidade negra, que muitas vezes, por interesse ou circunstâncias, joga-se contra os irmãos de cor. Pecadores estreia como o melhor filme de 2025 até o momento, e é fundamental assisti-lo, em toda sua grandiloquência, numa tela gigante de uma sala de cinema.
*Lula Mattos é arquiteta, mas sua paixão sempre foi o cinema. Possui formação em Crítica de Cinema e também fez cursos na área com Alberto Renault e Humberto Silva. É admiradora do chamado “cinema de autor”, mas faz sugestões e produz conteúdo que abrange todos os gêneros, sempre inserindo um olhar pessoal em suas críticas e resenhas.