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Uma poeta visual: conheça a fotógrafa Josiane Dias

“O nosso olhar nunca é passivo e o significado é construído em camadas, de acordo com a experiência de cada um”, afirma Josiane Dias, uma fotógrafa curitibana, radicada em Brasília, e que dentro de sua poética, consegue transcender o contexto de suas imagens ao universo mental de seu público.

Josiane é embaixatriz e suas experiências, pela posição, trouxeram a oportunidade de já ter tido contato com boa parte do mundo de norte a sul, do leste ao oeste. Ao longo de seu tempo, no entanto, mais do que estar nos lugares, a fotógrafa viveu.

Em Nova York, por exemplo, especializou-se por três anos em sua paixão, a fotografia, na International Center of Photography. Antes, porém, já havia feito Desenho Industrial, Letras em Inglês e um mestrado e outro doutorado em Linguística.

Interessada pelo mundo e suas complexidades, sem dúvidas, a visão é o seu sentido mais apurado em todas as áreas de competências das quais tem formação. E são muitos os conhecimentos, mas com todo o sentido e razão, afinal para desconstruir, é necessário construir e conhecer. 

A arte de fotógrafa foi descoberta aos poucos. Antes não se via como esse tipo de criativa. Trabalhou, experimentou e viveu suas formações, principalmente a fotografia. Um dia percebeu que a vida estava a preparando e construindo toda a narrativa de uma fotógrafa da poesia visual.

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Série Em Transe

“Fiz tudo o que você possa imaginar: fotografia com estúdio, fotografia still life, documentário, luz, tudo, tudo mesmo. Vários cursos de fotografia nesses três anos e, paralelamente, ainda estudei na Belas Artes de Nova York e entrei em contato com pintura, desenho e História da Arte. Então, acho que tudo isso foi me ajudando na minha visão, meu desenvolvimento como artista, da minha poética”, conta.

O clique de sua jornada partiu de um convite. Em 2012, foi convidada a participar da primeira exposição, uma mostra de artistas brasileiros que teriam suas obras expostas na sede da Organização das Nações Unidas, em Nova York.

A curadora gostou do trabalho de Josiane. Ali, percebeu a linguagem, a visão de mundo da autora. Foram escolhidas quatro fotos e a partir dessas, não parou mais. “Quando eu vi, eu já estava realmente fazendo várias exposições”, relembra.

Hoje, ela tira de contexto, mas sem anacronismos. A estratégia é uma forma de mostrar que o mundo vai muito além do que conseguimos enxergar e que novas perspectivas são sempre possíveis àquele que se propõe a isso. 

“Quando você tira aquele objeto do contexto, você dá uma nova luz a ele. Você olha de outro jeito, de outros ângulos. Você olha com um olhar sem preconceitos, você olha com o olhar livre, você olha com um olhar até, digamos assim, fresco, porque você deixa todas as suas ideias preconcebidas sobre aquilo, então você vai ficando um pouco surpreso — ou um pouco desnorteado. Eu acho que é a partir daí que se tem uma nova relação com aquilo, com o mundo”, destaca. 

E é essa a poética da fotógrafa. A artista percebe o mundo sob novas abordagens e se mostra muito à vontade com a novidade, com o ar puro do desconhecido.

Mas nem sempre foi assim. Ao chegar em Brasília, por exemplo, a fotografa estranhou a cidade das ruas largas, prédios parecidos e espaços setorizados. A cidade muito ensinou a artista sobre sair da zona de conforto e buscar um novo olhar sobre o presente.

“No começo eu não gostava, confesso, porque Curitiba faz muito frio, chove muito. Eu cheguei aqui no período da seca e foi muito difícil”, inicia.

“Mas é uma cidade que eu aprendi a gostar. É uma cidade que você tem que abrir os olhos para a beleza e para a diferença. Ela é única, você não vai encontrar outra cidade igual. Todas as cidades são iguais de certa forma, né? Tem lá a matriz, a igreja, a praça… Brasília é completamente diferente e te proporciona outra experiência com essa arquitetura modernista, com esses espaços vazios, com esses pilotis que eu adoro, com as cigarras que eu amo, a sensação do espaço, da liberdade”, ressignifica.

Na prática

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Série Tel Aviv Bus Station

Brasília desafiou Josiane e foi, talvez, um dos passos essenciais para tornar-se a artista que é. Sua mais recente exposição está no Centro Cultural da Câmara dos Deputados. Por lá montou a mostra ‘Telaviv Bus Station‘, fotos completamente descontextualizadas de um conhecido elefante branco de Israel, a Rodoviária Central de Telaviv.

Com certeza, por ser considerada fora de um padrão estético receptivo, que o olhar da artista foi em busca de elementos para se admirar. O resultado, de fato, é surpreendente. A fotógrafa encontrou beleza em janelas, corrimãos, exaustores e até mesmo em simples canos que, por conta de suas cores, tinham um potencial escondido de conversar com o público. 

“Para mim é muito importante esse exercício de descontextualizar, sejam as roupas, sejam os detalhes. No caso da arquitetura, sejam as flores, sejam as pessoas. Eu gosto de fazer isso. Por quê? Porque pensa: quando você gosta, às vezes em uma pessoa, às vezes em você, gosta dos olhos, de uma pinta, da boca, do sorriso, de algum detalhe das mãos, certo? Então, quando você pega um detalhe e dá uma nova visão para ele, você tem uma nova experiência com aquilo”, argumenta a fotografa.

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Série Tel Aviv Bus Station

E como a arte é importante para a vida humana, não é mesmo? De obras descontextualizadas, vem a percepção do olhar novo, da revisão daquilo que já se conhece, mas pode ser realocado, reorganizado.   

“Isso vai fundo em tudo na sua vida. A gente, sem querer, repete padrões, sabe? A gente entra por caminhos, às vezes, conhecidos, sem explorar novos caminhos. Isso por pura comodidade. Então, quando você faz um trabalho de fotografia que é diferente, você dá um novo olhar a algo já conhecido, torna essa coisa nova, toda essa experiência nova”, reflete.

“É um revelador de sensações e eu acho isso super importante para a cena e para o trabalho artístico… ter essa capacidade de fazer você ir para outro lugar, de fazer você flutuar por um momento ou entrar por uma janela e explorar coisas novas”, diz. 

“Eu acho muito importante que o trabalho artístico tenha essa capacidade de te levar para outro lugar, porque a arte é fundamental, seja ela música, seja ela o teatro, a arquitetura também. E lugares que te provocam, lugares que te deslocam, lugares que te mostram novos caminhos, para mim, são fundamentais. É uma das coisas mais importantes do trabalho artístico, essa desconstrução para você reconstruir”, completa a fotógrafa.

A arte na memória

De tanta criatividade, a essência precisava vir de algum lugar. Normalmente chega pelas memórias, da afetividade, do olhar que já é parcial por conta do amor envolvido. Barroco Laundry, por exemplo, é um dos trabalhos de Josiane que vem da experiência da fotógrafa, na qual viveu com as avós. Apesar de hoje não ser comum se ver roupas estendidas em varais à céu aberto, ainda que em casas, essa é uma estética ainda muito presente na Itália e na infância da artista. 

“Cada série tem a sua narrativa, sua história. Por exemplo, a série do Barroco Laundry, que são as roupas que eu fiz na Sicília, na Sardenha, lembro de cada minuto que eu passei olhando as roupas se movimentando. Isso teve uma história para mim, uma história com a minha avó”, conta.

“Algumas vezes fui passar nas férias na casa das minhas avós e uma delas, me ensinou a torcer a roupa enquanto ela as pendurava no varal. As duas avós tinham casa, penduravam a roupa no varal. Era um ritual gostoso, aquele cheirinho de roupa molhada, o cheirinho do sol nas roupas, né? Então, digamos, quando eu fiz essa série dessas roupas todas penduradas na Sicília, na Sardenha, tem muito da minha avó ali, muito da minha infância”, finaliza.

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série Barroco Laundry

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série Barroco Laundry

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série Barroco Laundry

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