João Vicente: Pequenas histórias da época da construção de Brasília – Parte 2

Foto: Reprodução/Flickr/ Juliano F1

Toda cidade guarda histórias curiosas e divertidas. O mesmo pode se dizer de alguns personagens importantes em sua época e pouco lembrados atualmente. Com Brasília, apesar de cidade ainda jovem, não poderia ser diferente. Entre fábulas, invenções e mitos, também existem muitas histórias reais.

Decidi reunir aqui alguns rápidos relatos divertidos que escutei ou ouvi ao longo do tempo.

Vasco Viana de Andrade foi o engenheiro-chefe da Divisão de Viação e Obras e era conhecido como “Mineirão”, enquanto Atahualpa Prego liderava a Divisão de Construções e Pavimentação da Novacap. Juntos, esses dois estabeleceram recordes mundiais impressionantes em pavimentação, terraplanagem, instalação de meio-fios e calçadas, movimentando milhões de metros quadrados em prazos recordes.

O “Mineirão” tem uma história hilária que ilustra bem o espírito da época da construção da cidade. O presidente Juscelino adorava receber presidentes, ministros e embaixadores estrangeiros para mostrar as obras e divulgar Brasília internacionalmente. Cada visita costumava incluir o lançamento da Pedra Fundamental da embaixada do país do visitante.

Em uma dessas festividades, JK chamou o Sr. Vasco, visivelmente insatisfeito com o que via: “Mineirão, não entendo. Em todas as festas de lançamento, você sempre nos traz ao mesmo terreno de uma mesma embaixada!”

Vasco respondeu: “Presidente, a verdade é que nenhum país está construindo sua embaixada agora, e nós, da Novacap, não temos tempo nem pessoal suficiente para abrir clareiras no cerradão a cada visita. Por isso, peço desculpas, mas realizamos sempre aqui, no terreno da Embaixada da Itália. É o mais próximo do asfalto, das superquadras, e já temos um canteiro de pedra fundamental que é uma belezura. Quando realmente decidirem construir, ninguém vai se lembrar do local exato que visitaram.” JK riu, não concordou totalmente, mas aceitou a explicação.

Além de sua carreira na engenharia, o Sr. Vasco era muito ligado ao futebol candango. Ele dá nome ao estádio da Metropolitana, no Núcleo Bandeirante, e tem outra história curiosa: em 1961, em Gama, foi criado um clube de futebol em sua homenagem, que recebeu o nome de “Vasco DO Gama”.

Não temos ideia do que foram as vésperas da inauguração de Brasília. Imagine a loucura que foi lançar uma cidade inteiramente nova. uma história da inauguração do STF ilustra bem essa confusão.

No dia da inauguração, o presidente do STF era o Min. Barros Barreto, um ferrenho opositor da mudança da sede para Brasília. No entanto, conformado, ele fazia as últimas inspeções antes do evento. Faltavam poucas horas para a chegada dos convidados, e o caos reinava. Muitas tarefas ainda estavam pendentes, e foi nesse tumulto que Barros Barreto avistou Walter Galante, responsável pela preparação do edifício, ajudando a instalar tapetes com uma expressão de desespero. O tapete de uma das salas mais importantes havia chegado com medidas erradas, muito menores do que o necessário, o que impossibilitava cobrir toda a sala.

Já irritado e apavorado, o presidente gritou para Walter: “Seu irresponsável! Resolva essa situação imediatamente! Faça o que for necessário!” Como conseguir mais tapete a essa altura era inviável, Walter respondeu: “Presidente, arrume um móvel grande que eu coloco naquele canto, e vai dar certo.”

Os dois saíram pelo edifício à procura de um armário adequado e, felizmente, conseguiram encontrar um perfeito para aquele local. Conta-se que esse móvel permanece lá até hoje, ou pelo menos até a última reforma, após a destruição ocorrida em janeiro de 2023.

Conta-se que, em 1957, o presidente de Portugal veio visitar as obras de Brasília a convite de Juscelino Kubitschek e se hospedou no Catetinho, acompanhado de sua esposa, além de Juscelino e Dona Sarah.

Já à noite, o presidente português bateu à porta do quarto de JK com um pedido inusitado: “Oh, Juscelino, poderias providenciar um penico? Sabes como é… são os costumes!”

A situação deixou JK em apuros. Onde ele conseguiria um penico àquela hora? Sem hesitar, chamou um de seus assessores e pediu que resolvesse a questão urgentemente — era uma questão de segurança!

O pobre assessor percorreu toda a Cidade Livre, mas nenhum comércio mais estava aberto. Alguém sugeriu que ele tentasse na casa das garotas da noite. Sem alternativas, ele foi até um prostíbulo e pediu à proprietária que vendesse um penico. Ela, claro, respondeu que isso seria impossível, pois o utensílio era de uso das meninas.

Determinado, o assessor se apresentou e explicou que se tratava de um pedido urgente de JK para o Catetinho. A proprietária, tocada pela situação, pediu que providenciassem a peça mais bonita, que fosse lavada e entregada ao homem, com um recado especial: “Diga a JK que este penico é um presente de todas as moças da Zona, em agradecimento por ter atraído tantos bons clientes para a região, que finalmente estão faturando bem, mais de cinco vezes do que era antes!”

Ao receber o penico e o recado, JK não conseguiu conter a gargalhada e, aliviado, entregou o presente ao presidente português.

 

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