Com 444 votos, o deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) foi eleito presidente da Câmara. Ele vai suceder Arthur Lira (PP-AL), seu maior apoiador. Os deputados Marcel van Hattem (Novo-RS) e Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) somaram 31 e 22 votos, respectivamente. Houve dois votos em branco.
Motta, de 35 anos, terá um mandato até 2027 e poderá disputar reeleição. Ele não bateu o recorde da reeleição de Arthur Lira em 2023, quando teve 464 votos, mas ficou com a segunda maior marca. O número de votantes se deve a um acordo de apoio a Motta que contou com 17 partidos, do PT ao PL.
Nascido em João Pessoa (PB), o novo presidente da Câmara é médico e vem de uma família de políticos. Seu pai, Nabor Wanderley (Republicanos), foi reeleito prefeito do município de Patos (PB), reduto eleitoral de Motta, em 2024. O avô paterno do parlamentar também foi prefeito da cidade, e o avô materno, deputado estadual.
Motta está no quarto mandato de deputado federal. Ele iniciou sua trajetória na Câmara aos 21 anos, pelo MDB (à época, o nome do partido ainda era PMDB). Agora está no Republicanos, legenda presidida pelo deputado Marcos Pereira (SP), bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, e também a legenda do governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Em sua trajetória, Motta executou papéis importantes. Foi presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou a Petrobras, em 2015. Também foi o relator do projeto conhecido como “Orçamento de Guerra” – mecanismo criado para suportar os gastos relacionados à pandemia de covid-19 – em 2020 e da PEC que autorizou o governo de Jair Bolsonaro a limitar os pagamentos de precatórios, em 2021. Sua ascensão nos primeiros anos de Câmara se deu em parte à proximidade com Eduardo Cunha, que presidiu a Casa de 2015 a 2016. Cunha foi cassado e chegou a ser preso pouco tempo depois.
A candidatura de Hugo Motta à presidência da Câmara foi lançada por Lira em outubro do ano passado. O anúncio contrariou expectativas de que o candidato da continuidade seria o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA). Com a movimentação dos partidos em torno de Motta, Elmar desistiu da candidatura, assim como o líder do PSD, Antonio Brito (BA).
A manobra de Lira foi precedida por movimentos de Marcos Pereira. O presidente do Republicanos queria ele mesmo concorrer ao comando da Câmara, mas viu sua candidatura inviabilizada. Decidiu apoiar Hugo Motta e buscou a bênção do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. O petista consentiu, o nome de Motta ganhou força e o apoio de Lira praticamente sacramentou a eleição ainda em outubro de 2024.
Durante a sua campanha, Motta prometeu prezar pelo diálogo e defendeu o “fortalecimento do Poder Legislativo”. Dentre as pautas mais polêmicas que dependem de sua decisão, está o projeto que concede anistia aos condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023, parado em uma comissão especial. Motta não disse ser favorável à proposta, já que o PT é contrário, mas já falou que vê “condenações acima do que seria justo”.
O agora presidente da Câmara também deve dar rumo à proposta do governo sobre a regulação das redes sociais e sobre as novas etapas de regulamentação da reforma tributária. Para deputados e consultores, Motta entra no cargo sob a condição de cumprir acordos já definidos por Lira, sobretudo em relação ao orçamento deste ano, que ainda depende de aprovação no Congresso Nacional
Segundo essas avaliações, num primeiro momento, Motta terá menos poderes que Lira. Porém, à medida que avancem as negociações sobre o Orçamento do ano que vem, o deputado do Republicanos ganhará mais protagonismo. Deputados governistas dizem ver em Motta maior estabilidade na relação entre a Câmara e o Palácio do Planalto.
Discurso conciliador
Em sua primeira fala à frente do cargo, Hugo Motta disse que estar ao lado da estabilidade econômica é defender a estabilidade social, e mencionou a responsabilidade fiscal. O deputado também defendeu as emendas parlamentares, mecanismo de distribuição de recursos por congressistas que está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal.
Não se pode mais discutir o óbvio. Nada pior para os mais pobres que a inflação, a falta de estabilidade na economia. Não há democracia com caos social, não há estabilidade social com caos econômicos. Defenderemos a democracia porque defenderemos também as melhores práticas das melhores políticas econômicas”, disse.
Motta também criticou a polarização política. “O povo brasileiro não quer a divisão da ideologia, mas a multiplicação no seu dia a dia”, disse o novo presidente da Casa, ao afirmar que as convergências constroem.
O presidente da Câmara fez várias referências a Ulysses Guimarães, dizendo que a memória do político deve “iluminar corações e mentes”. Disse “viva a democracia” e que tem “ódio e nojo” a ditaduras. O deputado disse que não existe Parlamento forte em ditaduras. “Ulysses afirmava que o presidencialismo absoluto deixava de existir com a nova Constituição”, declarou.
Motta encerrou sua fala com uma referência ao filme Ainda Estou Aqui, que exalta Eunice Paiva e critica a ditadura militar. “Ainda estamos aqui”, disse, em um aceno a políticos de esquerda. Segundo ele, todos precisam estar ao lado do Brasil, em harmonia com os Poderes da República.