Um estudo divulgado nesta sexta-feira (30) contesta os critérios utilizados pela Prefeitura de São Paulo para intervir na gestão de 28 escolas da rede municipal de ensino. Segundo o levantamento, assinado pelas pesquisadoras Mariana Martins e Juliana Meato, do Instituto Cultiva, os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) 2023 foram manipulados para embasar o afastamento de diretores e outras medidas administrativas promovidas pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e do secretário municipal de Educação, Fernando Padula. A gestão municipal nega (veja abaixo).
De acordo com o relatório, publicado sob o título provocativo “É Mentira! Nunes e Padula Distorcem Dados do IDEB para Justificar Intervenções em Escolas”, a análise oficial ignora aspectos fundamentais da realidade escolar e se sustenta em argumentos frágeis e inconsistentes. Um dos pontos mais alarmantes revelados pela pesquisa é que 13 das 28 escolas apontadas para intervenção nem sequer participaram da última edição do IDEB, o que põe em xeque a legitimidade do critério adotado.
Além disso, o estudo mostra que apenas nove das escolas listadas estão entre as 50 com as piores notas no município. A unidade escolar com o pior desempenho de toda a cidade, por sua vez, não aparece entre as instituições incluídas pela prefeitura na intervenção, o que levanta suspeitas sobre a seleção dos alvos da medida.
As pesquisadoras destacam que nenhuma das 28 escolas em questão teve nota inferior a quatro no IDEB. Em contraste com a narrativa oficial de crise no desempenho, três delas apresentaram crescimento nos indicadores — sendo que uma escola registrou avanço de um ponto inteiro. Outras quatro mantiveram a média, e as reduções observadas em parte do grupo foram consideradas leves.
Martins e Meato fazem duras críticas à decisão da Secretaria de Educação de considerar apenas um índice quantitativo para implementar ações tão drásticas. Elas ressaltam que o IDEB mede apenas desempenho em provas padronizadas e taxas de aprovação, deixando de fora variáveis essenciais como infraestrutura escolar, condições sociais dos alunos, evasão escolar e desafios específicos enfrentados pelas comunidades locais.
“Reduzir a avaliação de uma escola a um único número ignora a complexidade do trabalho pedagógico e pode justificar punições injustas”, afirmam as autoras do estudo. Elas defendem uma abordagem mais ampla e participativa, que envolva a comunidade escolar e considere aspectos estruturais antes de impor qualquer tipo de intervenção.
O conteúdo completo da análise será apresentado nesta sexta-feira (30), às 18h, na abertura do seminário “A Sociedade Civil Orienta o Novo Plano Nacional de Educação (PNE) 2025-2035”, organizado em conjunto pelo Instituto Cultiva e pelo Sindicato dos Especialistas de Educação do Magistério Municipal de São Paulo (SINESP). O evento ocorre na Casa de Portugal, no bairro da Liberdade, em São Paulo.
Entre os participantes confirmados estão o jornalista e escritor Antonio Gois, a pedagoga e ex-diretora do MEC Jaqueline Moll, a presidente do SINESP Norma Lúcia Andrade dos Santos e o sociólogo Rudá Ricci, presidente do Instituto Cultiva. Haverá também um ato de desagravo com a presença de diretores afetados pelas medidas da prefeitura.
No sábado (31), o seminário será encerrado com a apresentação da “Carta de São Paulo”, um documento com propostas extraídas das discussões realizadas. A carta será encaminhada ao Ministério Público de São Paulo, a parlamentares do estado e à Comissão Especial do novo PNE na Câmara dos Deputados, presidida pela deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) e relatada por Moses Rodrigues (UB-CE).
Prefeitura reforça critérios técnicos
Procurada, a Secretaria Municipal de Educação afirmou, por meio de nota, que as 25 unidades escolares inicialmente listadas foram selecionadas com base em critérios técnicos e transparentes. A SME alegou que, quando não houve divulgação do IDEB 2023 por baixa participação dos alunos, foi utilizado o IDEP 2023 como alternativa. Outro fator considerado foi o tempo mínimo de quatro anos de atuação dos diretores à frente das unidades.
A pasta reforça que todas as escolas envolvidas não atingiram as metas projetadas nas duas últimas edições do IDEB, considerando o ciclo de anos iniciais e finais do Ensino Fundamental.
Segundo a secretaria, a meta de 2023 foi baseada nos parâmetros de 2021, em razão dos impactos da pandemia da Covid-19.
Veja a nota na íntegra:
“A Secretaria Municipal de Educação (SME) reafirma que a seleção das 25 unidades escolares prioritárias seguiu critérios técnicos e transparentes, que levaram em consideração preferencialmente os indicadores do Ideb 2023. No caso das escolas que não tiveram esse índice divulgado, devido à participação inferior a 80% dos estudantes nas provas aplicadas, foi utilizado o Idep 2023.
Outro critério para a definição das unidades foi o tempo de atuação de, pelo menos, quatro anos dos diretores no cargo. Importante destacar que o processo se baseou nos resultados dos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental obtidos por cada escola. Das 25 unidades educacionais selecionadas, 16 foram escolhidas com base nos índices dos anos iniciais, sendo 11 pelo Ideb e 5 pelo Idep 2023; 9 escolas foram selecionadas com base nos índices dos anos finais, sendo 1 pelo Ideb e 8 pelo Idep 2023.
Ressalta-se, ainda, que todas as 25 escolas não atingiram as metas estabelecidas pelo Ideb nas duas últimas edições. Em 2023, foi considerada a meta projetada para 2021, conforme decisão do MEC/INEP, em razão dos impactos provocados pela pandemia.
Na lista abaixo, entre parênteses, seguem os critérios para a seleção das escolas:
-CEU EMEF Professor Antonio Carlos Rocha (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Professor Aroldo de Azevedo (não teve Ideb AF 2023 divulgado; sem alcance da meta projetada, Idep abaixo de 3.3)
-EMEF Almirante Ary Parreiras (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Deputado Caio Sérgio Pompeu de Toledo (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep Até 3.3)
-CEU EMEF Campos Salles (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Cecília Moraes de Vasconcelos (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
-EMEF Professora Daisy Amadio Fujiwara (Não teve o IDEB AF divulgado em duas edições e com IDEP até 3,3)
-EMEF Dilermando Dias dos Santos (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Professora Eda Terezinha Chica Medeiros (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Espaço de Bitita (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Professor Flávio Augusto Rosa (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep até 3.3)
-EMEF Geraldo Sesso Junior (não teve o Ideb AI divulgado; teve Idep abaixo 3,7)
-EMEF Ibrahim Nobre (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
-EMEF João XXIII (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep Até 3.3)
-EMEF Mário Lago (Ideb AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Mururés (Ideb AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Professora Olinda Menezes Serra Vidal (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-CEU EMEF Paraisópolis (não teve o Ideb AF divulgado em duas edições e com Idep até 3.3 )
-EMEF Pedro Américo (não teve o Ideb AF divulgado em 2023 e com Idep até 3.3)
-EMEF Pedro Teixeira (IDEB AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Perimetral (Ideb AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Plínio Marcos (não teve o Ideb AI divulgado; Idep abaixo 3,7)
-EMEF Saturnino Pereira (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Sud Mennucci (IDEB AI até 4,9; não atingiu sua meta projetada em 2023)
-EMEF Vinicius de Moraes (IDEB AF até 4,3; não atingiu sua meta projetada em 2023)”, finaliza.