O amarelo dá o tom deste mês de setembro, que há 20 anos alerta para um tema delicado e necessário: a prevenção ao suicídio. O Setembro Amarelo é um convite à reflexão sobre saúde mental em todas as fases da vida, incluindo a infância, período em que muitas questões emocionais começam a se manifestar. Segundo informações da Organização Mundial da Saúde (OMS), metade dos transtornos mentais surgem antes dos 14 anos. É nesse ponto que a educação pode ser peça-chave, transmitindo conhecimento e oferecendo suporte.
Segundo psiquiatra Fábio Leite, a atenção à saúde mental infantil é urgente. “A maior parte dos casos de tentativa ou de suicídio consumado são consequência de transtornos mentais, diagnosticados ou não, tratados ou não. Às vezes não são bem conduzidos, não têm todo o processo de prevenção. Às vezes a família não está preparada, não consegue enxergar os sinais”, ressalta o médico.
O especialista alerta para situações de bullying sofrido na escola e lembra que a infância é naturalmente alegre e extrovertida, e mudanças nesse padrão devem chamar atenção.
“Uma criança que foge do padrão de comportamento esperado, sendo triste, calada, evitando contato ou demonstrando desinteresse e dificuldade também no rendimento escolar pode estar passando por um processo de isolamento e de má adaptação ao ambiente social. Esses sinais costumam indicar alterações emocionais, muitas vezes relacionadas ao ambiente familiar”, comenta o médico.
Fábio reforça que esses temas extracurriculares são essenciais e abrem o olhar para uma visão mais panorâmica da vida. “As crianças conseguem enxergar as coisas de uma forma bem mais real”, diz. Ele cita sinais de alerta importantes, como a perda ou amento de apetite, alteração de sono, desinteresse por brincadeiras ou por coisas que a criança gostava anteriormente, isolamento e, às vezes, irritabilidade ou agressividade.
“A criança não necessariamente fica triste; às vezes pode ficar mais irritada e agressiva. Mudanças de comportamento normalmente mostram que a criança está com alguma alteração de humor”, alerta o médico.
O psiquiatra enfatiza a importância do diálogo, mantendo sempre um espaço para que a criança possa falar e ser ouvida. “É importante que esse indivíduo possa falar sobre as emoções, porque isso traz liberdade para manifestação de sentimentos. Esse espaço tem que ser principalmente em casa; a criança tem que ter liberdade e segurança para falar sem medo de nenhum tipo de represália, crítica ou repressão”, diz.
O especialista pontua que o diálogo deve ser leve e lúdico. “Brincando, rindo, comentando situações do dia a dia e propagandas, ou mesmo em atividades artísticas. Nada sério demais, de forma tranquila, lúdica e até por brincadeira. Às vezes as crianças ficam com vergonha, com medo de falar, porque acham que aquilo é fraqueza ou ridículo, mas ela tem que entender que é natural, faz parte do ser humano”, comenta Fábio.
Fabio destaca, ainda, a importância de evitar as negligências. “Qualquer tipo de negligência na infância tem repercussão, às vezes trágica e inimaginável, na idade adulta. Toda negligência terá repercussão, pode ser pequena ou total. Por isso, trabalhar esse tipo de tema e discussão é muito válido”, revela.
Sobre o papel da escola, Leite é enfático. “As escolas devem ser um centro de prevenção desde o primeiro dia de aula; elas deveriam ter, por exemplo, um certificado fornecido pela Secretaria de Educação, mostrando que previne o bullying, do mesmo jeito que alguns hospitais recebem certificações de excelência com relação ao ambiente”, comenta.
A escola como aliada na saúde mental
Para a educadora Kassula Corrêa, integrar o desenvolvimento socioemocional ao currículo é essencial. “Uma criança emocionalmente saudável aprende melhor, se relaciona melhor e cresce mais preparada para a vida. Na escola, não podemos tratar o socioemocional como um extra, ele precisa estar no DNA do projeto pedagógico”, afirma.
Algumas atividades podem estimular competências como autoconhecimento, empatia e resolução de conflitos, complementados por práticas de cultura maker, uso ético da Inteligência Artificial e projetos colaborativos. “A alimentação balanceada e atividades físicas regulares também fazem parte do cuidado com a saúde mental”, reforça a educadora.
Kassula indica, ainda, cinco ações práticas para promover saúde emocional: incluir o socioemocional no currículo, treinar equipes pedagógicas, criar ambientes seguros e acolhedores, cuidar da rotina alimentar e física e envolver a família.
Com atenção diária, diálogo aberto e parceria entre escola e lar, é possível criar uma rede sólida de proteção, garantindo que crianças cresçam mais seguras, confiantes e preparadas para lidar com os desafios da vida.