Nos últimos tempos, um conceito vem ganhando cada vez mais destaque entre arquitetos, designers e até profissionais da saúde mental. Consegue imaginar qual a relação entre os três? A resposta é a dopamine decor. A proposta vai além da estética. Trata-se de decorar ambientes com o objetivo de despertar prazer visual e sensações positivas no cérebro, por meio da ativação da dopamina, neurotransmissor associado ao bem-estar e à sensação de recompensa.
Para o psicólogo Fabiano de Abreu Agrela, diretor do Centro de Pesquisa e Análises Heráclito (CPAH), há fundamento emocional e neurológico por trás dessa tendência. “O design pode sim ajudar a estimular a dopamina. Isso acontece quando o ambiente provoca uma sensação de prazer visual ou emocional. Pode ser pela escolha das cores, pelas lembranças que certos objetos despertam ou até por um aroma agradável. Nosso cérebro responde a tudo que é novidade ou beleza de forma positiva. Isso ativa o nosso sistema de recompensa, aquele que nos faz sentir bem com pequenas conquistas do dia a dia”, explica.
A arquiteta Beatriz Venâncio, da Tune Arquitetura, reforça esse vínculo emocional com o espaço e aponta que a popularização da dopamine decor é uma resposta às experiências coletivas recentes. “Essa tendência ganhou força como resposta ao desejo coletivo de ambientes mais afetivos, acolhedores e energizantes — especialmente após períodos de incerteza e isolamento. Ela transforma o lar num espaço de expressão individual, onde o visual impacta diretamente o estado emocional de quem vive ali.”
Luz, cor, formas e texturas são recursos essenciais na criação desse impacto, por isso, o psicólogo explica que ambientes bem iluminados e com cores bem usadas têm grande efeito sobre o nosso cérebro. A luz natural ajuda a regular nosso relógio biológico, melhorando o sono e o humor. Já cores vivas, quando bem equilibradas, aumentam a energia.

Projeto de Beatriz Venâncio

Projeto de Beatriz Venâncio
A designer de interiores e artista plástica Cecília Herculano complementa que a luz é quem possibilita que vejamos tudo o que existe e, na dopamine decor, que tem como base a ativação sensorial e emocional, ela é fundamental. Além disso, ela destaca que tanto a luz natural quanto a artificial podem ser usadas de forma estratégica para criar cenas sensoriais. “Algumas academias usam a luz vermelha para estimular foco e energia. Já em um spa, uma luz quente e suave cria um ambiente de prazer e relaxamento”, diz.

Projeto da designer Cecília Herculano
Mas se engana quem pensa que tudo se resume às cores. Beatriz destaca que os padrões têm papel crucial. “Padrões são elementos-chave no dopamine decor. Formas geométricas — especialmente as curvas, ondas, arcos e espirais — são muito utilizadas, pois remetem à fluidez e ao movimento, quebrando a rigidez dos ambientes tradicionais. Estampas retrô, bolinhas (polka dots), listras coloridas e padronagens psicodélicas também são comuns, evocando uma estética divertida e nostálgica”, comenta a arquiteta.
Perfil
Segundo Agrela, esse tipo de estimulação deve sempre considerar o estilo do morador. “As cores e os padrões em um ambiente influenciam diretamente nossas emoções, mas esse efeito não é o mesmo para todo mundo. O importante é que a decoração respeite o propósito do espaço e, sempre que possível, o perfil de quem o habita”, analisa o psicólogo.
Mas há desafios, e Cecília explica que, apesar do apelo visual, o dopamine decor exige equilíbrio e sensibilidade.
“O principal desafio é encontrar o ponto de equilíbrio entre estímulo e excesso. É fácil cair em um espaço carregado visualmente ou que se torne cansativo com o tempo. Por isso, é essencial pensar a decoração com intencionalidade: equilibrar cores intensas com bases neutras, intercalar elementos vibrantes com texturas naturais, por exemplo. Criar pontos de respiro no projeto é tão importante quanto criar pontos de destaque”, avalia.

Projeto da designer Cecília Herculano
Em caso de excesso, pode ter até efeito reverso. “Buscar estímulos constantes de dopamina pode gerar o efeito contrário. Um ambiente com excesso de informação visual, cores muito fortes ou objetos demais pode causar ansiedade e confusão mental. O ideal é que o ambiente tenha equilíbrio, com áreas mais neutras para a mente poder relaxar”, observa o psicólogo.
Como aplicar?
Texturas naturais como madeira, algodão, couro ou linho passam sensação de acolhimento. Já superfícies muito frias ou sintéticas podem criar desconforto, mesmo que a gente não perceba de forma consciente.
No caso de ambientes domésticos, esse tipo de atenção é ainda mais importante. “Ninguém quer uma sala com luz verde, mas uma luz amarelada é o que a gente espera ter em casa“, comenta.
A designer Cecília Herculano acredita que a casa precisa ser um antro de estímulos sensoriais em cada ambiente, mas que te faça sentir bem. “Vejo como uma consequência de um movimento maior: a busca por bem-estar e por uma casa com mais identidade. A estética “dopaminada” pode até se transformar com o tempo, mas a ideia de que o espaço deve nos fazer sentir bem, esse conceito veio para ficar”, conclui.

Projeto da designer Cecília Herculano