Celebrado nesta quinta-feira (7), o Dia Nacional do Documentário Brasileiro homenageia o cineasta baiano Olney São Paulo. Nascido em 7 de agosto de 1936, ele é considerado um dos pioneiros do gênero no País, tendo Manhã Cinzenta, Pinto vem aí, Dia de Erê e O Profeta de Feira de Santana na lista de principais trabalhos. Ele também produziu outros filmes, como Como nasce uma cidade e Ciganos do Nordeste.
A data foi instituída pela Associação Brasileira de Documentaristas (ABD) como forma de reconhecer e valorizar a importância desse formato na preservação da memória, da cultura e da identidade brasileiras. Para entender os desafios da profissão e o papel do documentário como ferramenta de transformação social, o GPS|Brasília conversou com o diretor Pedro Lenehr, que atua há anos na produção de filmes com foco comunitário e impacto social.
Em sua trajetória, Pedro já retratou tribos, bairros periféricos e diferentes grupos sociais. “Sempre fui apaixonado por histórias reais. Percebi cedo que muitas delas pedem por apoio e visibilidade”, conta. Segundo ele, o documentário vai além da narrativa jornalística: enquanto a mídia tradicional se ocupa do periódico, o documentário é atemporal. Ele faz um recorte antropológico e filosófico dos fatos e pode mudar a trajetória de quem é retratado.
Lenehr afirma que uma das maiores recompensas do seu trabalho é ver como as comunidades se sentem valorizadas após se verem na tela. “A autoestima cresce. Elas percebem que suas vivências são importantes e podem inspirar outras.”
Entre os principais obstáculos para quem produz de forma independente no Brasil, Lenehr destaca as exigências legais e a falta de informação técnica. “É preciso lidar com direitos de imagem e propriedade intelectual. Muitos produtores ainda não têm acesso a esse conhecimento”. Para ele, fortalecer o setor passa pela organização institucional, participação ativa junto à Ancine e associações da área.
Apesar dos desafios, o diretor vê avanços. “Os editais culturais costumam abrir espaço para documentários, e as plataformas de streaming e redes sociais ajudaram a aproximar o público desse formato”. No entanto, ele ressalta que a distribuição ainda precisa melhorar para alcançar mais telas e competir no cenário internacional.
Lenehr acredita que o Brasil tem uma vocação natural para o gênero. “Nossa diversidade cultural é uma potência documental. Temos muitas histórias para contar e um público que valoriza cada vez mais esse tipo de produção”. Para quem deseja começar a filmar histórias reais, ele dá um conselho direto. “Antes de contar, é preciso ouvir. Só com escuta sensível e consciência é possível fazer um filme que respeite e represente de verdade”, sugere.
Em meio às celebrações da data, o cineasta também aproveita para indicar títulos indispensáveis para quem quer mergulhar no universo documental brasileiro.
Documentários que você deve assistir:
Ilha das Flores (Jorge Furtado)
O documentário Ilha das Flores, de Jorge Furtado, narra a trajetória de um tomate, desde o seu plantio até o seu descarte na Ilha das Flores, local que abrigava um lixão da cidade de Porto Alegre, onde cerca de 500 toneladas de lixo por dia eram despejadas na época.
“Eu tenho carinho especial por esse documentário porque nunca esqueci quando o assisti ainda na infância, na escola. Foi a partir dele que percebi que haviam outras linguagens de documentários além daqueles mais tradicionais que vemos na TV. De maneira ácida e cômica o documentário escancara a desumanização das relações na sociedade e explora um senso crítico muito apurado pelo espectador”, comenta Pedro sobre o longa.
Edifício Master (Eduardo Coutinho)
Dirigido por Eduardo Coutinho, Edifício Master retrata o cotidiano dos moradores do Edifício Master em Copacabana, no Rio de Janeiro, que fica a um quarteirão da praia. O prédio tem 12 andares e 23 apartamentos por andar, sendo 276 conjugados, onde moram cerca de quinhentas pessoas.
“Esse é um documentário muito sensível e impactante que consegue nos emocionar de várias formas diferentes. Acho que esse filme nos faz pensar muito sobre a vida que levamos na cidade e como nos relacionamos, ou não, com quem está ao nosso redor”, comenta Lenehr.
A cidade é uma só? (Adirley Queirós)
A cidade satélite de Ceilândia, no Distrito Federal, é o ponto de partida do documentário. No início da década de 1970, a população foi retirada à força do local sob uma promessa de urbanização que não se cumpriu. “Uma docuficção que revisa de maneira muito interessante como ocorreram os processos de marginalização das comunidades no desenvolvimento do DF e como isso foi percebido e vivido pelos cidadãos”, comenta Pedro.
Meu nome é Daniel (Daniel Gonçalves)
Meu nome é Daniel conta a história de Daniel Gonçalves, que nasceu com uma deficiência que nenhum médico foi capaz de diagnosticar. Por meio de imagens de arquivo da família, cenas atuais, histórias e reflexões de Daniel, conheça o caminho de sua vida para tentar compreender sua condição.
“O Daniel revisa e reflete sobre sua própria vida buscando compreender a doença desconhecida que tem. Esse é um documentário autobiográfico excelente pra que as pessoas quebrem os preconceitos e se desfaçam da forma capacitista de olhar às pessoas com deficiência”, comenta o cineasta.
ODU Mostra Itinerante de Teatro (Pedro Lenehr)
“Eu não poderia deixar de indicar esse curta documentário que dirigi em 2022. Esse filme acompanha um coletivo de artistas negros e periféricos levando teatro e consciência de raça a comunidades que, em alguns casos, nem sequer conheciam essa arte. Essa ação foi muito forte e reuniu grandes artistas com discursos antiracistas muito fortes”, diz Pedro.