A condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos e 3 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), concluída nesta quinta-feira (11), permite uma reflexão sobre o que teria acontecido no Brasil e no mundo caso uma decisão semelhante fosse proferida quase três décadas atrás.
O exercício de comparação ajuda a dimensionar o impacto temporal de uma pena desse porte e contextualiza a relevância política do momento atual.
Para se ter ideia, o período fixado na dosimetria equivaleria a um intervalo que vai de 1998 até 2025, fase marcada por profundas transformações na política, na economia e no comportamento social. ]
No Brasil, foi o tempo em que o Plano Real se consolidou, ocorreram crises cambiais e financeiras, a esquerda chegou ao poder com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e, anos depois, o país assistiu ao impeachment de Dilma Rousseff (PT) e à ascensão da direita com liderança de Bolsonaro. No cenário global, o mundo foi sacudido por atentados terroristas, guerras, crises econômicas e avanços tecnológicos sem precedentes.
A proposta de remontar esses 27 anos oferece uma leitura histórica sobre o que o ex-presidente teria perdido atrás das grades caso tivesse sido condenado naquela época. São eventos que moldaram o sistema político nacional, a relação entre os Poderes e o papel do Brasil no cenário internacional. De FHC a Lula, passando pelas turbulências econômicas e pela pandemia de Covid-19, a linha do tempo ilustra o peso de quase três décadas de acontecimentos consecutivos.
Para reunir esse panorama, a redação do GPS|Brasília produziu uma cronologia destacando os principais fatos ocorridos entre 1998 e 2025. O levantamento relembra eleições presidenciais, crises políticas e decisões judiciais que definiram os rumos do país, além de episódios mundiais que influenciaram diretamente a economia e a geopolítica. O material ajuda a compreender o alcance histórico da condenação do ex-presidente e o simbolismo de uma sentença que cobre praticamente uma geração inteira.
Confira a linha do tempo:
1998 – Brasil
Fernando Henrique Cardoso (PSDB) é reeleito presidente. O País consolida o Plano Real, mas enfrenta os primeiros sinais de vulnerabilidade cambial. A internet começa a se popularizar, embora ainda restrita a universidades e parte da classe média.
1999 – Mundo e Brasil
A crise financeira da Rússia abala mercados internacionais. No Brasil, ocorre a desvalorização do real, marcando uma das maiores turbulências econômicas do governo FHC.
2001 – Mundo
No dia 11 de setembro, os atentados terroristas contra as Torres Gêmeas em Nova York (EUA) mudam a geopolítica global. Os ataques resultam em quase 3 mil mortes e levam ao início da chamada “guerra ao terror”, com invasões no Afeganistão e, posteriormente, no Iraque.
2002 – Brasil
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é eleito presidente do Brasil. Pela primeira vez, um líder sindical e representante da esquerda chega ao Planalto, inaugurando um ciclo político de grande impacto social e econômico.
2005 – Brasil
O escândalo do Mensalão atinge o governo Lula, após denúncias do ex-deputado federal Roberto Jefferson, quando foi revelado um suposto esquema de compra de votos no Congresso. O episódio gera forte crise política e abre caminho para julgamentos que marcaram parte da história do STF.
2008 – Mundo
A crise financeira internacional, originada nos Estados Unidos com o colapso do setor imobiliário, provoca recessão global. O Brasil sente os efeitos com retração no PIB e aumento do desemprego.
2010 – Brasil
Sucessora de Lula, Dilma Rousseff (PT) é eleita presidente do Brasil, tornando-se a primeira mulher a assumir o cargo no País. A vitória da petista representa a continuidade do projeto político progressista iniciado por Lula.
2014 – Mundo
A Rússia anexa a Crimeia, gerando conflito com a Ucrânia e tensões diplomáticas com o Ocidente. No mesmo período, o Estado Islâmico ganha força no Oriente Médio, espalhando instabilidade no cenário internacional.
2016 – Brasil
Após meses de crise política, Dilma Rousseff sofre impeachment. O então vice-presidente Michel Temer (MDB) assume a Presidência do Brasil. O episódio aprofunda a divisão política e abre espaço para integrante da direita ganharem notoriedade política.
Trump vence a candidata democrata Hillary Clinton. A eleição ocorre em 8 de novembro daquele ano, quando o republicano obteve 304 votos no Colégio Eleitoral contra 227 de Clinton. O resultado aponta que o bilionário venceu o pleito, apesar de ter perdido no voto popular por cerca de 2,87 milhões de votos (Trump recebeu aproximadamente 62,98 milhões e Clinton 65,84 milhões).
2018 – Brasil
7 de abril: Lula é preso após condenação no caso do tríplex do Guarujá e levado à Superintendência da Polícia Federal em Curitiba (PR) por 580 dias, de 7 de abril de 2018 a 8 de novembro de 2019. A decisão em segunda instância ocorreu após ação conduzida pelo então juiz federal Sergio Moro.
28 de outubro: Antagonista do Partido dos Trabalhadores e da esquerda como um todo, Jair Bolsonaro (PL) vence as eleições presidenciais com discurso contrário ao sistema político tradicional e forte uso das redes sociais. A chegada do ex-capitão do Exército ao poder inaugura um período de intensa polarização e conflitos entre o conservadorismo e as bandeiras mais progressistas.
2019 — Brasil
8 de novembro: Lula é solto após decisão do STF que revoga a prisão após condenação confirmada em segunda instância e anula toda a ação penal por identificar erros processuais os quais teriam prejudicado a defesa do petista.
2020 — Mundo
11 de março: a Organização Mundial da Saúde (OMS) declara pandemia de Covid-19. O vírus paralisa economias, provoca milhões de mortes e se torna a maior crise sanitária mundial do século.
2021 — Mundo
Joe Biden toma posse como presidente dos Estados Unidos, em meio a protestos e contestação de Donald Trump sobre o resultado eleitoral, com invasão ao Capitólio, sede do Congresso norte-americano.
2022 — Brasil
30 de outubro: Lula é eleito novamente presidente, derrotando Jair Bolsonaro em uma das eleições mais polarizadas da história recente.
2023 — Brasil/Mundo
• 8 de janeiro: radicais invadem e depredam as sedes dos Três Poderes em Brasília. O episódio é considerado tentativa de golpe.
• A guerra da Ucrânia continua, com impactos energéticos e geopolíticos globais.
• A inteligência artificial generativa ganha força em escala mundial, transformando indústrias, comunicação e política.
2025 — Brasil
11 de setembro: a Primeira Turma do STF condena Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão, em regime inicial fechado, pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A decisão também atinge outros militares e aliados próximos, como ex-ministros e integrantes do primeiro escalão do governo bolsonarista.
Condenação pelo STF
A decisão que condenou Jair Bolsonaro integra o processo relacionado aos atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas em Brasília. O episódio resultou na abertura de inquéritos para apurar os responsáveis pelos ataques.
As investigações apontaram que Bolsonaro e aliados estimularam a tentativa de golpe de Estado e participaram da elaboração da chamada “minuta do golpe”, documento encontrado e apreendido pela Polícia Federal prevendo medidas de exceção contra ministros do STF.
No julgamento realizado pela Primeira Turma, o placar final foi de 4 a 1, com voto divergente do ministro Luiz Fux. Do total da pena de 27 anos e 3 meses de Bolsonaro, segundo a sentença, 24 anos e 9 meses deverão ser cumpridos em regime fechado, enquanto os 2 anos e 6 meses restantes serão em regime semiaberto ou aberto.
O ex-presidente também foi condenado ao pagamento de 124 dias multa, no valor de dois salários mínimos por dia. Além dele, outros nomes do classificado como “núcleo duro” do golpe também tiveram sanções da Suprema Corte
O delator da trama golpista e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, foi sentenciado a 2 anos de detenção. A pena será cumprida em regime aberto.
No caso do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), a Primeira Turma fixou pena de 16 anos, 1 mês e 15 dias de prisão, além da perda do mandato parlamentar. O ex-diretor da Abin ainda terá que pagar 50 dias-multa.
Veja a pena para os réus do “núcleo do golpe”:
- Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil: 26 anos (regime fechado);
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin: 16 anos (regime fechado);
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça: 24 anos (regime fechado);
- Augusto Heleno, ex-ministro do GSI: 21 anos (regime fechado);
- Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha: 24 anos (regime fechado);
- Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa: 19 anos (regime fechado).