Após avaliar os impactos iniciais do tarifaço, o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo (USP), concluiu que o Brasil tem condições de suportar a pressão sobre as exportações de café e carne bovina. O estudo também aponta que a economia dos Estados Unidos deverá sentir um efeito rebote no consumo do chamado tripé comercial, composto por café, carne e laranja.
Desde o anúncio da taxação de 50% sobre produtos nacionais pelos estados Unidos, que valerá a partir de 1ª de agosto, especialistas se debruçam calculando os impactos políticos e econômicos da medida.
Café
Os Estados Unidos são o maior consumidor global do produto e importam cerca de 25% do Brasil, especialmente da variedade arábica, insumo essencial para a indústria local de torrefação. Como o país norte-americano não produz café, a elevação do custo de importação deve comprometer a viabilidade de toda a cadeia interna, que envolve torrefadoras, cafeterias, indústrias de bebidas e redes de varejo.
Com a queda nas cotações do produto e a instabilidade externa provocada principalmente pelo tarifaço, os produtores têm vendido volumes mínimos para manter o fluxo de caixa, adiando as grandes negociações para esperar por definições sobre o cenário tarifário.
“A exclusão do café do pacote tarifário é não apenas desejável, mas estratégica, tanto para a sustentabilidade da cafeicultura brasileira quanto para a estabilidade da cadeia de abastecimento norte-americana”, destaca o pesquisador de café do Cepea, Renato Ribeiro.
Suco de laranja
O suco de laranja é o produto mais sensível a essa política tarifária, justamente por ser perecível. Os Estados Unidos importam atualmente cerca de 90% do suco que consomem, sendo que o Brasil é responsável por aproximadamente 80% desse total.
“A aplicação de uma sobretaxa de até 50% elevaria significativamente o custo de entrada nos Estados Unidos, comprometendo sua competitividade no segundo maior destino dos embarques brasileiros”, dizem os pesquisadores, em nota.
Segundo a professora Margarete Boteon, da Esalq/USP e pesquisadora da área de citros do Cepea, a safra 2025/26 promete ser expressiva, com uma projeção de 314,6 milhões de caixas apenas no estado de São Paulo e no Triângulo Mineiro, um crescimento de 36,2% em relação ao ciclo anterior. No entanto, com o canal norte-americano sob risco, a especialista alerta para a possibilidade de acúmulo de estoques e pressão sobre os preços internos.
Carne bovina
Os Estados Unidos são o segundo maior comprador da carne bovina brasileira, atrás apenas da China, que concentra 49% do total embarcado pelo Brasil. Nos últimos meses, no entanto, houve redução no volume exportado, enquanto os embarques para a China vêm crescendo.
Em junho, especificamente, vários outros parceiros comerciais também aumentaram suas compras com o Brasil na comparação com maio. Segundo o Cepea, isso sinaliza que os frigoríficos brasileiros têm possibilidade de ampliar suas vendas para outros mercados.
As empresas norte-americanas são responsáveis por 12% das exportações do produto brasileiro e, entre março e abril, elas adquiriram volumes recordes de carne bovina, acima de 40 mil toneladas por mês. A quantidade pode indicar uma possível movimentação de formação de estoque diante do receio de que Trump viesse a aumentar as tarifas para o comércio exterior.
São Paulo, Goiás e Mato Grosso do Sul são os estados brasileiros, respectivamente, que mais têm exportado carne aos EUA.
Frutas frescas
No caso do mercado de frutas frescas, o maior impacto imediato recai sobre a manga, dizem os pesquisadores da USP. Isso acontece porque a janela crítica de exportação desse produto aos Estados Unidos começa em agosto.
De acordo com o Cepea, já há relatos de postergação de embarques frente à indefinição tarifária. A uva brasileira, cuja safra tem calendário relevante para os EUA a partir da segunda quinzena de setembro, também passa a integrar o grupo de frutas em alerta.
A projeção otimista foi substituída por dúvidas. Antes do tarifaço a expectativa era de crescimento de exportações de frutas frescas, sustentada pela valorização cambial e pela recomposição produtiva de diversas culturas.
De acordo com o pesquisador Lucas de Mora Bezerra, além da retração esperada nas vendas aos EUA, há o risco de desequilíbrio entre oferta e demanda nos principais destinos, pressionando as cotações ao produtor.
Diante desse contexto geral relacionado ao café, à carne bovina, ao suco de laranja e às frutas frescas, o Cepea informa que é urgente “uma articulação diplomática coordenada, com vistas à revisão ou exclusão das tarifas sobre produtos agroalimentares brasileiros”.
Tal medida é estratégica não apenas para o Brasil, mas também para os próprios Estados Unidos, cuja segurança alimentar e competitividade da agroindústria dependem de forma substancial do fornecimento brasileiro”, diz a nota.