O Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) pode ter perdas de R$ 800 milhões já em 2025, caso as mudanças propostas no pacote de corte de gastos enviado pelo ministro da Fazendo, Fernando Haddad, sejam aprovadas pelo Congresso Nacional. Para desenhar estratégias e impedir essa perda crescente das receitas de custeio do DF, o Correio Braziliense reuniu autoridades e figuras políticas representativas, na tarde desta quarta-feira (18), para o debate Entre os Eixos do DF: o Fundo Constitucional do Distrito Federal.
Um dos autores do projeto que criou o FCDF, o empresário, ex-senador e ex-governador Paulo Octávio fez um histórico da aprovação da medida. “Em dezembro de 2002, o fundo tinha de ser votado porque o governo Fernando Henrique estava acabando. No dia 18 de dezembro, o senador Ramez Tebet, pai da ministra Simone Tebet, nos chamou. Por volta de 20h, foi colocado em votação e, de repente, o senador Eduardo Suplicy (PT) pediu vistas. Ficamos assustados, mas a participação de Ramez foi fundamental, pois disse que a votação já havia começado. E o fundo foi aprovado. E hoje, 22 anos depois, a gente está coincidentemente com o mesmo problema”, lembrou.
Paulo Octávio, que preside o PSD no DF, revelou que a legenda vai votar unida. “Ano passado nós tivemos o mesmo assunto em pauta, a Câmara aprovou a penalidade para a Brasília, mas quando chegou ao Senado, o nosso bom amigo Rodrigo Pacheco (PSD-MG) encampou nossa ideia e deu a relatoria ao senador Omar Aziz (PSD-AM), que é de um estado que tem também o seu incentivo, a Zona Franca de Manaus. E ele prontamente entendeu nossa demanda, nos ajudou e conseguimos ter uma vitória enorme no Senado. Depois, o projeto voltou para a Câmara e conseguimos, graças ao esforço de todos os partidos políticos, que a questão fosse esquecida”, completou.
De repente, chegou o susto. Novamente, com a insegurança jurídica que o Brasil atravessa, enfrentamos o mesmo problema. Mas as notícias que tive na Câmara são positivas, pelo menos na parte do PSD. Segundo nosso líder, Antônio Brito (BA), vamos fechar a posição, convencer todos os deputados a defender a capital da República. O que está em jogo hoje é a política, que vai determinar se o fundo fica. Essa é uma mudança que vai afetar profundamente a cidade, os empregos, a economia da cidade”, acrescentou.
Paulo Octávio fez uma relação de prejuízos para a cidade. “Haverá aumento da desigualdade, a partir do momento que não se consegue dar aumento. Haverá impactos na economia local, pois todas as entidades vão sofrer. Serão menos recursos circulando, funcionários vão ganhando menos, menos possibilidades de aumento. Isso afeta toda a economia local. Não é só o salário que nos preocupada, é com toda a economia local. Também haverá prejuízos no atendimento à população do entorno”, afirmou.
O entorno está todo aqui. São pessoas que devem ser bem recebidas, vizinhos nossos. Conversei com vários deputados de Goiás, porque prejudicar a Brasília é prejudicar Goiás. Nossa função de capital é enorme. Imaginem quantos ministros trabalham em Brasília, quantos embaixadores, quantos deputados, quantos senadores. A essa máquina toda Brasília tem que dar segurança, educação e saúde. O comprometimento é muito sério”, complementou, lembrando ainda que “o uso da Receita Corrente Líquida (PCL) da União é chave, pois quanto mais o Brasil crescer, mais o governo vai arrecadar”.
Presidente do Correio Braziliense, Guilherme Machado endossou o discurso do presidente do PSD-DF. “Mais uma vez, o Correio Braziliense abre este espaço para debatermos e mostrarmos às autoridades a importância do FCDF para Brasília e o DF. Estamos aqui com a presença dos Três Poderes e da iniciativa privada para tentar sensibilizar estas pessoas. O Fundo não pode ser alterado e essa é uma bandeira do Correio Braziliense, que tem como obrigação defender os interesses de Brasília e do DF. Nós não vamos nos calar até que consigamos extinguir essas tentativas de corte ou reduzir valor”, afirmou.
Por sua vez, a vice-governadora Celina Leão lembrou que Brasília tem desafios de todas as grandes capitais. “Temos aqui uma migração que vem para nossa cidade precisando de serviços públicos. A imagem de ‘Ilha da Fantasia” não é verdade. As pessoas precisam visitar os lugares mais longínquos do DF. Mas cabe à capital outras responsabilidades além de cuidar das pessoas que estão aqui”, disse.
Brasília é a guardiã da democracia, que faz a segurança dos poderes e das embaixadas, e é sobre isso que estamos falando. Não podemos ser comparados com nenhum outro estado. Nosso FCDF é usado para três áreas prioritárias: saúde, educação e segurança. A cidade cresce e há uma lógica no crescimento em cima da Receita Corrente Líquida. Na medida em que o País cresce, o DF cresce três, quatro, cinco, dez vezes mais. Um crescimento destes com o encolhimento do fundo só tem como resultado a miséria, tragédia, insegurança e norte. Retirar dinheiro do FCDF é retirar da saúde. Nós precisamos muito deste recurso”.
Outros presentes ao evento organizado pelo Correio Braziliense seguiram a mesma linha de atuação. Para procurador-geral de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Georges Seigneur, há peculiaridades no DF que exigem um olhar especial para a cidade.
“O constituinte imaginou o FCDF como uma solução para estas peculiaridades. Para se ter uma ideia, o Ministério Público do Distrito Federal é parte da União. O MP fiscaliza a política pública e a proteção de direitos fundamentais e humanos. É muito importante termos segurança e que saibamos a solução no caso do FCDF. É importante que melhoremos as políticas públicas e que tenhamos o custeio para isso”, destacou.
O presidente da Câmara Legislativa, deputado distrital Wellington Luiz (MDB), afirmou que op FCDF é uma forma de proteger o cidadão. “Quantas vezes encontramos políticos almoçando sem carro blindado. Isso ocorre porque aqui temos segurança. Tirar o FCDF é matar o DF a faca, aos poucos. Em poucos anos não teremos dinheiro sequer para custear a folha da segurança”, completou.
Eu sei que estou em uma cidade segura. Esse é o nosso dever e nossa obrigação. Não podemos permitir que se teme outro golpe como em 8 de janeiro. E eu espero que esta seja a última tentativa de golpe contra o nosso FCDF”, concluiu.
O advogado Paulo Maurício Braz Siqueira, Poli, presidnete eleito da OAB-DF, lembrou que o FCDF é uma defesa da Constituição para que a capital tenha as condições básicas de funcionamento, especialmente em assuntos básicos, como segurança. “A capital não tem capacidade de indústria e serviços como em outros estados. Por isso há o federalismo, que faz com que a capital funcione. Temos hoje a terceira maior região metropolitana do Brasil. Não pode haver um corte retilíneo de verbas sem olhar as necessidades específicas. Quem ajuda o socorro a 4 milhões de pessoas na capital é o FCDF”, ressaltou.
Temos de exigir a responsabilidade das autoridades, para que parem de brincar com números. E é preciso conhecer a realidade da cidade. Sem o FCDF não se torna viável o atendimento das necessidades do cidadão. A OAB vai exigir que haja respeito à Constituição e não aceita o corte sem critérios técnicos e sem respeito à sociedade”, finalizou.
O secretário de Segurança do DF, Sandro Avelar, fez um desenho preciso da importância do Fundo Constitucional para Brasília. “O FCDF criou condições para que a capital federal se estabelecesse. Ele nos move e nos une. O custeio das nossas corporações é feito com o fundo”, lembrou.
Hoje nós temos uma defasagem. Entre 2011 e 2014, tínhamos 16 mil PMs. Agora, voltamos aos 11 mil. E o ideal são 18 mil. Na Polícia Civil eram 6 mil. Hoje, temos 4,6 mil. O DF tem a maior densidade demográfica do Brasil, em um quadradinho que não tem indústrias e que precisa do FCDF, que está sendo atacado de novo”, observou.
Avelar também fez duras críticas ao ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, e a boa parte dos parlamentares. “Não conhecem a realidade do DF e nem nossas necessidades”, disparou. Também garantiu que atos como o de 8 de janeiro de 2023 “nunca mais vão se repetir” e completou dizendo que é preciso fortalecer as forças de segurança da capital.
Estamos tratando o DF com carinho e lutando para atender as demandas que são das Regiões Administrativas, da União, do Congresso, do Poder Judiciário e das 133 embaixadas, a segunda maior representação do mundo. É paradoxal que, ao mesmo tempo em que fomos submetidos a um massacre após o 8 de janeiro, estejamos criando uma extrema dificuldade para proteger o DF e o arcabouço que está na capital. É inadmissível que se insista neste assunto”, concluiu.
Para o vice-presidente do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), André Clemente, pacotes de austeridade deveriam ser feitos após ouvir quem vai ser atingido por eles. Ele acredita que o preidente Luiz Inácio Lula da Silva vai se sensibilizar e ouvir o Distrito Federal.
Não me parece racional mudar um critério de médica orçamentária por um inflacionário. Essa redução de R$ 800 milhões vai resolver o problema de déficit federal. E não adianta ter metas fiscais e resultados orçamentários bonitos se eu sacrificar políticas públicas. O FCDF tem o viés de compor custos de segurança pública, saúde e educação. E a recomposição das forças não estão acompanhando o tempo. O fundo é recurso do DF e deve ser protegido”, finalizou.
Além das apresentações individuais, o evento do Correio Braziliense incluiu ainda dois debates sobre o tema.