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Canisso: muitas saudades, mas muitas histórias boas também

Existe uma máxima que sustenta a ideia de que, basta alguém morrer para essa pessoa se tornar perfeita ou qualquer coisa do tipo. De fato, isso é uma falácia, afinal, a essência do ser humano são as qualidades e defeitos que cada um carrega em si. No entanto, quando uma maioria compartilha a mesma opinião, podemos crer que uma verdade se estabelece, e no caso de Canisso, baixista do Raimundos, que morreu nesta segunda-feira (13), as mais de dez entrevistas e depoimentos recolhidos são uníssonos: “um cara do bem”, “dono de um coração enorme” e “que vai deixar muitas saudades”.

 

Paulista de nascença, naturalizado brasiliense, cresceu na capital do rock, rodeado por amigos que sonhavam em virar rockstars – alguns conseguiram, outros desempenharam papel importante na seara e outros continuam a viver dessa arte. 

 

Entre eles, Zé Ovo, baixista e um dos vocalistas da banda Little Quail and The Mad Birds. “Várias bandas se reuniam para ensaiar na casa do Digão, cada um chegava com seus instrumentos, e o Canisso aparecia de bike, um cara sensacional, amigão,  gente boa, humilde, parceiro de muitas aventuras antes e durante o Raimundos”, relembra. “Várias vezes, no auge, eu encontrava ele e ele falava: ‘Zé Ovo, isso tudo é uma ilusão, é tipo espuma de champanhe, é bonito, é gostoso, mas não é nada que podemos nos apegar’, querendo me alertar que precisamos ter pé no chão sempre”, completa.

Zé Ovo

 

Quem também guarda boas lembranças é a cantora Izabella Rocha, ex-Natiruts. “Essa foto foi feita no AR Estúdios (RJ), quando fomos gravar nosso primeiro disco, o Nativus. O Rodolfo e o Canisso estavam lá gravando com a Rita Lee, pintaram e fizemos esse registro”, conta. As agendas fizeram os amigos se cruzarem várias vezes pelo Brasil afora, e a impressão de Iza sobre o amigo de Brasília sempre foi a mesma: “Um cara super espirituoso, um talento, coração bom, maravilhoso. Um músico criativo, compositor. Uma figura marcante para a música brasileira. Um pai bacana, um amigo atencioso que vai fazer muita falta, mas com certeza vai ser recebido por uma linda sinfonia de anjos do lado de lá”.

Izabella Rocha e o Natiruts com Canisso

 

Entre shows e turnês, Guilherme de Bem, guitarrista da banda Dona Cislene, recorda quando excursionou pela primeira vez para o Nordeste, onde foram abrir os shows dos Raimundos. “Em Recife, eu estava supernervoso e o Canisso apenas falou para mim, ‘Cara, só toca do jeito que vocês sempre tocaram, vai ser tranquilo’. E foi muito incrível, o público nos recebeu superbem”. 

Dona Cislene com os Raimundos

 

Em outra ocasião, em Brasília, o Digão convidou o Dona Cislene de surpresa para subir ao palco e tocar Só o Oco, “mas eu não lembrava como tocava, cheguei do lado do Canisso e disse ‘vai tocando que eu te sigo’ e fui olhando e fazendo o mesmo. Na hora do solo, ele me deu um tapinha nas costas, para eu fazer na frente galera, fiz, voltei, e isso foi muito fera, a confiança que ele sempre me passou”, compartilha Guilherme.

 

Canisso e Tico Santta Cruz

 

O vocalista da banda Detonautas, Tico Santta Cruz ficou estarrecido com a notícia da morte do amigo: “Inacreditável essa notícia! Estou em choque! Canisso era mais que um amigo que considerava muito! Ele foi um mestre iluminado que o Universo colocou no meu caminho e que me ensinou muito sobre a estrada e sobre a vida! Nossas famílias são amigas! Nossas esposas se falam! Eu tenho um amor profundo por esse cara! Poderia escrever um livro só com o que aprendi com ele. Ainda não acredito nisso”, lamentou.

 

Gustavo Bertoni

 

Gustavo Bertoni, guitarrista e vocalista da banda Scalene recorda que “estivemos juntos em alguns festivais e shows que abrimos para os Raimundos. Me chamava a atenção a forma que ele equilibrava a figura ‘durona’ de rockeiro velha guarda e uma postura educada e atenciosa. Nós demos risada quando ele comentou que não esperava um ‘som tão pesado de rostinhos tão bonitos’ quando viu nosso show”. Bertoni destacou que “sendo fã ou não, as bandas novas devem respeitar as portas que foram abertas por bandas que vieram antes como o Canisso. Desejo luz e força pra família“.

 

Produtores musicais que trabalharam desde o começo com o baixista também lamentam a perda e reúnem histórias incríveis para contar. Gian Marco Uccello, produtor executivo que representava a Warner Music em Brasília nas décadas de 1980 e 1990, foi um dos que entregou a fita demo do Raimundos para a gravadora. Foi ele quem pagou a passagem de ônibus da banda para a banda gravar o primeiro álbum, em São Paulo.

 

O Canisso era o mais velho da molecada roqueira da época, acabou sendo o elo entre as gerações, afinal, sempre foi um cara agregador, aberto a uma conversa e um bom papo. Ele não tinha distinção, na época de tribos, ele transitava em várias tranquilamente”, relembra. “Além da família, ele era muito ligado também à mulher e aos quatro filhos. A música e o fusquinha sempre estiveram presentes na vida dele”, completa.

 

Gustavo Sá, produtor do famoso festival chamado Porão do Rock, fala que Canisso era seu amigo desde a 5ª série, quando chegou para morar em Brasília, no ano de 1977. “Eu fui estudar no Colégio Dom Bosco, onde a gente caiu na porrada uma vez por alguma bobagem. Depois nós demos muita risada disso”, lembra. “Todas nossas histórias são muito loucas e muito engraçadas, do tempo que a gente frequentava o Gilbertinho, onde os punks e darks se reuniam”.

Gustavo Sá

 

Entre as diversas memórias, ele conta: “um dia decidimos fazer o Forrock numa chácara que eu tinha, uma mistura de festa junina reunindo bandas de rock com trio de forró e tudo mais. Aliás, os Raimundos foi a primeira banda a participar, e o Fred nem tocava na bateria. Como a festa foi meio surpresa, poucas pessoas iriam, foi o Canisso quem falou para todo mundo onde seria, mas ele não chegou na hora porque errou o caminho que ensinou para as pessoas, e na volta, o maluco ainda capotou o carro”, conta Gustavo às risadas. “É um cara que vai deixar muita saudade, um cara muito bacana e querido. Deus te receba, meu amigo”, finaliza.

 

Com tanta lembrança boa, resta ao GPS|Lifetime render uma última homenagem a José Henrique Campos Pereira, o Canisso, abrindo espaço para os demais depoimentos que recolhemos para fazer esta matéria e que você confere logo abaixo. Até mesmo porque, muitos por aqui na nossa redação conheceram e até conviveram com o músico, este jornalista mesmo já bateu altos-papos no Ceubinho da UnB. A opinião geral redunda: um cara muito massa!

 

Digão, seu grande companheiro de banda, fez um post muito emocionado, que finalizou escrevendo por inteira a oração O Credo em homenagem ao amigo: 

 

Rodolfo Abrantes, ex- vocalista dos Raimundos também registrou seus sentimentos no Instagram:

 

O Canisso era o elo de ligação entre o rock de Brasília dos anos 80 e o rock dos anos 90! Uma grande perda para a música popular brasileira. Descanse em paz, meu brother”.

PC Cascao é advogado, ex-vocalista e líder da banda Detrito Federal, precursor do punk rock na capital, e amigo desde a adolescência de Canisso

 

Andreas Kisser, o guitarrista do Sepultura reagiu à notícia e mostrou solidariedade à família em luto:

 

João Gordo, da banda Ratos de Porão destacou a simplicidade e o caráter de Canisso:

 

Músico talentoso, muito carismático. Ele era querido, atencioso. Tinha astral e alegria na alma. A última vez que estive com ele foi no show do The Killers. Nos encontramos no camarim. Fiz muitos shows com ele entre Brasilia e Goiânia! Na boate Zoom, no ginásio Nilson Nelson. Teve um show que fizemos na praça de alimentação do Gilberto Salomão, que o palco era em cima do Pão de Açúcar. Foi um sucesso. No dia seguinte fiquei sabendo que os alimentos das prateleiras tinham caído no chão”.

Rodrigo Amaral, produtor cultural e um dos pilares na cena do pop rock brasiliense

 

Fernando Badaui, o vocalista da CPM22 confessou ser fã desde sempre dos Raimundos:

 

O Canisso começa muito antes do Raimundos. Sua história com a música vem desde a época do Gilbertinho. Ele estava presente no início do punk rock com a Plebe Rude, Finis Africae, Capital Inicial. Ele é parte integrante de todo este movimento que virou o rock de Brasília. Ele foi extremamente importante pros Raimundos por ter experiência e um espírito conciliador”.

Luisca Carvalho, advogado e personagem importante na cena do Rock Brasília

Redação GPS

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