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Brasil precisa de ajuste de R$ 300 bi para estancar dívida crescente

Governo federal deve reduzir gastos e aumentar receitas para desacelerar o rombo. Especialistas debatem fórmula para reencontrar o equilíbrio fiscal
Fernando Haddad e Aloizio Mercadante chegam ao gabinete do governo de transição no Centro Cultural Banco do Brasil.

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O governo tem pela frente uma dura batalha para acertar o rumo das contas públicas e estancar o endividamento crescente do Brasil. Com pouca margem de manobra para conduzir o ajuste fiscal, as projeções dos analistas indicam que a dívida do País deve alcançar 90% do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos cinco anos.

Para reverter esse quadro, de uma dívida considerada alta para uma economia emergente, o tamanho do ajuste necessário, segundo analistas, é da ordem de R$ 300 bilhões – tanto em corte de gastos como em aumento de receitas. É esse o montante bilionário que pode tirar a economia brasileira do rombo previsto para este ano e levá-la para um superávit primário capaz de estabilizar o endividamento do País.

Chegar nesse valor, no entanto, não é tarefa fácil e vai implicar ações impopulares. “_As medidas vão envolver a sociedade: uma parte vai precisar pagar imposto, outra parte vai perder algum privilégio_”, diz Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da Ryo Asset. Ele reforça que a trajetória atual da dívida pública deixa a economia brasileira vulnerável. “_Qualquer choque global será mais difícil de ser absorvido. Não é um nível confortável._”

A dificuldade para “_arrumar a casa_” se dá porque o Brasil enfrenta uma combinação perversa. O Orçamento do País já é bastante engessado, dificultando qualquer corte de gastos. Por outro lado, há pouco ou nenhum espaço para o aumentar as receitas, num cenário de elevada carga tributária.

“_Os pagamentos com Previdência Social e outros benefícios somam quase 50% dos gastos públicos. Outros 20% são de salário do funcionalismo federal_”, afirma Flávio Serrano, economista da BlueLine Asset Management. “_De largada, 70% dos gastos estão contratados para pagar salário e Previdência._”

**Pacote Fiscal**

Neste mês, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou um pacote fiscal com potencial de transformar o rombo previsto nas contas do governo para este ano, de R$ 231,5 bilhões, em um superávit de R$ 11,1 bilhões.

As medidas são focadas no aumento de receitas e incluem a volta da cobrança de impostos federais sobre os combustíveis – que ainda não está definida – e um programa de refinanciamento de dívidas tributárias. O pacote também prevê, em menor grau, corte de despesas, com revisão de contratos e programas do governo.

Porém, o próprio Haddad já reconheceu que algumas medidas serão frustradas. Assim, em vez de entregar as contas no azul, ele se comprometeu a reduzir o déficit de 2023 de 2,1% do PIB para 1% do PIB – o que representa um rombo próximo a R$ 100 bilhões.

No anúncio, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que as medidas anunciadas colocavam o País numa “_condição muito mais sustentada do ponto de vista do endividamento_”, já que a dívida ficaria estabilizada em cerca de 75% do PIB num horizonte de quatro anos.

Essa avaliação, no entanto, diverge das projeções de muitos especialistas. Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), o País teria de fazer um superávit primário de 2,5% do PIB em 2023 para estabilizar a dívida pública. A instituição avalia o pacote deve se limitar a reduzir o rombo deste ano para 1,3% do PIB. Nesse cenário, projeta a dívida para 77,8% em 2023, beirando 80% do PIB em 2024.

“_Esse plano foi sinalizado como um pacote de medidas preliminares. É preciso fazer um pouco mais_”, afirma Vilma Pinto, diretora da IFI. “_Mas, o pacote é importante para mostrar que o governo está preocupado com a trajetória da dívida_”, destaca.

**Social**

Vários estudos feitos por analistas mostram quais caminhos o governo brasileiro pode adotar para resolver o dilema das contas públicas. Um ponto de partida seria melhorar a gestão de programas sociais e fazer a revisão do Cadastro Único – o que poderia trazer uma economia de R$ 28 bilhões por ano, segundo Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da Ryo Asset.

Em 2022, houve um forte crescimento na quantidade de famílias compostas por apenas um integrante – chamadas de unipessoais – incluídas no Cadastro Único. O governo já confirmou que haverá uma revisão na base de dados.

Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, aponta a reoneração do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) e a redução de benefícios tributários – mas reforça os entraves políticos. “_Desde o governo Temer, muito se fala e se tenta reduzir esses benefícios, mas sempre há restrições políticas_”, diz.

Um outro caminho poderia se dar com a venda de ativos, mas o governo já descartou um avanço em privatizações. “_Sem venda de ativos, é muito difícil ter a estabilização da dívida no curto prazo_”, diz Flávio Serrano, economista da BlueLine Asset Management.