“Tomei o ‘medicamento da moda’ por conta própria. Estava com quase 130 kg e emagreci 40 kg, mas logo ganhei novamente”. Esse é o relato da advogada Márcia Neri, de 52 anos, que se automedicou na busca rápida pela perda de peso. “À época, minhas amigas estavam perdendo peso com facilidade. Eu consegui o contato de uma pessoa que vendia e encomendei”, relata.
Histórias como a de Márcia são comuns e preocupam especialistas que tratam a obesidade. Profissionais da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES) alertam sobre os perigos do uso de remédios para emagrecimento sem prescrição médica, como comprimidos, chás e, em especial, remédios injetáveis.
Endocrinologista do Centro Especializado em Diabetes, Obesidade e Hipertensão Arterial (Cedoh), a médica Anita Laboissière Villela destaca que a obesidade é uma doença crônica e complexa, sendo essencial a abordagem de uma equipe multiprofissional no tratamento, que requer, além de medicamentos, mudança de estilo de vida, com alimentação saudável e em quantidade adequada, atividade física regular, relacionamentos saudáveis e sono reparador.
Para desmistificar o uso de remédios, existem medicamentos extremamente úteis e necessários no tratamento da obesidade, mas pode haver contraindicação de acordo com o perfil de cada paciente. “Tem medicação que é absolutamente proibida para alguns pacientes e que para outros vai ser ótima. Os efeitos colaterais dependem do medicamento”, explica a especialista.
Remédio, só com prescrição
A médica dá o exemplo da sibutramina, que aumenta a frequência cardíaca e pode elevar a pressão. “Se uma pessoa com hipertensão arterial descontrolada tomar, pode ter um AVC ou um infarto”. Já em pacientes que possam utilizar a substância e recebam a correta orientação e acompanhamento médico, o emagrecimento é de cerca de 15% do peso inicial. “Ou seja, para uns é remédio, para outros é veneno”, enfatiza.
Outro ponto de atenção é sobre a dosagem. Algumas medicações necessitam de escalonamento de dose, o que o paciente, por conta própria, não terá conhecimento, aumentando o risco de efeitos colaterais.
Em relação à semaglutida, medicamento bastante conhecido, a referência técnica distrital (RTD) de endocrinologia Flávia Franca ressalta que há importantes critérios para indicação – entre eles, ter um bom funcionamento do fígado e não possuir histórico de câncer de tireoide, pancreatite ou pedra na vesícula.
“Medicamentos prescritos contra a obesidade vieram para ajudar, não são vilões, mas devem ser utilizados só por quem tem excesso de peso e com indicação médica. O caminho para perder peso é um processo difícil, mas a parte mais difícil é a manutenção do peso perdido. Por isso a importância da mudança de vida, ou o resultado vai durar pouco”, alerta.
Mudança de hábitos
Sem associar o tratamento a uma mudança no estilo de vida, é muito comum que a pessoa volte a ganhar peso. É importante ter ciência que os cuidados, na obesidade, são a longo prazo.
“Sem uma boa alimentação, uma prática de atividade física, um cuidado com a saúde mental, a gente não consegue atingir os fatores causais da doença, e ela acaba se tornando uma doença recidivante [recorrente]”, pontua a nutricionista Cássia Regina de Aguiar Nery Luz, que também integra a equipe do Cedoh.
Por isso, a orientação das profissionais é que o primeiro passo seja buscar uma equipe de saúde e iniciar atividade física com acompanhamento. Para evitar frustrações, usuais em quem enfrenta o excesso de peso, é aconselhável ter em mente que o medicamento, se indicado, será apenas um dos pilares do tratamento.
Para começar um exercício físico e criar um hábito saudável, a sugestão é que o paciente busque algo prazeroso. “É necessário explorar diversas áreas. Fazer aula de dança, natação, caminhada. Experimentar e ver o que vai gostar para dar continuidade”, opina a fisioterapeuta Angelina Freitas Siqueira.
Após sentir na pele os efeitos colaterais da automedicação para emagrecer e perder um irmão de 31 anos por causa da obesidade, Márcia Neri adotou essas dicas. “De lá para cá, me cuido por questão de saúde mesmo. Estou diabética e preciso ter qualidade de vida”, conta.
Quem procurar?
Pessoas interessadas devem buscar uma unidade básica de saúde (UBS) para mais informações. No site InfoSaúde, é possível localizar o local de referência de acordo com a residência do usuário.
Na UBS, o paciente é avaliado. Alguns casos podem ter indicação de acompanhamento na própria unidade, enquanto outros são encaminhados para a atenção secundária.