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Às vésperas de lançar livro com grandes histórias, Edison Lobão recebe o GPS|Entrevista

Com revelações de mais de 60 anos de vida pública, "Memórias e Testemunhos - Revelações Políticas" é uma leitura fascinante

Duas vezes ministro de Minas e Energia, senador por três mandatos consecutivos, deputado federal em duas legislaturas e governador do Maranhão, Edison Lobão é um dos mais importantes protagonistas da história política do Brasil desde os anos 1960. Em mais de seis décadas de vida pública, esteve em governos desde o período militar até as gestões de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, nos quais desenvolveu um de seus maiores projetos de vida: o Luz para Todos.    

Foi um programa pensado pelo presidente Lula. Coube a mim executá-lo. Passamos a colocar energia nos lares gratuitamente. Muitos sequer sabiam o que era uma lâmpada acesa. Se nós amarrássemos os fios utilizados, daríamos 37 voltas na Terra. A ONU considerou este o maior programa social do mundo, pois agregou uma parcela considerável da população brasileira na modernidade. Pequenas fábricas surgiram e as fazendas também se beneficiaram”, conta Lobão.

Aos 88 anos, com tantas histórias para contar, ele acaba de escrever o livro “Memórias e Testemunhos – Revelações Políticas”, que está sendo lançado pela G.Ermakoff – Casa Editorial. Para falar da obra e detalhar algumas histórias, Edison Lobão abriu sua casa e recebeu a equipe do GPS|Entrevista para uma conversa sobre a publicação e sobre o momento político atual. Com seu olhar crítico e experimentado, indicou caminhos e fez reflexões interessantes.  

Somos donos do quinto maior território do mundo, cultuamos o regime democrático e nas poucas vezes que dele nos apartamos, sofremos profundamente as consequências. O brasileiro não sabe viver sem liberdade. E as duas ditaduras – a de Getúlio Vargas e a que se implantou a partir de 1964 – fizeram com que tivéssemos um prejuízo considerável no que diz respeito à construção de lideranças políticas em condições de governar e dirigir o País”.

Para exemplificar este prejuízo, Lobão faz uma comparação com a Alemanha, país que enfrentou duas grandes guerras e que soube construir dezenas de alternativas, especialmente após 1945. “É um país com vários líderes ao mesmo tempo. Os alemães prestigiam as lideranças e os partidos são donos de fundações que vão às universidades em busca dos melhores alunos e os convidam para a vida pública, elegendo-os pelo voto distrital misto. Infelizmente, o Brasil não está assim. Precisamos cultuar a vida pública, para que possamos a chegar aos objetivos que todos os brasileiros desejam”, completa.

Observador atento da ditadura militar que controlou o País entre 1964 e 1985, o maranhense de Mirante viu como o movimento se desvirtuou ao longo dos anos. “O marechal Castello Branco foi eleito para cumprir o restante do mandato de Jânio Quadros/João Goulart. Os militares entenderam que era preciso ficar um pouco mais. Em seguida, aí sim, veio o desejo em permanecer no governo e o general Costa e Silva se impôs presidente da República. Contraditoriamente, ao final de seu governo, motivado pelo grande democrata Pedro Aleixo, seu vice, concordou em editar uma emenda constitucional que possibilitasse a revogação dos Atos Institucionais e, a partir daí, restaurar o regime democrático”, conta. 

Nesta ocasião, políticos como José Sarney, que foi um grande lutador pela restauração da democracia, se juntaram para que não se chegasse a uma ditadura completa e o caminho da democracia fosse reencontrado. Havia eleições indiretas, regulares, de quatro em quatro anos. E foi-se andando até a revogação completa do AI-5, pelo presidente Ernesto Geisel. E o grande organizador da abertura democrática foi o senador Petrônio Portella. Eu estava lá, sendo autor da emenda constitucional que restaurou a eleição direta para senadores e governadores, para, a partir daí, a construir a eleição direta para presidente da República”, relembra.

Episódios desta época são relatados no livro. Edison Lobão relembra, inclusive, como Castello Branco resistiu o quanto foi possível às medidas mais duras, que atingiram diretamente o ex-presidente Juscelino Kubitschek. “Castelo Branco tinha conversado com JK, à época senador por Goiás. E pediu apoio. JK e Carlos Lacerda eram candidatos às eleições presidenciais, previstas para 1965. O general Costa e Silva, então ministro do Exército, se ensaiava candidato à sucessão do marechal. E exigiu a cassação do mandato e a suspensão dos direitos políticos de JK. Castello disse, então, que fora a Juscelino e não o proibiu de ser candidato. ‘Como posso agora cassá-lo?‘, questionou a Costa e Silva.

Os relatos do ex-senador e ex-ministro atestam que a intenção do marechal era terminar o regime militar no menor prazo possível. A ideia era compartilhada por civis. “Grandes líderes estiveram presentes nos governos da ditadura no sentido de ajudar a promover mais depressa a retirada dos governantes do que por solidariedade ao regime ditatorial”, acrescenta. No entanto, o emparedamento feito por Costa e Silva não permitiu que isso ocorresse e a democracia acabou derrotada, com sua eleição e a sequente edição dos Atos Institucionais. 

Anos mais tarde, Costa e Silva morreu em pleno exercício do mandato e a presidência não foi passada ao vice Pedro Aleixo, mas sim a uma junta militar, episódio que fez a ditadura recrudescer. Então, foi escolhido o general Emílio Garrastazu Médici para comandar o País. “Foi um período de muita repressão e não se sabia o que acontecia nos porões das prisões”, acrescenta.

A economia avançou consideravelmente, chegando a crescer 12%, mas as liberdades foram para o ralo. Felizmente, na sucessão dele, veio o Geisel, oficial preparado, que comunicou a Médici que revogaria o AI-5 e que retomaria o processo democrático. Médici não se opôs e Geisel cumpriu obstinadamente essa determinação. Quando deixou o governo, os instrumentos de força estavam quase todos revogados”, lembra, com precisão.

Lobão revela ainda que Geisel queria passar o poder diretamente aos civis. Mas foi desaconselhado, pelo risco de um efeito rebote. “Ele chamou Marco Maciel, Petrônio Portella, Francelino Pereira e Ney Braga, e comunicou que iria escolher um civil para sua sucessão. E os civis disseram que não era o momento. Um civil não se sustentaria na Presidência e haveria uma ditadura militar definitiva. Então, ele escolheu o (João) Figueiredo, com Petrônio Portella como ministro da Justiça, encarregado de revogar as leis que faltavam para a retomada do processo democrático”, conta.

O imperador etíope e o Brasil
O livro de Edison Lobão conta ainda histórias curiosas de governos posteriores e anteriores à ditadura. Uma delas envolve o imperador Hailé Selassié, que governou  Etiópia entre 1930 e 1974.  Em 13 de dezembro de 1960, ele visitava o Brasil, quando o chefe da Guarda Imperial liderou um golpe de estado, proclamando Asfa Wossen, filho mais velho de Selassié, como seu sucessor.

No terceiro dia da visita, houve o golpe. O avião que o trouxe foi embora e Selassié ficou sem recursos até para pagar o hotel onde estava. Foi, então, ao presidente Juscelino Kubitschek e pediu ajuda para voltar à Etiópia, dizendo que retomaria facilmente o poder e ressarciria as despesas. JK ficou de pensar e chamou o chanceler Horádcio Lafer e disse: ‘oficialmente, o Brasil não tem como ajudar o imperador. Você, que é ministro das Relações Exteriores e um empresário rico, vai ter que bancar a despesas até que ele volte ao seu país'”, conta Lobão.

Desconfiado, o chanceler Horácio Lafer perguntou a JK: “E se ele não me pagar?”. O presidente foi sincero e respondeu: “Você vai ficar no prejuízo, pois o que não podemos é deixar este homem aqui, boiando em mar aberto”, completou. Lafer, então, pagou todas as despesas e Selassié voltou a seu pais, retomando o poder facilmente, prendeu e exilando o filho e decapitando o chefe do gabinete militar em praça pública.

Selassié, então, convidou Horácio Lafer a ir à Etiópia, onde foi tratado como um príncipe. Na volta, ganhou uma bolsa, com a instrução de abri-la somente no avião. Naquela época, os presentes a autoridades não eram proibidos. Quando ele abriu, constatou que estava cheia de diamantes e outras pedras preciosas, ainda recebendo um cheque que cobria todas as despesas”, conta Lobão.

Assista a entrevista na íntegra.

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