Os recentes relatos sobre um plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, expõem a gravidade da crise institucional em que o Brasil foi mergulhado pelo bolsonarismo e pela extrema direita golpista.
A denúncia de que até mesmo agentes das Forças Armadas estariam, direta ou indiretamente, ligados a essa trama levanta um questionamento crucial: será que esses militares estavam comprometidos com a hierarquia e a disciplina, necessárias para o cumprimento de suas funções constitucionais?
Como instituição permanente, as Forças Armadas têm o papel de defender a Pátria e zelar pelas instituições democráticas, o que não se confunde com um poder moderador como tentou-se argumentar no governo passado, principalmente, diante da escalada de ataques ao STF e do desespero do então presidente diante da iminente derrota nas urnas. Pelo que sabemos o golpe não se concretizou pela falta de adesão do alto comando, que passou a ser hostilizado publicamente por Bolsonaro.
Entretanto, foi por muito pouco. Há tempos analistas destacam o erro da ampla anistia concedida para garantir a redemocratização em 1988. Na prática, a falta de punição para os crimes de alguns militares e a perpetuação de privilégios criaram a percepção de imunidade absoluta na cabeça fantasiosa de alguns elementos. Só isso para justificar a presença de um general, um tenente-coronel e um major, membros das Forças Especiais do Exército, os chamados “kids pretos”, em um plano tão sombrio.
Para além das sanções individuais contra aqueles que violaram a lei, é imperativo diferenciar pacificação de anistia. A pacificação envolve o restabelecimento da confiança da sociedade na condução das Forças Armadas como defensoras da democracia. Já a anistia para golpistas implicaria o grave risco de legitimar ações antidemocráticas futuras.
A impunidade consolida um precedente equivocado e enfraquece as bases institucionais do Brasil. Um ponto central da reforma deve ser o fortalecimento do controle civil sobre as Forças Armadas. Em países com democracias consolidadas, as instituições militares estão subordinadas a mecanismos de supervisão que impedem qualquer tentativa de atuação fora de seu papel constitucional.
Outro aspecto importante é a modernização dos currículos das academias militares, promovendo a formação de oficiais comprometidos com os valores democráticos e os direitos humanos. A ausência de uma perspectiva mais ampla no ensino militar compromete a compreensão dos desafios da sociedade contemporânea, principalmente das ameaças à democracia enfrentadas em cenários polarizados em que o diálogo muitas vezes é rejeitado pela sedução de viver em bolhas de consenso.
Parafraseando o Pe. Antônio Vieira, precisamos dialogar com as armas da inteligência; não com a inteligência das armas. A defesa da democracia exige medidas corajosas, inteligentes e adequadas à nova ordem constitucional a que o País se impôs a partir do fim da Ditadura Militar.
Garantir a punição dos envolvidos em atos antidemocráticos, reformar e fortalecer as Forças Armadas, repensando os fundamentos da hierarquia e da disciplina são passos fundamentais para assegurar que episódios como a tentativa de assassinato de líderes nacionais nunca mais se repitam. O Brasil precisa de Forças Armadas comprometidas com o 48 País, e não com interesses políticos ou ideológicos.
*Por Ricardo Vale, vice-presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal