A vida se torna uma **morte lenta**, um padecimento indizível. O lamento perpétuo de alguém que nada deseja, que pouco sente, que quase tudo negligencia. Assim descrevi o luto de um dos meus personagens, no romance _Qual é o nome da vez?_.
Apresentar uma perda tão significativa sob a lente masculina foi uma das experiências mais lancinantes do meu processo de escrita. Vivi, de mãos dadas com o meu protagonista, cada resposta emocional ao fato de ver sua esposa inexistir prematuramente.
Se o **pesar da ficção** grita tamanho desalento, ainda não pode ser comparado ao luto da vida real: um **processo natural** que ocorre em reação a um rompimento brusco de vínculo e que a grande maioria dos indivíduos terá que lidar mais cedo ou mais tarde no decorrer da vida.
Luto, que é a **morte de quem se foi**, mas também de uma versão – agora inalcançável – da pessoa que ainda vive. **Morte de expectativas, de sonhos, de promessas**. Sem tempo de duração definido, o processo pode se estender por anos e levar ao **adoecimento físico e mental**, caso não haja conscientização sobre a importância do acolhimento, da desconstrução da interdição do luto e de sua naturalização.
Esquivar-se da tristeza como **mecanismo de fuga** não liberta, não salva, não cura. Durante os tempos pandêmicos, o processo se tornou ainda mais complexo com força de fenômeno coletivo, afinal, **a morte se fez próxima e escancarada** em uma emergência sanitária global. Ainda choramos por esses mortos. Ainda estamos aprendendo a lidar com tantas perdas.
A **escrita terapêutica**, cada vez mais utilizada nesse processo, pode auxiliar o enlutado a vivenciar sua dor emocional e adaptar-se gradualmente a um novo contexto de vida de ausência do ente querido. Não substitui o acompanhamento psicoterapêutico ou psiquiátrico, mas é mais uma **ferramenta** a ser inserida no cotidiano do indivíduo a fim de **acalentar o sofrimento** diante da perda e equilibrar seu estado emocional.
Um dos exercícios mais recomendados para o luto é o da **escrita de uma carta** para alguém que já se foi, registrando em um papel suas memórias, agradecimentos, desculpas e qualquer palavra que deseja dizer hoje para a pessoa amada que já não está presente.
As possibilidades das palavras se tornarem ponte para a (re)organização de sentimentos nessa fase tão dolorosa são infinitas. A escrita **ressignifica experiências**, alcança memórias, é **canal de escuta atenta das dores** que carregamos no peito.
![Lella Malta](https://gpslifetime.blob.core.windows.net/medias/landing-page/Whats_App_Image_2022_11_01_at_16_39_54_fd1e29fe64.jpeg)
*_Lella Malta, cientista social, escritora, preparadora literária, educadora e terapeuta de escrita expressiva. Focada na saúde mental das mulheres, se dedica ao estudo da psicanálise e da psicologia positiva. Autora de três livros, os romances:_ Qual é o nome da vez? _e_ Você tem fama de quê?. _Além de uma obra autobiográfica que retrata a realidade de pessoas que lidam com a ansiedade:_ Prazer, Paniquenta: Desventuras Tragicômicas de Uma Ansiosa”.