A saúde mental das crianças é um tema que merece nossa atenção. Durante a infância, as crianças enfrentam desafios emocionais e comportamentais que podem impactar seu desenvolvimento.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a média global de crianças e adolescentes com diagnóstico de alguma doença mental seja 15,8% e esses números tendem a aumentar. No Brasil, 1 em cada 4 ou 5 crianças e adolescentes apresentam algum transtorno mental.
O diagnóstico de doenças mentais na infância pode ser desafiador, pois dificuldades no desenvolvimento ou mudanças de comportamento nem sempre significam que há uma patologia. Com o diagnóstico correto e tratamento adequado aplicado precocemente é possível promover o desenvolvimento saudável e o bem-estar emocional das crianças.
A criança pode chegar ao médico psiquiatra por meio de encaminhamento da escola, por médicos pediatras ou outros profissionais de saúde e pela própria família que busca ajuda quando percebe dificuldades no desenvolvimento e na aprendizagem na criança ou alterações significativas no comportamento que geram preocupação.
O comportamento da criança tem relação com o ambiente no qual ela está inserida. Crianças tendem a observar e serem influenciadas pelo comportamento dos pais, familiares, professores e amigos. Quanto menor a idade da criança, mais ela apresenta comportamentos que têm origem de reações vividas em determinado ambiente, seja ele familiar, escolar ou extra curricular, etc.
O que pode impactar o comportamento e a saúde mental das crianças?
- Conflitos familiares
- Abuso
- Negligência da família e de cuidadores
- Bullying
- Eventos traumáticos, como a perda de um ente querido, divórcio dos pais ou mudanças significativas
- Baixa autoestima
- Fatores genéticos e biológicos podem predispor algumas crianças a doenças mentais
Há um fenômeno preocupante que vem sendo observado nos últimos tempos que é a exposição excessiva a telas e vício em jogos online. Passar muito tempo em celulares e tablets pode afetar negativamente interações sociais, causar prejuízos no desenvolvimento cognitivos, na fala, na leitura, problemas de visão e também na autoestima, além de contribuir para a ansiedade e depressão
Quais são as principais doenças mentais que podem surgir na infância?
- Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH): É caracterizado por um padrão persistente de sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade e até uma mistura de sintomas. Afeta cerca de 5% das crianças em todo o mundo.
- Transtornos do Espectro Autista (TEA): é um transtorno do neurodesenvolvimento que impacta principalmente a comunicação, o comportamento social e as interações da criança com outros indivíduos. A doença geralmente é diagnosticada antes dos 3 anos de idade e afeta cerca de quatro a cinco em cada 10.000 crianças, com maior incidência em meninos.
- Depressão: Embora a depressão seja frequentemente associada a adultos, crianças também podem sofrer com esse transtorno. Sintomas incluem tristeza persistente, falta de interesse em atividades que antes eram prazerosas e alterações no sono e apetite.
- Ansiedade: Esses transtornos são comuns e podem se manifestar como fobias, ansiedade de separação ou transtorno de ansiedade generalizada. As crianças podem demonstrar preocupações excessivas, medos intensos e dificuldade em lidar com situações novas.
- Transtornos de Conduta: Comportamentos desafiadores, como desobediência e agressividade, podem indicar um transtorno de conduta.
Como saber que a dificuldade no desenvolvimento e as mudanças de comportamento são características de uma doença mental ou um comportamento comum para a idade?
Estar atentos a sintomas e sinais
Os pais e cuidadores devem estar atentos a mudanças significativas no comportamento da criança. Alguns sinais incluem: alterações no apetite e sono, isolamento social ou perda de interesse em atividades, mudanças de humor abruptas, comportamentos agressivos ou desafiadores persistentes, dificuldade na fala, dificuldades escolares, etc.
Buscar um profissional
É aconselhável procurar ajuda profissional se os sinais persistirem e se manifestarem de forma intensa, interferindo na vida diária da criança e no seu desenvolvimento. Se a família observar que há algum atraso para determinada faixa etária que traga prejuízos ou tenha um impacto significativo. O psiquiatra pode ajudar a diferenciar entre dificuldades normais de desenvolvimento e condições que requerem tratamento especializado.
Tratamento
O tratamento pode incluir psicoterapia que irá ajudar a criança a desenvolver habilidades para lidar com emoções e comportamentos. Além disso, ter uma boa qualidade de sono, alimentação saudável, diminuição do uso de telas, atividades lúdicas que ajudem a criança a desenvolver a criatividade, prática de esportes, atividades de lazer, incentivo à leitura, etc, também são uma forma de promover a saúde.
Envolver os pais, responsáveis e a escola no tratamento pode melhorar os resultados, promovendo um ambiente saudável para a criança. A colaboração é essencial para adaptar o ambiente de aprendizagem às necessidades da criança, garantindo que ela receba o suporte necessário.
Cuidar da saúde mental de nossas crianças é fundamental e imprescindível para que elas se tornem adultos saudáveis e tenham ferramentas adequadas para lidar com suas emoções e sentimentos.
*Antônio Geraldo da Silva é médico formado pela Faculdade de Medicina na Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. É psiquiatra pelo convênio HSVP/SES – HUB/UnB. É doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto – Portugal e possui Pós-Doutorado em Medicina Molecular pela Faculdade de Medicina da UFMG. Entre 2018 e 2020, foi Presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina – APAL.
Atualmente é Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Diretor Clínico do IPAGE – Instituto de Psiquiatria Antônio Geraldo e Presidente do IGV – Instituto Gestão e Vida. Associate Editor for Public Affairs do Brazilian Journal of Psychiatry – BJP. Editor sênior da revista Debates em Psiquiatria. Review Editor da Frontiers. Acadêmico da Academia de Medicina de Brasília. Acadêmico Correspondente da Academia de Medicina de Minas Gerais. Coordenador Nacional da Campanha “Setembro Amarelo®”, da Campanha ABP/CFM Contra o Bullying e o Cyberbullying e da Campanha de Combate à Psicofobia. É autor de dezenas de livros e artigos científicos em revistas internacionais e também palestrante nacional e internacional.