Recentemente fui convidado por um veículo para comentar um estudo inédito realizado pela Endeavor que mostrava que cerca de 94% dos empreendedores no Brasil afirmaram ter vivenciado ao menos uma condição adversa de saúde mental. A ansiedade é a mais frequente (85%), seguida de burnout (37%), ataque de pânico (22%) e depressão (21%).
Quando os sintomas se tornam frequentes e começam a trazer consequências para a produtividade do indivíduo no trabalho, na sua qualidade de vida e nas relações interpessoais, é preciso dar atenção.
Quais os sinais de alerta devemos estar atentos?
– Exaustão física e mental;
– Dificuldade em concentrar-se;
– Irritabilidade;
– Dificuldade para dormir;
– Desinteresse pelo trabalho;
– Frustração pessoal;
– Atrasos e ausências no trabalho;
– Isolamento.
Quando é hora de buscar ajuda?
Quando os sintomas se tornam persistentes e interferem significativamente na vida pessoal e profissional, é aconselhável buscar a ajuda de um médico psiquiatra.
A saúde mental no ambiente de trabalho é um tema cada vez mais relevante e urgente. Segundo o relatório “Diretrizes sobre Saúde Mental no Trabalho”, publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em setembro de 2022, os números são preocupantes: estima-se que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido a transtornos depressivos e de ansiedade.
O mesmo estudo verificou que em 2019, 15% da população adulta em idade produtiva sofria de algum transtorno psiquiátrico, entre eles depressão, ansiedade, esquizofrenia e transtorno bipolar. A OMS destaca que a depressão é uma das principais causas de incapacidade em todo o mundo.
No Brasil, um levantamento do Ministério da Previdência Social revelou que 288.265 trabalhadores foram afastados do mercado de trabalho devido a transtornos de ansiedade e depressão. Diante desses dados, é evidente a necessidade de ações concretas para promover a saúde mental no local de trabalho.
Um outro estudo realizado nos Estados Unidos identificou que empresas americanas gastaram mais de US$ 44 bilhões anuais em custos indiretos relacionados à doenças mentais no trabalho, como absenteísmo, ou seja, ausências de funcionário no trabalho, incluindo atrasos, faltas ou saídas antecipadas e perda de produtividade.
Como as empresas podem falar sobre saúde mental no trabalho e promover campanhas visando o bem-estar dos seus funcionários?
É fundamental que as empresas adotem uma abordagem de promoção da saúde mental e a prevenção de doenças como parte de sua cultura organizacional. Isso pode incluir campanhas internas regulares por meio de comunicados, jornal-mural, mapeamento dos afastamentos e identificação de funcionários que estejam enfrentando problemas de saúde mental, mas ainda sem afastar para o trabalho.
Parcerias com médicos especialistas em psiquiatria e medicina do trabalho com foco em saúde mental para palestras e workshops, além de programas e atividades voltadas para o bem-estar também podem ser benéficos. Diariamente indicamos estas empresas que já atuam no mercado.
Oferecer um ambiente acolhedor, onde os funcionários se sintam confortáveis para falar abertamente sobre seus sentimentos, é fundamental. Promover campanhas educativas e atividades que promovam o bem-estar pode ajudar a reduzir o estigma associado às doenças mentais e incentivar o autocuidado.
É possível também implementar soluções que ajudem a identificar e lidar com doenças mentais entre seus colaboradores. Instrumentos de rastreio eficientes podem ser utilizados para alertar sobre possíveis casos e facilitar a intervenção precoce. Além disso, a colaboração com a Medicina do Trabalho pode fornecer informações valiosas sobre afastamentos e tratamentos em andamento. Já temos hoje APPs e equipes onde realizamos este trabalho com excelente resultado.
Entrou em vigor no mês passado, a Lei 14.831/2024, de autoria da deputada Maria Arraes (Solidariedade-PE), que concede o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental para empresas que desenvolvam ações e políticas de promoção de saúde mental para os seus funcionários como incentivo à prática de atividades físicas e de lazer e alimentação saudável, ambiente seguro de trabalho, transparência e divulgação das ações relacionadas à promoção da saúde mental e do bem-estar de seus trabalhadores nos meios de comunicação utilizados pela empresa, oferta de acesso a recursos de apoio psicológico e psiquiátrico para seus trabalhadores, entre outros.
Os órgãos públicos também podem e devem promover campanhas de promoção à saúde mental. Recentemente foi firmado o Acordo de Cooperação Técnica do Grupo de Trabalho Interinstitucional (GETRIN) do Programa Trabalho Seguro da Justiça do Trabalho, contando com a adesão de diversos órgãos, entre eles os tribunais do trabalho, instituições do Poder Executivo, representantes de trabalhadores e empregadores, organizações da sociedade civil, incluindo a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e o Conselho Federal de Medicina (CFM), além de grupos de pesquisa de universidades. Essa parceria visa fortalecer a implementação de ações nacionais voltadas à promoção da saúde dos trabalhadores, prevenção de acidentes de trabalho e fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho.
O que os funcionários podem mudar no âmbito pessoal para cuidar da saúde mental?
Buscar manter um equilíbrio saudável entre vida pessoal e profissional também é importante. Isso inclui hábitos alimentares adequados, exercícios físicos regulares, tempo ao ar livre e momentos de lazer. Fortalecer os laços sociais.
Também é fundamental buscar ajuda médica quando perceber os impactos à qualidade de vida. Em caso de diagnóstico de um quadro psiquiátrico, o tratamento é sempre individual e, em alguns casos, pode ser medicamentoso e com psicoterapia.
Em suma, promover a saúde mental no local de trabalho é um compromisso essencial e que deve ser compartilhado tanto por empresas quanto pelos colaboradores.
*Dr. Antônio Geraldo da Silva é médico psiquiatra, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria e Diretor Clínico do IPAGE – Instituto de Psiquiatria Antônio Geraldo. É Coordenador Nacional da Campanha “Setembro Amarelo”, da Campanha ABP/CFM Contra o Bullying e o Cyberbullying e da Campanha de Combate à Psicofobia.