A depressão é uma condição complexa e multifacetada, que pode atingir qualquer pessoa, independentemente de sua trajetória de vida, conquistas ou da imagem que projeta publicamente. Recentemente, o Padre Fábio de Melo compartilhou sua experiência com a doença, revelando que enfrenta um novo episódio depressivo, apesar de sua espiritualidade e de ser uma figura amplamente reconhecida pelo acolhimento emocional que oferece a tantas pessoas.
Esse relato, assim como os de outras figuras públicas, como o humorista Whindersson Nunes, que já falou abertamente sobre sua luta contra a depressão e o tratamento continuado que realiza, serve para desmistificar a ideia de que a depressão atinge apenas aqueles que aparentam tristeza ou fragilidade. Pelo contrário, a doença pode se manifestar de diversas formas e, muitas vezes, não se faz a relação que se trata de depressão.
Não podemos deixar passar a informação que a base do resultado do tratamento das Depressões, é o diagnóstico correto para basear o plano de tratamento correto. Diagnóstico inadequado levará a tratamentos inadequados e respostas inadequadas. O Diagnóstico é médico pois tem inclusão de sintomas e exclusão de sintomas, o chamado diagnóstico diferencial.
Ainda há uma percepção equivocada, amplamente difundida, de que a depressão está unicamente associada a um humor constantemente rebaixado, melancolia e apatia. No entanto, existem diferentes tipos de depressão, algumas das quais não se encaixam nesse estereótipo. Há quadros depressivos que se apresentam de maneira mais sutil, podendo incluir sintomas como irritabilidade, fadiga persistente, insônia ou mesmo um comportamento social aparentemente funcional. É por isso que o diagnóstico adequado é essencial e deve ser conduzido por um médico psiquiatra, que é o profissional capacitado para diferenciar a depressão de outros transtornos psiquiátricos e indicar o tratamento mais adequado para cada caso.
Diferentemente de doenças como a diabetes ou a hipertensão, em que os pacientes compreendem a necessidade de um tratamento contínuo por poderem monitorar suas condições através de exames, a depressão, por ser um transtorno mental, muitas vezes é subestimada. Um dos erros mais comuns dos pacientes em tratamento da depressão e, ao mesmo tempo, mais arriscados, ocorre quando, ao perceberem uma melhora inicial dos sintomas, acabam interrompendo o tratamento por conta própria, acreditando estarem curados. Um paciente diabético, mesmo ao constatar que seus níveis de glicose estão controlados, não abandona a medicação, pois sabe que sua saúde depende do tratamento contínuo. No entanto, no caso da depressão, é comum que, ao sentir-se um pouco melhor, o paciente acredite que já pode suspender a medicação sem orientação do psiquiatra, o que pode comprometer gravemente sua recuperação e aumentar o risco de recaídas.
Além disso, é essencial compreender que o tratamento da depressão requer persistência, principalmente no início do uso de medicações. Muitos medicamentos não apresentam uma resposta imediata e podem levar semanas para começar a fazer efeito, sendo que, em alguns casos, a resposta plena só é observada após quatro a oito semanas de uso contínuo. Durante esse período, é comum que o paciente não perceba uma melhora significativa, o que pode levá-lo a acreditar que o tratamento não está funcionando. No entanto, interromper ou modificar a medicação por conta própria pode ser extremamente prejudicial e comprometer os resultados. Por isso, é fundamental seguir corretamente as recomendações do psiquiatra e ter paciência para que a medicação atinja seu efeito terapêutico esperado.
A falta de adesão ao tratamento, seja pela interrupção precoce da medicação ou pela não continuidade do acompanhamento psiquiátrico e psicoterapêutico, pode resultar em recaídas. Essas reincidências não significam que o tratamento falhou, mas sim que a depressão não foi completamente tratada ou que algum incidente prejudicou o sucesso do mesmo. Para que um paciente tenha uma resposta eficaz ao tratamento, é fundamental que ele siga com disciplina todas as prescrições e recomendações do psiquiatra, sem interrupções ou pausas. A interrupção abrupta do tratamento pode agravar os sintomas, tornando os episódios depressivos cada vez mais graves e mais difíceis de tratar.
Outro ponto fundamental no manejo da depressão é a compreensão de que, em alguns casos, a doença pode não responder adequadamente ao tratamento convencional. Há quadros chamados de depressão resistente, em que os sintomas persistem mesmo com o uso de medicamentos e psicoterapia. No entanto, é essencial que somente um médico psiquiatra conduza essa avaliação, pois há muitos fatores que podem interferir na resposta ao tratamento e que precisam ser investigados com precisão. Nem sempre a ausência de melhora significa que a doença é de difícil tratamento; pode haver uma manipulação inadequada dos medicamentos, uma condição subjacente ainda não diagnosticada ou até mesmo fatores que comprometem a qualidade e a eficácia da medicação como interações medicamentosas ou o uso de substâncias que reduzem sua efetividade, como cafeína, álcool e drogas, nicotina e estimulantes em geral.
Além desses fatores, a adesão ao tratamento psicoterapêutico também desempenha um papel crucial na recuperação do paciente. A psicoterapia, que deve ser realizada exclusivamente por psiquiatras e psicólogos, é uma ferramenta essencial no tratamento da
depressão, auxiliando na reorganização emocional e na modificação de padrões de pensamentos distorcidos. Entre as diversas abordagens da psicologia clínica, a psicoterapia
interpessoal e a terapia cognitivo-comportamental (TCC) é a mais recomendada, pois conta
com protocolos cientificamente testados e eficazes para o tratamento da depressão. Esse método ajuda o paciente a desenvolver estratégias para lidar com os desafios emocionais e
comportamentais que podem contribuir para a persistência dos sintomas, sendo um recurso
indispensável ao tratamento.
Agregado aos tratamentos medicamentosos e da psicoterapia, mudanças no estilo de vida também são essenciais para a melhora no quadro depressivo. Hábitos saudáveis, como a prática regular de atividades físicas, alimentação equilibrada, sono de qualidade e exposição à luz solar que garante níveis adequados de vitamina D, contribuem significativamente para o equilíbrio da saúde mental. Fatores como a desorganização do ritmo circadiano ou o consumo excessivo de substâncias que afetam o sistema nervoso central, podem interferir diretamente na resposta ao tratamento e, muitas vezes, dificultar a recuperação do paciente inclusive aumentando a possibilidade de recidiva.
A depressão é uma doença séria, que exige atenção contínua e um olhar cuidadoso para diversos fatores que influenciam sua evolução. O acompanhamento psiquiátrico é indispensável para um diagnóstico preciso e para garantir que o paciente receba o tratamento mais adequado ao seu quadro. Mais do que simplesmente combater os sintomas, o objetivo do tratamento da depressão é oferecer qualidade de vida, estabilidade emocional e prevenir recaídas, permitindo que a pessoa possa viver plenamente, sem os impactos devastadores da doença. Buscar ajuda profissional não é sinal de fraqueza, mas sim um passo essencial para a recuperação e para a manutenção da saúde mental. Se precisar, peça ajuda!
*Antônio Geraldo da Silva é médico formado pela Faculdade de Medicina na Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. É psiquiatra pelo convênio HSVP/SES – HUB/UnB. É doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto – Portugal e possui Pós-Doutorado em Medicina Molecular pela Faculdade de Medicina da UFMG.
Entre 2018 e 2020, foi Presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina – APAL. Atualmente é Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Diretor Clínico do IPAGE – Instituto de Psiquiatria Antônio Geraldo e Presidente do IGV – Instituto Gestão e Vida. Associate Editor for Public Affairs do Brazilian Journal of Psychiatry – BJP. Editor sênior da revista Debates em Psiquiatria. Review Editor da Frontiers. Acadêmico da Academia de Medicina de Brasília. Acadêmico Correspondente da Academia de Medicina de Minas Gerais.
Coordenador Nacional da Campanha “Setembro Amarelo®”, da Campanha ABP/CFM Contra o Bullying e o Cyberbullying e da Campanha de Combate à Psicofobia.