Em Brasília para participar do talk Vida e Obra de Bernardo Figueiredo, a atriz Ângela Figueiredo, filha do designer homenageado, dedicou alguns minutos de sua passagem pela capital federal a uma conversa cheia de memórias com o GPS|Brasília. O encontro foi realizado na loja Hill House, no Casapark, onde estão expostas diversas peças desenhadas por Figueiredo, que foram reeditadas pela marca gaúcha Schuster Móveis.
Atualmente à frente da empresa Acervo Bernardo Figueiredo, dedicada a preservar e promover a obra do designer, Ângela começou sua carreira ainda jovem, porém como modelo, dançarina e atriz. Com pai designer e mãe cineasta, ela acredita que, naturalmente, seguiu o lado artístico da família, mesmo tendo estudado em uma escola que tinha aulas de teatro, artes plásticas e música.
“Como meus pais tinham o pensamento criativo e artístico, o nosso mundo era esse. Enquanto eles criavam, a gente estava crescendo. Então, para mim, fazer coisas, pintar, desenhar, inventar um móvel, eram coisas normais”, relembra.
Ângela Figueiredo
Porém, assim como os filhos que não seguem o caminho dos pais, ela decidiu que seria dançarina. “Tem uma hora na adolescência que você também quer quebrar, quer mudar, quer ser você”, afirma. “Segui meu caminho e comecei a produzir. Porque, como meus pais, também tenho isso do ‘fazer acontecer’. Então eu fui influenciada por esse mundo de criação, abri minha mente para ser uma pessoa criativa e realizadora”, destaca.
Foi atriz de televisão por muitos anos, tendo atuado em novelas que marcaram gerações, como Guerra dos Sexos, Roque Santeiro e Selva de Pedra, da Rede Globo, e produções de emissoras como SBT e Band. “Eu comecei na dança e no estudo do teatro, depois entrei na televisão e fiz uma série de novelas. A bailarina ficou para trás, apenas nos meus estudos diários, como forma de manter a paixão que eu tinha pela dança, mas não mais profissionalmente. E a atriz tomou conta da minha vida”, resume Ângela.
“Só que em um determinado momento, eu percebi que eu precisava continuar o meu trabalho independente de convite. Porque quando você faz televisão ou um filme, você depende de convite, de um teste, de ter uma característica física específica. Não é só você, não é só o seu talento. Então eu comecei a produzir teatro”, conta.
Além disso, nas últimas duas décadas produziu inúmeras trilhas sonoras ao lado de seu marido, o músico Branco Mello, vocalista, baixista e fundador da banda Titãs. No entanto, sua principal ocupação nos últimos anos ficou por conta das criações de seu pai. Foi em 2010 que Bernardo a convidou para acompanhá-lo em um contrato de licenciamento das obras que havia criado na década de 1960 com a Schuster, fábrica de móveis.
Angela Figueiredo e Branco Mello
Tratava-se de um novo licenciamento, mais de trinta anos após ele ter interrompido a produção em série dos móveis. “Ele me chamou porque, além de atriz, sou produtora cultural, com experiência em diversos projetos culturais, como livros e CDs. Assim, fui acompanhar meu pai no processo de licenciamento. Pouco tempo após o lançamento da primeira coleção, ele faleceu”, revela.
Junto à irmã, Ângela fundou a empresa Acervo Bernardo Figueiredo, na qual é curadora do acervo. Desde o início da parceria com a Schuster, já foram lançadas 30 peças. “Observamos um crescente interesse do público pela obra de meu pai. Apesar de sua geração pertencer aos anos 1960 e de outros designers serem de gerações anteriores, seus projetos se destacam pelo design moderno da época, e hoje parecem quase produtos novos, pois não são amplamente conhecidos no mercado”, diz.
“Acredito que essa singularidade desperta curiosidade e atrai cada vez mais admiradores. Sinto que as portas das casas se abrem para a obra de meu pai, e isso nos inspira a seguir em frente”, completa a artista.
Depois de experimentar e vivenciar tantas vertentes artísticas, Ângela reconhece uma semelhança entre sua personalidade e a do seu pai: a multiplicidade – algo que ela só foi identificar depois que ele morreu, pois entrou em contato com um “Bernardo” que ela não conhecia.
“Conheci pessoas da área que ele atuou, que me falavam sobre ele. Então, eu comecei a ouvir que o meu pai tinha um pensamento único. Que a vida carioca dele influenciou muito a sua obra, porque ele tinha uma vida ao ar livre. Ele pensava no bem-estar das pessoas, ele pensava para quem ele estava fazendo o produto, ou a casa, ou o prédio… Então, isso foi me dando elementos para falar do meu pai como um profissional e tirar aquela impressão de ‘Ah, meu pai é bacana, é muito legal, meu pai é incrível’. Meu pai era extremamente talentoso e foi um cara que viveu à frente do tempo dele, fazendo coisas lindas”, ressalta.
“Então acho que, de uma certa forma, eu herdei essa característica da profissionalidade dele em mim, sem nem saber. Eu não tenho medo de mudar, de estar aqui falando sobre o Bernardo, de estar ali fazendo uma peça, de me adaptar a um determinado contexto. E não é que eu estou perdendo, eu estou sempre ganhando. Estou sempre desenvolvendo. E aquilo que eu fiz em uma área está me ajudando em outra, mas sempre em um mundo criativo, onde a gente faça acontecer coisas bonitas, artísticas. É sempre uma aventura, um desafio. O negócio é você ter calma e seguir”, conclui.
