A Loba sumiu! Que fim levou o presente de um barão italiano para Brasília?

21 de Abril. **Brasília e Roma nasciam**. No mesmíssimo dia, mas com alguns anos de diferença. Coisa pouca: Roma é 2713 anos mais velha: Brasília é de 1960 e Roma de 753 anos antes de Cristo.

Quando estava por ser inaugurada a irmãzinha caçula de Roma, o governo italiano e o Centro de Ação Latina da Itália do Barão **Guido Zonelli Morone** presentearam Brasília com uma cópia idêntica da escultura da **Loba Capitolina**.

A pequena e famosa estátua em bronze representa o mito da fundação da cidade de Roma em que a loba teria salvo e alimentado as crianças gêmeas Remo e Rômulo, no mesmo local onde, mais tarde, os irmãos fundariam a cidade de Roma. O nome da cidade é uma homenagem ao seu primeiro rei, Rômulo e a escultura é talvez o maior símbolo, não só da capital, mas de toda a Itália.

Créditos: Divulgação

A doação foi feita em 21 de abril de 1960 em Roma pelo Barão Guido Morrone, também proprietário da Lepetit Farmacêutica, que financiou a ação. Porém, a escultura só foi trazida a Brasília em outubro, através do diplomata italiano Carlo Giglioli. E não foi fácil: A loba, toda em bronze, junto com a belíssima coluna romana que serviria de base, pesavam muito. No total seis toneladas!

A prefeitura de Brasília (naquela época, Brasília era administrada por um prefeito) a instalou no meio do cerradão onde, no futuro, seria construída a Praça Municipal ou Praça da Municipalidade (hoje, Praça do Buriti), ao lado de uma palmeira de buriti, plantada a pedido do primeiro prefeito da cidade, Israel Pinheiro, inspirado pelo poema Buriti Perdido, de Afonso Arinos.

Mas ali não havia nada. Era só mato mesmo! Ainda assim, alguns turistas se aventuravam para ver a lobinha e seus dois filhos.

Segundo alguns relatos, surgiu um boato de que a loba era recheada de dinheiro. Então não deve ter sido muita surpresa quando em setembro de 1961, ROUBARAM A LOBA! Desapareceu!!! Sumiu! Ou, como diria Evandro Mesquita, escafedeu-se. Junto com ela, morria, talvez de tristeza pelo descaso, o pobre buriti.

Como nada pode ser ruim que não possa piorar, um ano depois, em dezembro de 1962, ROUBARAM A PLACA! Restou somente a coluna no meio do mato, abandonada.

Mas em 1° de fevereiro de 1963, três candangos, limpando o Cerrado ali perto, acharam parte da loba enterrada. A pobrezinha estava sem duas patas, arrancadas à marreta. Remo e Rômulo continuaram desaparecidos.

Bom.. vamos então consertá-la, né? Não! Não havia como fazer a restauração no Brasil! Teriam que enviar para a Itália, e isso sairia uma fortuna! O que fizeram então? Guardaram a bichinha mutilada em algum depósito da cidade.

Vexame foi quando o prefeito de Roma veio visitar Brasília. A Secretaria de Patrimônio chegou a esconder a loba com medo de ele, o prefeito de Roma, querer vê-la! Por sorte que isso não aconteceu.

Seis longos anos com a escultura guardada, chega a hora de inaugurar finalmente, em 7 de setembro de 1969, a grandiosa Praça da Municipalidade que já tinha o novo palácio do governo local, um novo buriti replantado e uma coluna romana abandonada! Mas… e a loba? Teriam que recuperá-la!

Créditos: Divulgação

Nessa época, já era possível restaurar a pequena loba no Brasil, e a Fundição Zani, do Estado da Guanabara, conseguiu deixá-la fielmente reconstituída, com Reminho e Romulinho de volta! Mas, instalar novamente numa praça erma e isolada? Nada disso! O prefeito da época, Wadjô Gomide, achou mais prudente instalá-la dentro do Palácio.

Finalmente em 1971 perceberam que o ideal era transferir a coluna e colocar a loba definitivamente em frente ao novo palácio, já chamado de Palácio do Buriti.

A história fica ainda mais interessante quando descobrimos que a loba, na verdade, não tem nenhum valor histórico, mas apenas material. É somente uma cópia em bronze. O que realmente ali tem valor histórico incalculável é a milenar coluna romana! Ela é uma das três colunas que faziam parte do Foro Romano que foram doadas ao Brasil (há uma em Natal, doada em 1931 e outra em São Paulo, doada em 1929). Trata-se de uma coluna em granito rosa de cerca de tres metros de altura, com pedestal circular, base octogonal e capitel (extremidade) em estilo jônico, proveniente da Collezione dell´Antiquario del Comune di Roma.


Agora, se você, leitor, se aborreceu com o descaso pelo patrimônio no Brasil, vai se assustar ainda mais com a história da escultura da Torre de TV, que contarei em outra coluna. Mas não ache que a depredação de bens históricos é exclusiva nossa. Na próxima coluna falarei de outro caso curiosíssimo e que envolve um monumento praticamente desconhecido que temos em Brasília e cujo original, símbolo nacional em seu país, foi também mutilado. Isso em um importante país europeu.

As fotos mostram a inauguração do monumento no meio do cerrado em 1960, a coluna abandonada no cerrado e, já na década de 70, a escultura com Giovanni Simonini, Cônsul da Itália em Brasília, em seu local definitivo.