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Crise na Americanas: executivos sabiam? Por que problema não aparecia?

Mercado financeiro busca respostas sobre o escândalo que empurrou a empresa centenária para uma dívida de mais de R$ 40 bilhões do dia para a noite

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As denúncias feitas pelo o ex-presidente da Americanas Sérgio Rial a respeito das “_inconsistências contábeis_” nas contas da varejista, descobertas apenas dez dias depois de assumir o cargo, trouxeram à tona, além do escândalo, a desconfiança sobre a possível responsabilidade de integrantes do conselho de administração e dos altos executivos ligados à companhia ao longo dos últimos anos.

No dia seguinte ao pedido de recuperação judicial, a principal pergunta feita por interlocutores do mercado financeiro era se o alto escalão da empresa sabia do **rombo bilionário** e foi conivente com a situação, o que apontaria para um possível caso de fraude nos balanços da varejista.

Mas, afinal, era possível que os executivos e investidores de referência das Americanas, como Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira – que lideram o fundo de investimentos 3G Capital -, soubessem do problema antes mesmo de ele ser denunciado por Rial?

Conforme apurou a reportagem com fontes do mercado financeiro, a desconfiança em relação aos executivos da Americanas acabou sendo agravada diante das notícias de que membros da diretoria da empresa teriam vendido quantias expressivas em ações pouco tempo antes de o caso ser divulgado por Rial. Para um executivo do setor, que pediu para não ser identificado, se a direção da Americanas não sabia, tinha “_uma grande desconfiança_” sobre o buraco no balanço.

Apesar de não serem taxativos em acusar os executivos de fraude, os especialistas em governança e nomes do mercado financeiro ouvidos pela reportagem concordam ao dizer que, dificilmente, um rombo dessa magnitude passaria despercebido pelos gestores ou pelas empresas de auditorias, ambos com livre acesso aos dados.

Na avaliação de Fernando Ferrer, analista da Empiricus Research, as inconsistências contábeis podem ter passado despercebidas pelos analistas que acompanham o desempenho da companhia uma vez que os relatórios de desempenho enviados ao mercado não trazem todas as operações, mas sim um resumo das atividades financeiras “_Sem acesso a todos os números, para nós, os balanços apontavam apenas que a empresa queimava muito o seu caixa_”, diz.

**Como o rombo desapareceu do balanço?**

Além dos questionamentos sobre se houve ou não omissão da companhia e da PwC – empresa que auditou os últimos balanços da varejista -, outra dúvida recorrente quando o assunto é o rombo que supera R$ 40 bilhões na Americanas é de **como essas dívidas teriam sido omitidas dentro dos relatórios** e passado despercebidas por inúmeros gestores.

O analista da Empiricus diz que, ao discriminar os seus passivos no balanço – termo utilizado para descrever itens como dívidas e operações de crédito -, a varejistas não estaria reportando o valor total da sua dívida envolvendo as operações de risco sacado, apenas o montante relativo aos juros.

“_Simplificando muito, é como se a Americanas comprasse uma TV através do crédito de risco sacado, mas não colocasse o custo total desse ‘empréstimo’ na sua tabela de passivos, apenas o valor do juros, sem falar o preço pago pela TV_”, diz. “_Assim, o endividamento real da empresa não aparecia._”

Ferres acredita que o escândalo envolvendo as Americanas pode ter um “lado positivo” para os investidores porque, de agora em diante, as casas de análises cobrarão das companhias por mais transparência nas suas demonstrações de resultado.

“_O mercado vai passar a exigir novas formas de reportar essas informações. Eu mesmo entrei em contato com todas as empresas que eu acompanho pedindo mais informações sobre possíveis operações de risco sacado feitas por elas_”, afirma.

Se, de um lado, alguns analistas não descartam a possibilidade de fraudes contábeis, de outro, alguns investidores já apontam que o alto comando da companhia tinha conhecimento dos problemas antes mesmo de Sérgio Rial assumir o controle do negócio.

“_Parece que o Rial entrou na empresa sabendo que havia um problema. A Americanas deve fazer a triangulação com o Santander. Talvez ele já soubesse e constatou o problema quando assumiu o cargo_”, diz Marcello Marin, diretor financeiro da empresa de contabilidade e gestão Spot Finanças.

Há quem seja mais taxativo em relação à hipótese de fraude. É o caso do advogado Daniel Gerber, que representa um grupo de acionistas minoritários da Americanas. “_Acreditar que foi desatenção é como acreditar em Papai Noel_”, afirma.

Segundo ele, o rombo nas finanças da varejista não foi um acidente, mas sim o que chamou de “_uma ação orquestrada durante anos_”. O advogado informou que **os acionistas minoritários da Americanas querem responsabilizar criminalmente a consultoria PwC, que auditou o último balanço financeiro da varejista, além de pedir o afastamento dos três acionistas de referência da companhia e de qualquer empresa com capital aberto**.