Redação GPS **Enquanto Kevin McCarthy recebia os cumprimentos do Democrata Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, pela eleição à presidência da Câmara**, na madrugada deste sábado (7), um colega do Partido Republicano preocupava-se em salvar a própria pele. Se a batalha de McCarthy foi árdua, após quatro dias de votações, **a de George Santos, filho de imigrantes brasileiros, promete ser ainda pior**.
Eleito pelo terceiro distrito de Nova York **o deputado viu, nos últimos dias, as inúmeras mentiras da sua biografia virem à tona, junto com uma investigação federal sobre suas finanças**. Além disso, uma **antiga acusação de uso de cheque roubado em compras feitas no Brasil** surgiu no meio do furacão.
George Santos se define como **“filho de imigrantes, nascido e criado em Jackson Heights, Queens”. Seus pais vieram do Brasil “em busca do sonho americano”**. Por isso, “o primeiro republicano abertamente gay” seria a voz dos necessitados, **por conta do seu “longo caminho para o sucesso”**, que teria atividades como “importação e exportação, atendimento ao cliente, hospitalidade corporativa e uma carreira no mercado de capitais”.
**Boa parte do seu currículo é mentirosa**. A começar pela alegação de que seus avós sobreviveram ao Holocausto – ele dizia que eles **”fugiram da perseguição aos judeus na Ucrânia, se estabeleceram na Bélgica e novamente escaparam durante a Segunda Guerra Mundial”** antes de se estabelecerem no Brasil.
A lista das mentiras é longa: **ele nunca trabalhou para o Citigroup e o Goldman Sachs**, e já reconheceu isso. **Também não se formou em nenhuma faculdade ou universidade**, apesar de ter dito que se formou no Baruch College e na New York University. **E não foi forçado a deixar uma escola particular quando a crise econômica atingiu sua família**. Por fim, **a família de sua mãe nunca “fugiu do socialismo” na Europa** ao se mudar para o Brasil.
**”Fofura política” e golpe no Brasil**
**George Santos já se desculpou pelas mentiras, mas alegou que só colocou “um pouco de fofura” no currículo**. Algo que não fez com um caso no Brasil. **Em 2008, ele pagou a compra de quase R$ 5 mil em roupas com dois cheques de um idoso que já havia morrido*8, além de usar endereços frios e, quando descoberto, fazer promessas nunca cumpridas de ressarcimento. O caso ocorreu uma loja de Niterói, no Rio de Janeiro.
**A origem das folhas de cheque é assombrosa**. A mãe de George Santos, Fátima Alzira Horta Devolder, disse à polícia, em 2008, que **o talão era de um idoso que morrera dois anos antes** e para quem trabalhava. Ela havia ficado de devolver os cheques ao banco, mas não o fez. **Santos, então, os furtou**. Como oficialmente não morava no Brasil, não foi encontrado para ser citado e o caso de estelionato estava fechado desde 2011. Mas **agora foi reaberto pelo Ministério Público do Rio de Janeiro**, depois que George Santos se elegeu deputado pelo distrito que representa Long Island, derrotando um importante político democrata.
Na época da compra com cheques furtados, antes de levar o caso à polícia, **o então gerente da loja, Bruno Simões, tentou de tudo para cobrar o prejuízo de Santos**, que vivia na favela de Santa Rosa, em Niterói. O crime foi admitido pelo próprio acusado e levou a um processo por estelionato. “A loja descontou do meu salário durante quatro ou cinco meses. Hoje sei que essa prática é ilegal, mas na época não sabia”, disse ele. **”Pagou com dois cheques. Sabe quando você tem uma intuição, mas não quer constranger a pessoa?** Pouco depois de ele ir embora, fui olhar e vi que tinha caído num golpe. Os cheques não eram dele”, lembra.
Ao perceber que havia sido vítima de estelionato, **Simões foi aos endereços informados por Santos, mas ninguém o conhecia**. No dia seguinte, uma pessoa chegou à loja querendo trocar um tênis. **“Quando abri a caixa, vi que era o par que o ‘Délio’ tinha comprado.** Achei melhor não comentar nada, troquei o tênis e segui esse rapaz. Quando o confrontei, ele disse que não sabia de nada, mas foi aí que descobri que o nome do golpista era George Antony”, lembra.
A partir daí, Simões prosseguiu com suas buscas. *8Encontrou o perfil de George no Orkut.** Entrou em contato com o cliente, que **admitiu ter “pisado na bola” e prometeu fazer o ressarcimento, o que nunca aconteceu**. Simões foi à delegacia, mas a inspetora disse que a área onde Santos morava, na favela Santa Rosa, era de risco e ela não poderia ir até lá de imediato. **Ele, então, decidiu ir ao local, mas não conseguiu falar com ninguém**. Dias depois, os policiais foram até o endereço e intimaram a mãe de Santos a prestar depoimento.
Após o inquérito, **George Anthony Devolder Santos foi denunciado pelo Ministério Público do Rio pelo crime de estelionato**. Sua prisão chegou a ser pedida, mas foi negada. O processo contra Santos foi suspenso anos depois porque a Justiça nunca conseguiu localizar seu paradeiro. **Com a eleição, o processo foi reaberto**. Na última semana, o MPRJ informou que vai pedir à promotoria de Nova York que cite o deputado eleito. Se ele não comparecer, será julgado à revelia.
**Mais de 14 anos após ser vítima do golpe, Simões diz ter poucas esperanças de reaver seu dinheiro, e desejou “sorte” a Santos**. “Ele vai precisar. Se eu, que fui vítima de um golpe, fiz de tudo para encontrá-lo, imagina o que os milhares de eleitores dele que foram enganados não devem estar fazendo agora”, diz. “Sei o que eles estão sentindo.”
**Situação política complicada**
Além das mentiras e do estelionato niteroiense, **também é questionável o motivo dos empréstimos feitos por George Santos, que superam os US$ 700 mil**, para a própria campanha de 2022, o que suscitou uma investigação federal. **Os relatórios do escritório do procurador dos EUA no Distrito Leste de Nova York já mostram gastos incomuns, especialmente com passagens aéreas e hotéis**, segundo reportagem do New York Times.
A campanha de Santos pagou US$ 11 mil a uma empresa de limpeza pelo “aluguel de apartamentos para funcionários”, além de uma série de desembolsos fixados em US$ 199,99 – **exatamente um centavo abaixo do limite em que os recibos são exigidos por lei federal**. Os gastos também incluem US$ 40 mil para viagens aéreas, valor que, segundo o jornal, **”se assemelha aos arquivos de campanha de líderes partidários no Congresso, em oposição a um congressista recém-eleito que ainda está se apresentando aos eleitores locais”*.
**Alguns democratas pediram a Santos que se afastasse. Republicanos também o repreenderam** e um de seus colegas da Câmara de Nova York pediu que ele enfrentasse uma investigação ética. Já Kevin McCarthy se esquivou de perguntas sobre o deputado. Um legislador republicano veterano, **o deputado Kevin Brady, do Texas, disse que Santos “certamente terá que considerar a possibilidade de renúncia”**, após as revelações. E pelo menos dois democratas – os deputados Joaquin Castro, do Texas, e Ted Lieu, da Califórnia – pediram que Santos fosse expulso do Congresso se ele não renunciasse.
**A Câmara tem o poder, segundo a Constituição Norte-americaba, de expulsar qualquer membro com dois terços dos votos**, mas isso é extremamente raro e apenas cinco legisladores foram expulsos na história dos Estados Unidos. **(com Agência Estado)**
