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Saúde e nutrição com Clayton Camargos: 100 anos de vida

Blue Zones ou em português “Zonas Azuis” são áreas geográficas com taxas mais baixas de doenças crônicas não transmissíveis e maior expectativa de vida. Dieta, jejum e exercícios físicos regulares são fatores associados às Zonas Azuis. O termo foi usado pela primeira vez pelo gerontólogo Dan Buettner, que estuda as áreas do mundo onde as pessoas vivem vidas extraordinariamente longas.

Elas são chamadas de Zonas Azuis porque, quando Buettner e seus colegas procuravam essas áreas, desenharam círculos azuis ao redor delas em um mapa. Em seu livro chamado The Blue Zones, o pesquisador descreveu as seguintes localidades;

  • Icária (Grécia): é uma ilha onde as pessoas seguem uma dieta mediterrânea rica em azeite, vinho tinto e vegetais cultivados localmente.
  • Ogliastra, Sardenha (Itália): é o lar de alguns dos homens mais velhos do mundo. Eles vivem em regiões montanhosas onde normalmente trabalham em fazendas e bebem muito vinho tinto.
  • Okinawa (Japão): é a residência das mulheres mais velhas do mundo, que comem muitos alimentos à base de soja e praticam Tai Chi Chuan.
  • Península de Nicoya (Costa Rica): a dieta de seus habitantes é baseada em feijão e tortilhas de milho. As pessoas desta área realizam regularmente trabalhos físicos até à velhice e têm um sentido de propósito conhecido como “plano de vida”.
  • Os Adventistas do Sétimo Dia em Loma Linda, Califórnia (EUA): são um grupo de pessoas muito religioso, com grande sentimento de comunidade e vegetariano estrito.

Embora estas sejam as áreas discutidas no livro de Buettner, existem outras não identificadas no mundo que também podem ser Zonas Azuis. Vários estudos mostram que essas localidades apresentam concentrações relevantes de nonagenários e centenários. Clique aqui para acessar o estudo.

Curiosamente, a genética provavelmente representa apenas 20-30% da longevidade. Portanto, as influências ambientais, incluindo dieta e estilo de vida, desempenham um papel importante na determinação da expectativa de vida. Clique aqui para acessar o estudo.

As pessoas que vivem nas Zonas Azuis têm uma dieta repleta de alimentos vegetais integrais. Um ponto comum é que seus habitantes consomem principalmente uma alimentação 95% baseada em vegetais. Embora a maioria dos grupos não sejam vegetarianos estritos, eles tendem a comer carne de vaca apenas cinco vezes por mês.

Vários estudos, incluindo um com mais de meio milhão de pessoas, demonstraram que evitar carne vermelha e processada pode reduzir significativamente o risco de morte por doenças cardíacas e câncer. Clique aqui para acessar o estudo.

Foto: Unsplash

As dietas nas Zonas Azuis são normalmente ricas em:

  • Vegetais: são uma ótima fonte de fibras e muitas vitaminas e minerais diferentes. Comer mais de cinco porções por dia pode reduzir significativamente o risco de doenças cardíacas e câncer.
  • Leguminosas: incluem feijão, ervilha, lentilha e grão de bico, e todas são ricas em fibras e proteínas. Vários estudos demonstraram que o consumo de leguminosas está associado a uma menor mortalidade.
  • Grãos integrais: também são ricos em fibras. Uma alta ingestão pode reduzir a pressão arterial e está associada à redução do câncer colorretal e à morte por doenças cardíacas.
  • Oleaginosas: as castanhas são ótimas fontes de fibras, proteínas e gorduras poli e monoinsaturadas. Combinados com uma dieta saudável, estão associados à redução da mortalidade e podem até ajudar a reverter a síndrome metabólica.

Existem alguns outros fatores dietéticos que definem cada uma das Zonas Azuis. Por exemplo, o peixe é frequentemente consumido em Icária e na Sardenha. É uma boa fonte de gorduras do tipo ômega-3 importantes para a saúde do coração e do cérebro. Sua ingestão está associada ao declínio cerebral mais lento na velhice e à redução de doenças cardíacas.

Outros hábitos comuns às Zonas Azuis são a redução da ingestão calórica e o jejum. A restrição energética a longo prazo pode ajudar na longevidade.

Um grande estudo de 25 anos em macacos descobriu que comer 30% menos calorias do que o normal levou a uma vida significativamente mais longa. O déficit calórico pode estar contribuindo para vidas mais longas em algumas das Zonas Azuis. Clique aqui para acessar o estudo.

Por exemplo, os habitantes de Okinawa tendem a seguir a regra dos 80%, que chamam de “hara hachi bu”. Isso significa que eles param de comer quando se sentem 80% em vez de 100% saciados. Vários estudos também demonstraram que comer devagar pode reduzir a fome e aumentar a sensação de saciedade, em comparação com comer rapidamente.

Isso pode ocorrer porque os hormônios que fazem você se sentir saciado só atingem seus níveis sanguíneos máximos 20 minutos depois de comer. Portanto, comendo devagar e somente até se sentir 80% satisfeito, você poderá ingerir menos calorias e se sentir saciado por mais tempo. Outra parte importante do plano alimentar da Zona Azul é fazer a menor refeição no final da tarde ou início da noite e depois não comer durante o resto do dia.

Um fator dietético comum a muitas das Zonas Azuis é o consumo moderado de álcool. Existem evidências mistas sobre se sua ingestão parcimoniosa reduz o risco de morte. Muitos estudos demonstraram que beber uma a duas doses de bebidas alcoólicas por dia pode reduzir significativamente a mortalidade, particularmente por doenças cardíacas.

No entanto, investigações divergentes registram que não há efeito real quando se levam em consideração outros fatores de estilo de vida. O efeito benéfico do consumo moderado de álcool pode depender do tipo de bebida. O vinho tinto pode ser o melhor tipo, visto que contém vários antioxidantes provenientes da uva. Clique aqui para acessar o estudo.

Foto: Unsplash

Consumir um a dois copos de vinho tinto por dia é particularmente comum em Icária e Sardenha. Na verdade, o vinho Cannonau da Sardenha, feito a partir de uvas Grenache, demonstrou ter níveis extremamente elevados de antioxidantes, em comparação com seus pares. Esses ativos ajudam a prevenir danos ao DNA que podem contribuir para o envelhecimento. Portanto, podem ser importantes para a longevidade.

Alguns estudos mostraram que beber quantidades moderadas de vinho tinto está associado a uma vida um pouco mais longa. No entanto, tal como acontece com outros pesquisas sobre o consumo de álcool, não está claro se este efeito se deve ao fato de os bebedores de vinho também tenderem a portar estilos de vida mais saudáveis.

Outras investigações mostraram que pessoas que beberam um copo de vinho de 150 ml todos os dias durante seis meses a dois anos tiveram pressão arterial significativamente mais baixa, menor nível de açúcar no sangue, mais colesterol “bom” e melhor qualidade do sono. Clique aqui para acessar o estudo.

É importante notar que esses benefícios só são observados na ingestão moderada de álcool. Na verdade, cada um desses estudos também mostrou que níveis mais elevados de consumo aumentam o risco de morte. Cabe destacar que os indivíduos pesquisados tinham o exercício físico regular incorporado à vida diária.

Além da dieta, o exercício físico é outro fator extremamente importante para o envelhecimento bem-sucedido. Nas Zonas Azuis, as pessoas não se exercitam propositalmente indo à academia. Em vez disso, está integrado na sua vida cotidiana por meio da jardinagem, das caminhadas, da cozinha e de outras tarefas diárias.

Um estudo realizado com homens na Zona Azul da Sardenha mostrou que a sua vida mais longa estava associada à criação de animais de criação, à vida em encostas mais íngremes das montanhas e à caminhada de distâncias maiores para o trabalho. Os benefícios destas atividades habituais foram demonstrados anteriormente numa investigação com mais de 13.000 indivíduos.

A distância que percorreram ou as quantidades de escadas que subiram todos os dias previram quanto tempo viveriam. Outras pesquisas demonstraram os benefícios do exercício na redução do risco de câncer, doenças cardíacas e morte em geral. Clique aqui para acessar o estudo.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as diretrizes para atividade física recomendam, por semana, um mínimo de 75 minutos de movimentação aeróbia vigorosa ou 150 minutos de intensidade moderada. Um grande estudo que incluiu mais de 600.000 pessoas mostrou que aqueles que praticavam a quantidade recomendada de exercício tinham um risco 20% menor de morte do que aqueles que não praticavam atividade física. Clique aqui para acessar o estudo.

Além dos exercícios, descansar adequadamente e ter uma boa noite de sono também parecem ser muito importantes para uma vida longa e saudável. Os habitantes das Zonas Azuis dormem o suficiente e também costumam tirar sonecas durante o dia.

Vários estudos revelaram que não dormir o suficiente ou dormir demais pode aumentar significativamente o risco de morte, inclusive por doença cardíaca ou acidente vascular cerebral. Uma grande análise de 35 estudos mostrou que sete horas era a duração ideal do sono. Dormir muito menos ou muito mais do que isso foi associado a um risco aumentado de morte. Clique aqui para acessar o estudo.

Nas Zonas Azuis, as pessoas tendem a não dormir, acordar ou trabalhar em horários determinados. Eles simplesmente dormem tanto quanto seu corpo manda. Em Icária e Sardenha, a sesta diurna também é comum. Vários estudos demonstraram que as sestas diurnas, conhecidas em muitos países mediterrâneos como “siestas”, não têm efeito negativo nos riscos que envolvem as doenças cardíacas, e podem até reduzi-los.

No entanto, a duração do cochilo parece ser muito importante. Cochilos de 30 minutos ou menos podem ser benéficos, mas qualquer período superior a meia hora está associado a um risco aumentado de doenças cardíacas e morte. Clique aqui para acessar o estudo.

Além da alimentação, do exercício e do descanso, uma série de outros motores sociais e de estilo de vida são comuns às Zonas Azuis e podem contribuir à longevidade das pessoas que ali vivem. Esses incluem:

  • Ser religioso (espiritualidade): as Zonas Azuis são comunidades tipicamente religiosas. Vários estudos mostraram que ser religioso está associado a um menor risco de morte. Isto pode ser devido ao apoio social e à redução das taxas de depressão.
  • Ter um propósito de vida: os habitantes das Zonas Azuis tendem a ter uma meta de vida, conhecido como “ikigai” em Okinawa ou “plano de vida” em Nicoya. Isto está associado a um risco reduzido de morte, possivelmente por meio do bem-estar psicológico.
  • Pessoas mais velhas e mais jovens que vivem juntas: em muitas Zonas Azuis, os avós vivem frequentemente com as suas famílias. Estudos demonstraram que os avós que cuidam dos netos apresentam menor risco de morte.
  • Uma rede social saudável: sua rede social, chamada “moai” em Okinawa, pode afetar sua saúde. Por exemplo, se os seus amigos são obesos, você corre um risco maior de ser obeso, possivelmente devido à aceitação social do ganho de peso.

As regiões das Zonas Azuis abrigam algumas das pessoas mais velhas e saudáveis do mundo. Embora os seus estilos de vida sejam ligeiramente diferentes, a maioria segue uma dieta baseada em vegetais, pratica exercício físico regularmente, bebe quantidades moderadas de álcool, dorme o suficiente e tem boas redes espirituais, familiares e sociais. Está demonstrado que cada um desses motores está associado a uma vida mais longa. Quando incorporados ao estilo de vida, pode ser sim possível acrescentar alguns anos com qualidade à sua trajetória terrena.

Se quiser conhecer mais sobre o assunto, além do retro comentado livro do Buettner, recomendo o documentário da Netflix com mesmo título. Clique aqui para assisti-lo:

Você tem alguma dúvida sobre saúde, alimentação e nutrição? Envie um e-mail para dr.clayton@metafisicos.com.br e poderei responder sua pergunta em uma coluna futura.

Foto: Arquivo pessoal

*Clayton Camargos é sanitarista pós graduado pela Escola Nacional de Saúde Pública – ENSP/Fiocruz. Desde 2002, ex gerente da Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC) do Ministério da Saúde. Subsecretário de Planejamento em Saúde (SUPLAN) da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES-DF). Consultor técnico para Coordenação-Geral de Fomento à Pesquisa Em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde. Coordenador Nacional de Promoção da Saúde (COPROM) da Diretoria de Serviços (DISER) da Fundação de Seguridade Social. Docente das graduações de Medicina, Nutrição e Educação Física, e coordenador dos estágios supervisionados em nutrição clínica e em nutrição esportiva do Departamento de Nutrição, e diretor do curso sequencial de Vigilância Sanitária da Universidade Católica de Brasília (UCB). Atualmente é proprietário da clínica Metafísicos.

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