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Chupetas para adultos viram tendência e chegam ao Brasil via TikTok

Especialista explica sobre o comportamento considerado inusitado que surgiu na China e se espalhou pelos Estados Unidos

O que antes era um objeto exclusivo do universo infantil agora ganha um novo público, os adultos. A tendência, que começou na China, se espalhou pelos Estados Unidos e começa a aparecer no Brasil, consiste no uso de chupetas anatômicas para aliviar estresse, ansiedade e até auxiliar no sono. O fenômeno viralizou no TikTok, onde vídeos mostram pessoas usando o acessório em ambientes de trabalho, no trânsito, durante os estudos e até mesmo em momentos de descanso.

Vendidas em plataformas de e-commerce internacionais, as chupetas para adultos custam entre dez yuans (cerca de R$ 7) e 500 yuans (R$ 380) nos modelos mais sofisticados, alguns personalizados. No Brasil, versões semelhantes já são comercializadas por valores que variam de R$ 5 a R$ 300.

Entre os adeptos, não faltam relatos que associam o hábito a sensações de conforto e segurança emocional, muitas vezes vinculadas à infância. “Quando estou sob pressão no trabalho, sinto uma sensação de segurança que vem da infância”, contou um consumidor chinês ao South China Morning Post

Mas a moda divide opiniões. Nos comentários das redes, há quem sugira alternativas como chicletes ou pirulitos, enquanto outros ironizam o fenômeno com referências a Sigmund Freud, que propôs que a mente é dividida em consciente e inconsciente, sendo este último um reservatório de desejos, memórias e impulsos reprimidos que afetam a vida consciente. 

Especialista fala sobre o que pode estar motivando adultos a usarem chupetas

O GPS|Brasília conversou com um especialista que explica o fenômeno e alerta para possíveis impactos na saúde. Segundo Eduardo Rocha, cientista do comportamento, o uso de chupetas por adultos como forma de aliviar estresse e ansiedade está ligado a um mecanismo de autorregulação emocional que, em alguns casos, remete à infância.

“Esse é um comportamento comum quando o adulto quer se autorregular, especialmente quando não desenvolveu internamente esse mecanismo”, afirma Rocha. Ele explica que, na ausência de estratégias internas, a pessoa busca objetos que proporcionem conforto e estabilidade emocional. “É muito comum em crianças atípicas, como autistas, que usam comportamentos que podem parecer disfuncionais para os outros, mas que são funcionais para elas”.

O especialista observa que o uso de chupetas por adultos pode ser visto como uma forma de regressão emocional, mas não necessariamente negativa. “O cérebro busca na memória momentos em que a pessoa se sentia mais confortável. Muitas vezes, isso remete à fase oral, associada ao acolhimento dos pais. Nesse sentido, é um recurso para lidar com a ausência de uma estratégia interna de regulação”, explica.

Do ponto de vista psicológico, Rocha lembra que o tema já foi abordado na psicanálise por Donald Winnicott, que associava esses objetos à busca por suprir necessidades emocionais na infância. “Se a criança não recebeu conforto de alguém, transferia isso para objetos que ajudavam a manter o equilíbrio emocional. O sistema nervoso está sempre buscando esse estado de equilíbrio”, comenta.

O comportamento, segundo ele, é comparável a outros hábitos de conforto, como roer unhas, usar cobertores, mascotes ou até dispositivos eletrônicos. “O mecanismo é basicamente o mesmo. Chamamos esses objetos de âncoras, porque são processos condicionados que nos habituamos a usar para chegar a um estado emocional desejado”, explica.

O alerta vem quando o hábito se transforma em dependência. “O sinal vermelho aparece quando a pessoa percebe que não consegue se regular sem o objeto e que isso começa a trazer prejuízos para a saúde ou a vida social. Nesse caso, é preciso intervenção e, muitas vezes, substituir por outras estratégias”, diz Rocha.

Sobre como familiares e amigos podem lidar com o hábito sem julgamento, o especialista reconhece que a questão é delicada. “Existe o preconceito de que o adulto que mantém vínculos emocionais com objetos infantis é infantilizado. É preciso oferecer apoio e sugerir alternativas que não tenham impacto social tão marcante, como sair com uma chupeta na boca”, orienta.

Entre as alternativas saudáveis, Rocha cita práticas como mindfulness, meditação, esportes e atividades físicas regulares. “Atividades como jiu-jitsu, corrida, natação ou até correr no frio ajudam o corpo a se autorregular. Isso treina o organismo para lidar melhor com mudanças e estresses do ambiente”, recomenda.

Embora não exista diagnóstico que associe diretamente o uso de chupeta por adultos a transtornos específicos, Rocha afirma que pessoas neurodiversas podem ter mais propensão a recorrer a objetos para autorregulação. “Pode estar ligado a momentos de pouco recurso emocional para lidar com o estresse, e não a uma condição específica”, diz.

Ele destaca que ainda há poucos estudos sobre o tema, mas a terapia cognitivo-comportamental já desenvolve práticas para ampliar os recursos internos de autorregulação. “É um comportamento regressivo, mas que tem um objetivo claro: buscar conforto. O desafio é oferecer à pessoa outras formas de alcançá-lo sem depender de padrões infantis que possam prejudicar sua vida social”, conclui.

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Edição 42

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