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Artigo: empregabilidade da população negra: desafios, avanços e políticas públicas no Brasil

Brasil ainda convive com profundas desigualdades raciais no mercado de trabalho

No dia 3 de julho de 1951, o Brasil deu um passo inédito ao sancionar a Lei Afonso Arinos, que passou a proibir a discriminação racial em locais públicos. Embora tímida e de aplicação limitada, essa foi a primeira legislação brasileira que reconheceu o racismo como uma prática a ser combatida pelo Estado. Mais de 70 anos depois, celebramos a importância simbólica desse marco, mas também enfrentamos a dura realidade de que o racismo continua estruturando as desigualdades do País. E poucas áreas escancaram essa desigualdade tanto quanto o mercado de trabalho.

A maioria é negra, mas não está no topo

Vivemos em um País onde 56% da população se autodeclara preta ou parda, segundo o Censo de 2022. No entanto, essa maioria populacional não se reflete nas oportunidades. Os dados são contundentes: pessoas negras recebem, em média, 39% a menos do que pessoas brancas. Ocupam apenas um terço dos cargos de chefia e enfrentam taxas de desemprego significativamente maiores, especialmente quando falamos de mulheres negras, que são, em geral, as últimas a serem contratadas e as primeiras a serem demitidas. Mais de 60% da população negra vive com até um salário mínimo. Entre os brasileiros em extrema pobreza, 75% são negros.

Essa realidade não revela falta de esforço, talento ou preparo. Revela, sim, um país onde as oportunidades continuam sendo negadas por causa da cor da pele. É nesse cenário que o combate ao racismo precisa deixar de ser um discurso genérico e se tornar política pública efetiva – especialmente no que diz respeito à empregabilidade da população negra.

Políticas públicas que saíram do papel

Durante minha gestão como secretário Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, tive a honra de liderar ações que buscaram enfrentar essas desigualdades de forma concreta. Reformulamos o Juventude Viva, focando na criação de oportunidades para jovens negros em territórios vulneráveis. Lançamos a campanha “O SUS Está de Braços Abertos para a Saúde da População Negra”, em parceria com o Ministério da Saúde, conscientizando sobre o racismo institucional como determinante social de saúde.

Distribuímos o Kit de Promoção da Igualdade Racial, com veículos adaptados para conselhos e órgãos de igualdade racial atenderem comunidades quilombolas em regiões de difícil acesso, fortalecendo a presença do Estado onde ele quase nunca chega. Também assinamos o Decreto 9.427/2018, que reservou 30% das vagas de estágio no serviço público federal para estudantes negros, e a Portaria Normativa nº 4/2018, que regulamenta o procedimento de heteroidentificação complementar à autodeclaração nos concursos públicos.

Além disso, tornamos obrigatório o registro do quesito raça/cor nos sistemas de informação do SUS e do SUAS, medida fundamental para formular políticas públicas baseadas em dados reais. Criamos o Selo da Igualdade Racial, certificando empresas comprometidas com a diversidade. Fortalecemos o Sinapir (Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial) e firmamos acordos internacionais com países africanos e organismos multilaterais, promovendo o intercâmbio de experiências e reconhecendo a cultura afro-brasileira como parte essencial da identidade nacional.

Mais do que discurso: oportunidades reais

Todas essas iniciativas apontam para o mesmo caminho: o combate ao racismo passa necessariamente pela criação de condições reais para que a população negra tenha acesso a empregos dignos, salários justos e possibilidades de crescimento. Ou seja, é preciso gerar renda, promover qualificação, garantir representatividade e corrigir distorções históricas. Isso não se faz apenas com boas intenções. Exige orçamento, planejamento e compromisso político.

Justiça não é favor – é dever

Neste 3 de julho, mais do que lembrar uma data, precisamos reafirmar o compromisso com um Brasil que não aceite mais a exclusão como regra. Não se trata de vitimismo. Trata-se de justiça. Um país só será verdadeiramente democrático quando a cor da pele não determinar o destino de ninguém. Que os negros possam acessar todas as oportunidades não por concessão, mas por direito. E que os não negros se juntem a essa luta não como favor, mas como dever coletivo.

Sem inclusão racial, não há desenvolvimento

O combate ao racismo, sobretudo em sua dimensão estrutural, é uma tarefa nacional. Não haverá desenvolvimento justo, sustentável ou duradouro se continuarmos negligenciando a maioria da população. A construção de um Brasil mais igual começa pela valorização de todas as vidas – e isso passa, inevitavelmente, pela empregabilidade da população negra.

Por Juvenal Araújo, subsecretário de Direitos Humanos e Igualdade Racial da Secretaria de Justiça e Cidadania do Distrito Federal. Foi titular da Secretaria Nacional de Promoção da Igualdade Racial, da Secretaria Nacional de Políticas para Comunidades Tradicionais, da Secretaria Nacional de Políticas de Ações Afirmativas, da Presidência Pro Tempore do Brasil, na IV Reunião de Altas Autoridades sobre os Direitos dos Afrodescendentes (RAFRO).

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