O nome de Brasília está inextricavelmente conectado à uma arquitetura opulenta, moderna e especialmente atemporal. Quando falamos em design de produtos, isso não é diferente. A própria atmosfera da cidade sempre inspirou diversos criadores a produzir verdadeiras obras de arte utilitárias.
Recentemente, três nomes têm ganhado o coração dos brasilienses quando o assunto é inventividade. Felipe Zorzeto, Lucas Caramés e Will Pedrosa traduzem em mobiliários e objetos de decoração identidade autêntica, que mescla influências regionais e traços contemporâneos.
No trabalho de Lucas Caramés, a busca por um design que resgate memórias e culturas é visível na harmonização entre influências modernistas da capital e elementos de sua terra natal, a Bahia.
O designer de mobiliário e arquiteto, nascido em Salvador, sempre foi incentivado pelos pais a exercitar a imaginação e a criatividade. Na adolescência, sua paixão pelo desenho se desenvolveu a partir do fascínio pelo universo dos quadrinhos. Foi nessa época, aos 17 anos, que desembarcou em Brasília com o intuito de estudar arquitetura. “Devo muito da minha trajetória por tudo o que a arquitetura me fez entender, estudar e vivenciar. O design tem o papel de investigação, entendimento do cotidiano, do social e da filosofia da vida, então é um aprendizado constante”.
A trajetória no design de mobiliário teve início em 2018, quando participou de um curso de extensão na Itália, onde projetou sua primeira cadeira e uma estante de livros. Com o tempo, as características modernistas de Brasília e a forte influência da cultura baiana serviram de inspiração para o DNA do Studio Caramés. A mesa de centro Fachadas é um dos seus principais trabalhos, porque incorpora uma representação excelente e sem pieguice dos edifícios modernistas brasilienses com freijó natural imitando os célebres cobogós.

Foto: cortesia/Larissa Sad
Outro destaque é a Poltrona Poty, apresentada na Semana de Design de Milão, em 2024. Inspirada na cultura artesanal do Delta do Parnaíba, a peça é envolta por uma trama de palha de carnaúba, conferindo aconchego e identidade única ao design. O portfólio atual de Lucas tem cerca de 35 peças diversas, entre mesas, poltronas, puffs, cadeiras, bancos, cabideiros, tapetes e até espelhos.
Nos últimos três anos, integrou o grupo de designers expositores da Mostra Casa Brasil NY, Brasil in Natura Terra Adentro e também do acervo permanente do Museu de Arte de Brasília – MAB, com a mesa de centro Fachadas. Nos anos de 2023 e 2024, levou os prêmios SIT Award na categoria Armchair e como Furniture Design of The Year. “Meu intuito é construir um legado, não apenas para mim, mas para que outros designers também encontrem suas trajetórias nesse processo de autoconhecimento, ajudando a consolidar uma nova identidade para o design brasiliense.”
A funcionalidade e o minimalismo são características marcantes no trabalho do brasiliense Will Pedrosa. A partir de uma necessidade pessoal, o designer descobriu sua paixão por criar objetos que equilibram estética e praticidade. A Bowa nasceu de forma despretensiosa. O designer trabalhava no Ministério da Educação quando, certo dia, perdeu sua carteira. Descontente com os estilos que existiam no mercado, decidiu criar uma versão mais estilizada e que ocupasse o mínimo de volume no bolso.
Sem experiência prévia com couro, comprou um retalho do material e, de maneira intuitiva, desenvolveu o protótipo da Bold W, carteira que se tornou o carro-chefe da marca. “Não havia curso e nenhum conteúdo na internet. Foi tentativa e erro. As pessoas que tinham acesso à carteira, viam e pediam uma igual”, relembra o designer que com o sucesso da empreitada virou professor e criou o Curso Completo do Couro, projetado on-line para iniciantes e entusiastas do artesanato.
Além da carteira, a Bowa também se destaca na produção de bowls de couro costurados manualmente. Essas peças de home decor, disponíveis em diversos tamanhos e formatos, aliam sofisticação e identidade artesanal. A coleção da marca ainda conta com cintos, porta passaportes e necessaires, sendo os bonés em tecido suede os únicos que fogem da utilização do couro como matéria-prima. O artista relembra que o olhar para formas, texturas e combinações de cores vieram do avô materno, que pintava quadros e tinha um gosto apurado para móveis de designers. A convivência com o patriarca serviu de aprendizado estratégico, já que além das atividades manuais, Will também desenvolveu um senso de responsabilidade resolutivo para o que viria a se tornar a Bowa.
Atualmente, a sinergia entre Will e sua mulher, Fernanda, tem impulsionado a marca, fortalecendo seu reconhecimento no mercado brasileiro. Além de produzirem as bandeiras de decoração, os porta-copos e outros itens do renomado restaurante Tarso, de Brasília, o Hotel Rosewood São Paulo também conta com itens assinados pela Bowa. “Todos os quartos têm uma peça da Bowa, que é um porta-joias. Também produzimos porta-lenços para uma comitiva de sheiks árabes que o hotel recebeu, pastas de couro, case para baralhos e até um porta guarda-chuvas em couro”, conta.
Um mix entre design prático e funcional, mas ao mesmo tempo acolhedor e criativo, são características que definem a estética singular de Felipe Zorzeto. Nascido em São Paulo, o designer se mudou para Brasília ainda criança. Desde pequeno, encantava-se com a criação de cenários, construindo maquetes e objetos, como aviões e motos. Sua mãe, designer de interiores e paisagista Ândrea Zorzeto, foi sua grande inspiração. “Desde cedo a acompanhava em seus projetos e obras. Em determinado momento, ela transferiu o escritório para nossa casa, e foi ali que passei a vivenciar de perto como surge a concepção das ideias até sua materialização”, conta.
Na adolescência, a curiosidade instigante o fez aprender a usar um software de modelagem, na qual desenhou uma pista de motocross. A partir daí, a paixão pelo universo da criação fez com que ele observasse de forma mais atenta artistas como Lina Bo Bardi, cujo trabalho transita entre a arquitetura e o design de mobiliário. O início da trajetória como designer mostrou como a visão de Felipe é consistente e contemporânea. Um casal de clientes o contratou para desenvolver o projeto de interiores da casa onde moravam e um dos pedidos era um buffet extenso, discreto, mas com personalidade e, acima de tudo, funcional para armazenamento.

Foto: cortesia/Isadora Costa

Foto: cortesia/Julia Totoli
Surge aí o Buffet Palafita, um móvel modular, de desenho simples e ao mesmo tempo expressivo, campeão de vendas e o favorito do designer. “A peça sintetiza minha busca incessante pela simplicidade e pureza no desenho: características que marcam minhas principais referências no modernismo. Além disso, esse projeto resgata meu lado arquiteto, que é a base da minha formação”, diz. Vale lembrar que as produções de Felipe também miram na sustentabilidade, já que o uso de materiais certificados e renováveis também fazem parte do DNA da marca. “Quero que ela se torne uma referência nacional e se expanda internacionalmente, levando a riqueza da herança cultural brasileira para o mundo”.
*Escrita por Edson Caldeira.