Gerar um filho é um momento especial para muitas mulheres, no entanto, cada vez mais, elas estão adiando esse sonho. A maternidade após os 40 anos tem ganhado destaque no Brasil, registrando um crescimento de 16,8% entre 2018 e 2023, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em contrapartida, o levantamento aponta uma redução no número de filhos entre jovens de 10 a 19 anos (-30,8%), seguido por mulheres de 20 a 29 anos (-11,2%) e 30 a 39 anos (-10%).
A tendência é observada também dentro dos consultórios médicos. Segundo a médica ginecologista especialista em reprodução humana Ludmila Bercaire, vivemos um momento em que muitas mulheres priorizam o desenvolvimento pessoal, a estabilidade financeira, a consolidação da carreira antes de considerar a maternidade, a busca por um parceiro ideal e aponta os avanços na tecnologia como um caminho para o planejamento da gravidez tardia.
“Muitas mulheres preferem estar financeiramente seguras e emocionalmente preparadas antes de assumir a responsabilidade de criar um filho. Além disso, o aumento da escolaridade feminina e o ingresso tardio no mercado de trabalho também contribuem para essa escolha”, comenta a médica Ludmila. A médica ginecologista e obstetra Larissa Maciel Ribeiro concorda com os apontamentos da colega de profissão e acrescenta outros pontos. “É possível observar uma mudança cultural. A gente está tendo uma maior aceitação social de uma maternidade tardia e está tendo uma mudança maior desse paradigma”, pontua.
As especialistas explicam que a fertilidade feminina começa a declinar a partir dos 30 anos, com queda mais acentuada após os 35 e ainda mais significativa após os 40. “É importante frisar que cada mulher é única e esses marcos são mais para contextualizar as taxas populacionais. Individualmente, é importante cada mulher conhecer a sua própria reserva ovariana e fazer seu planejamento reprodutivo com base nos seus exames”, destaca a especialista em reprodução humana Ludmila.
Aos 43 anos, a comunicadora e empresária Marina Figueiredo costuma dizer que viveu a maternidade em todas as décadas de sua vida, primeiro aos 15 anos de idade, depois aos 27, aos 37 e aos 40 anos. “Sem dúvidas, os momentos mais impactantes da minha vida foi quando engravidei na adolescência, aos 15 anos e mais velha, aos 40 anos. Eu estava casada, amamentando meu terceiro filho, meu marido era vasectomizado e me vi grávida. Foi uma grande surpresa e realmente desafiou toda a ciência que diz que a possibilidade de uma mulher aos 40 anos engravidar é de 14%”, compartilha Marina sobre a gestação considerada quase improvável.
Para a empresária, a maternidade é uma jornada marcada por transformações a cada nova fase da vida. “A gente muitas vezes acredita que uma gestação anterior vai trazer facilidades, e até traz, mas cada filho é um universo”, reflete. “Cada um tem seu jeitinho, seu DNA, sua personalidade. Desde quando fui mãe aos 15 até agora, aos 40, o sentimento é intenso e único”, declara.

Rafaela, 16, Matheus 28
Marina sempre teve um rotina muito ativa com atividade física e trabalho e mesmo já sendo mãe de outros três filhos, pode vivenciar novas experiências da gestão tardia. “Era inesperado, era impossível. Quando me vi grávida, a ficha demorou cair por alguns meses. Eu me mantive, como nas outras gestações, os 9 meses, enjoando bastante. Hoje em dia, eu consigo ver que aquela gestação era providencial, porque o Miguel, que é como o registrei, é como um anjo enviado por Deus, uma espécie de milagre mesmo”, compartilha Marina.

Miguel 3, Marcelo 5
A advogada e empresária Felícia Borges, de 43 anos, também viveu uma jornada marcada por desafios e milagres na maternidade. Aos 31 anos, após uma gravidez tubária que resultou na perda de uma trompa, ela acreditou que as chances de engravidar seriam mínimas. No entanto, a chegada da primeira filha veio de forma natural. “A maternidade me abriu os olhos para a força do feminino”, afirma.
Aos 37, um novo obstáculo, outra gravidez tubária. Desta vez, a trompa foi preservada, mas os médicos alertaram que uma nova gestação só seria possível por meio de inseminação artificial. “Eu já tinha 37, só uma trompa, a outra debilitada. Achei melhor deixar quieto, mas não foi isso que a vida quis. Estava na pandemia e vivenciei um acontecimento improvável, engravidei naturalmente”, compartilhou a advogada.

Betina, 4 anos
A gestação coloriu a quarentena de Felícia, enquanto o mundo estava parado, ela só pensava na minha barriga crescendo. “A maturidade traz uma doçura única. Estamos mais cansadas, é inevitável. Eu já tenho uma filha mais velha, já tenho uma carga no trabalho de mais responsabilidade, mas a gente sabe que cada segundo vivido é uma gratidão que só quem esperou entende”, revela emocionada.

Clarice, 11 anos
Marina e Felícia estão certas, a maternidade após os 40 anos é um caminho repleto de desafios, como explica a ginecologista Larissa Maciel. “Para aquelas mulheres que desejam adiar a maternidade, as recomendações são manter um estilo de vida saudável, um peso adequado, alimentação balanceada, exercício físico regular, sono de qualidade e controle do estresse”, orienta a especialista.
Além disso, Larissa destaca a importância de um planejamento estratégico para quem deseja ser mãe mais tarde. “Se a paciente quer engravidar mais tarde, deve considerar congelar os óvulos entre 30 e 35 anos. Não é muito interessante deixar para engravidar após os 40 anos. Nesse período, a reserva ovariana já está bastante reduzida e além disso, os riscos aumentam significativamente, aos 40, o risco de aborto espontâneo pode chegar a 50%. E, mesmo que a gravidez ocorra, há mais chances de complicações, como pressão alta e diabetes gestacional”, destaca a obstetra.
Como se preparar para uma gravidez tardia
A preparação para a maternidade após os 35 anos exige um acompanhamento médico cuidadoso e exames específicos, como ressalta a ginecologista Ludmila. “Os principais exames incluem a avaliação da reserva ovariana, por meio da dosagem de FSH, AMH (hormônio anti-mulleriano) e ultrassonografia transvaginal com contagem de folículos antrais”, explica. Além disso, é fundamental realizar exames hormonais gerais, avaliação da tireoide, sorologias, papanicolau atualizado e testes laboratoriais para checar a saúde geral. “A avaliação do parceiro também é essencial”, acrescenta.
O acompanhamento pré-concepcional para essas mulheres precisa ser individualizado. “Orientamos o início precoce de suplementação com ácido fólico e o ajuste de vitaminas e minerais, além do controle de doenças pré-existentes, como hipertensão e diabetes”, orienta Ludmila. Segundo ela, manter um estilo de vida saudável, praticar exercícios físicos regularmente, controlar o peso e o estresse são medidas que podem ajudar a garantir uma gestação saudável, seja de forma natural ou por técnicas de reprodução assistida.
Em termos nutricionais, a médica reforça a importância de uma alimentação equilibrada. “É essencial manter o peso adequado, praticar atividade física regular e abandonar hábitos como tabagismo e consumo excessivo de álcool”, aconselha. Em alguns casos, a médica recomenda um acompanhamento com nutricionista ou nutrólogo para um planejamento alimentar mais detalhado.
Nesse contexto, os avanços na medicina reprodutiva desempenham um papel fundamental. “Técnicas mais eficientes de fertilização in vitro, testes genéticos embrionários e o congelamento de óvulos são recursos que aumentam as chances de uma gestação bem-sucedida em idades mais avançadas”, destaca a especialista.
Quando os métodos naturais não surtem efeito, a fertilização in vitro (FIV) ou a ovodoação são opções viáveis. “A FIV é indicada após um ano de tentativas sem sucesso, ou seis meses para mulheres acima dos 35 anos”, esclarece. Já a ovodoação é uma alternativa em casos de falência ovariana ou baixa qualidade dos óvulos.
O congelamento de óvulos, por sua vez, é recomendado para aquelas que desejam adiar a maternidade sem abrir mão da possibilidade de filhos biológicos no futuro. “É um recurso que deve ser considerado até os 35 anos, quando a quantidade e qualidade dos óvulos ainda são mais favoráveis”, sugere Ludmila.
Os avanços nos tratamentos para aumentar a fertilidade feminina também têm mostrado resultados promissores. “Novas técnicas de estimulação ovariana, vitrificação de óvulos e embriões e diagnósticos genéticos mais precisos são alguns dos recursos disponíveis atualmente”, enumera a médica. Entretanto, Ludmila faz um alerta. “Não existe um tratamento capaz de recuperar a reserva ovariana perdida ao longo da vida. Por isso, o planejamento é fundamental”, esclarece a médica.