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Incerteza política e juros altos travam investimentos

Conjuntura atual levou o financiamento das empresas a patamares mais altos do que o normal. Para pequenas e médias, não vale a pena buscar crédito para expansão

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As incertezas em relação ao rumo da política econômica e o efeito do juro alto devem travar os investimentos no Brasil neste ano e dificultar uma recuperação mais robusta da economia

 

Desde o fim de 2022, essa piora da conjuntura já se refletiu num financiamento mais caro para as companhias. Excluindo Vale, Petrobras e Eletrobras, o custo de captação das empresas no mercado financeiro subiu para 15%, ficando acima do retorno a ser obtido com o investimento, mostra levantamento do coordenador do Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fipe (Cemec-Fipe), Carlos Antonio Rocca.

 

Isso significa que, para boa parte das empresas, sobretudo as médias e as pequenas, não vale mais a pena tomar recursos para fazer novas obras e ampliar a capacidade produtiva. Sem uma mudança no cenário, a tendência é de que projetos permaneçam engavetados. “A expectativa neste ano é de que o investimento privado enfrente um baixo crescimento por causa do custo maior aliado a fatores como PIB mais fraco, estabilização dos preços das commodities e aumento do custo de mão de obra“, diz Rocca.

 

A decisão de investimento depende da estabilidade macroeconômica e de um bom ambiente de negócios. No País, há dúvidas sobretudo no campo das contas públicas – se o arcabouço fiscal a ser apresentado pelo Ministério da Fazenda estancará o endividamento da economia brasileira. O embate entre o governo e o Banco Central sobre o nível dos juros é mais um ponto de incógnita.

 

Quando você começa a chacoalhar demais o ambiente macroeconômico e de negócios, você começa a afetar a taxa de investimento“, diz Cláudio Frischtak, fundador da consultoria Inter.B.

 

Agro e infra

 

Os investimentos no Brasil já vinham dando sinais de perda de fôlego no ano passado. A chamada formação bruta de capital fixo cresceu apenas 0,9%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e chegou a cerca de 19% do Produto Interno Bruto (PIB). Neste ano, a projeção do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) é de estagnação. De forma geral, a leitura dos analistas é a de que, se não vai haver um grande avanço, pelo menos não deve existir um grande retrocesso.

 

Apesar das dificuldades, ainda existem investimentos esperados para algumas áreas, que vão ignorar o cenário macroeconômico difícil e sair do papel. “Tem uma parte do investimento que acaba vindo. É aquele investimento para modernizar, reduzir custos e ganhar eficiência. Isso vai continuar existindo. É uma estratégia de sobrevivência, para que as empresas consigam se manter no mercado“, afirma Silvia Matos, economista do Ibre/FGV.

 

Na lista de setores que devem sobressair neste ano, estão a cadeia produtiva que envolve o agronegócio e a própria necessidade de modernização das empresas e setores de infraestrutura com obrigações contratuais.

 

No setor de energia elétrica, por exemplo, cuja aposta é de longo prazo, os investimentos em projetos renováveis devem seguir em alta, sobretudo nas áreas de eólica e solar. Em saneamento, os recursos injetados no setor referem-se aos 22 leilões dos últimos três anos, desde o novo marco regulatório.

 

A previsão é de termos mais investimentos neste ano e menos contratações novas“, afirma o diretor executivo da Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon), Percy Soares Neto. Ele diz que as empresas estão em compasso de espera para o novo decreto envolvendo o setor, previsto ainda para este mês. “O setor está parado, travado, dependendo das novas medidas (sobre a participação das estatais no setor).

 

Há uma expectativa também de que, se o governo conseguir virar a página das incertezas na economia, pode acelerar o ingresso de recursos de fora do País. Com o fim do governo de Jair Bolsonaro, houve uma melhora na percepção externa sobre o Brasil em vários aspectos, sobretudo nas questões institucionais e de meio ambiente. “No governo Lula, isso melhorou muito“, afirma Cláudio Frischtak, fundador da consultoria Inter.B. “Mas, agora, há um ruído na parte macro, e ele está piorando.

 

Termômetro 

 

No setor de máquinas e equipamentos – um importante termômetro do investimento no País -, o ano começou com a receita em queda. Em janeiro, o faturamento recuou 14% em relação a dezembro e 6,4% na comparação com o mesmo mês do ano passado.

 

O investimento do País está abaixo da depreciação dos ativos. É como se o Brasil estivesse sendo sucateado por falta de investimento“, diz José Velloso, presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

 

Na Solotest, que fornece equipamentos para laboratórios de construção civil, os sinais de que o cenário está mais difícil começaram a se materializar. A perda de ritmo com a demanda menor fica evidente na redução do prazo de entrega. Antes, levava em torno de 60 a 90 dias. Agora, está em cerca de 30 dias

 

O ano de 2022 foi muito bom. Nós conseguimos sair do prejuízo. Acabamos 2022 muito bem“, afirma Luiz Barella, sócio da empresa. Com sede em São Paulo, a companhia tem quase 100 funcionários. “Pode ser algo passageiro. Começamos a trabalhar em novos produtos para tentar exportar um pouco mais“, diz.

 

Em relação ao investimento direto de estrangeiros no País, o relatório Focus estima valor de US$ 80 bilhões em 2023.